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CARLOS HEITOR CONY
Carta na manga
RIO DE JANEIRO - Nos tempos
da 2ª Guerra Mundial, personagem
criado por Walt Disney para a política da boa vizinhança, o papagaio
Zé Carioca meteu-se a mágico, arregaçou as mangas na base do "nada
aqui nesta manga, nada aqui nesta
outra manga". De uma delas caiu
uma carta de baralho, o ás de espadas, que ele trazia para qualquer
emergência em mesa de pôquer.
Outro carioca, aliás, todos os cariocas tinham na manga, escondido
para uma última cartada contra a
violência urbana, um ás de espadas
que decidiria a partida a favor da
tranqüilidade geral.
Seria o recurso de apelar para tropas do Exército como solução extrema para o policiamento dos focos criminosos que atuam à margem do Estado.
O episódio do morro da Providência, lamentável em si mesmo,
ameaça um malefício dramático: a
perda da esperança que guardávamos como recurso final para decidir a luta contra a bandidagem. Como disseram os moradores locais,
os militares que ali foram colocados
em nada se diferenciavam dos policiais a que estão habituados.
A generalização deve ser evitada.
O tenente que comandou a entrega
de três jovens aos traficantes, bem
como seus subordinados imediatos,
é um caso até agora isolado. Não se
pode julgar o Exército, como instituição, pela demência de alguns
poucos soldados. Mas, no primeiro
impacto da notícia, a sensação foi a
perda da carta que tínhamos na
manga para dar um fim ao crime
organizado.
O debate sobre o uso das Forças
Armadas na guerrilha urbana que o
Rio trava há tempos trouxe um fato
novo e inesperado. Repito: lamentável, mas até agora isolado. Não
pode servir como argumento final
para a guerra que tem de ser travada contra a chaga social que perdura e impede que se enfrente o inverno do nosso descontentamento.
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