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ELIANE CANTANHÊDE
Mentira
BRASÍLIA - Além de todas os adjetivos já ditos e repetidos sobre a nota
do Exército no domingo passado, é
bom que dois "detalhes" não passem
em branco: havia ali uma rasgada
mentira factual, com o uso do santo
nome da Defesa em vão.
Eis o trecho: "Quanto às mortes que
teriam ocorrido durante as operações
[de repressão política], o Ministério
da Defesa tem, insistentemente, enfatizado que não há documentos históricos que as comprovem".
O ministro da Defesa, José Viegas,
tinha comemorado seu aniversário
na véspera e estava dormindo quando foi acordado por um assessor, lá
pelas 10h30. Ao ler a nota, quase teve
um ataque apoplético.
Já é suficientemente polêmica a declaração reiterada de Viegas -como, de resto, do governo- de que os
documentos sobre a guerrilha do
Araguaia, se é que existiram um dia,
foram incinerados, ninguém sabe,
ninguém viu. Daí a dizer que não há
documento nenhum da ditadura,
nem comprovação das mortes?! Isso é
a morte para meio governo, que também foi preso, torturado e teve amigos assassinados pelo regime.
Lula nunca disse essa mentira, nem
Viegas, nem Márcio Thomaz Bastos,
até porque seria uma indignidade. O
Exército, portanto, nunca poderia ter
dito. Muito menos alegando que o
Ministério da Defesa "tem, insistentemente, enfatizado...".
É impressionante como as feridas
daquela época reabrem com tanta
rapidez e como as opiniões se formam apaixonadamente. Nota-se pela reação de ministros, assessores,
parlamentares, familiares e leitores.
Tudo isso movido pelo fantasma de
documentos que estão por aí assombrando o passado e o presente.
As mortes existiram, os documentos existem para quem quiser e puder
ver. Para entender, por exemplo, por
que raios andam divulgando notas, a
esta altura, enaltecendo a ditadura e
defendendo os DOI-Codi da vida.
"Eu não creio em bruxas, mas que
elas existem, existem." E é bom ficar
de olho. O governo especialmente.
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