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CARLOS HEITOR CONY
O gênero e o grau
RIO DE JANEIRO - Um dos itens do último censo que mais provocaram
comentários de especialistas e palpiteiros em geral foi a queda da "popularidade" da Igreja Católica no Brasil. Queda que vem se acentuando de
censo a censo e que aparentemente
coloca a chamada Nau de Pedro à
beira do naufrágio no encapelado
mar da modernidade.
A queda na popularidade é real,
mas a interpretação da queda é viciada por um equívoco elementar: o
de julgar o grau e esquecer o gênero.
Filosoficamente, essa é a primeira
operação da mente para se chegar a
um raciocínio e, posteriormente, a
um juízo de valor.
No grau, fácil de medir por pesquisas, por enquetes e até mesmo por
sensores eletrônicos, é evidente que a
Igreja Católica não é mais a potência
temporal que foi na Idade Média ou,
para ficarmos em casa, no período do
Brasil colonial.
Acontece que a igreja não pode ser
medida pelo seu grau, e sim pelo seu
gênero, que é único na história e com
o qual vem atravessando 21 séculos
de mudanças substanciais no grau.
Ela não pode ser avaliada como um
produto industrial, a marca de um
carro, de um sabonete, o sucesso de
um espetáculo da TV. Sua finalidade
não é ter muitos adeptos, liderar isso
ou aquilo, estar ou não estar ""up-to-date" com os progressos ou regressos
da sociedade e da ciência em geral.
Se o mundo marcha numa direção,
a igreja por sua definição ontológica
não tem nada a ver com isso, marcha
em outro sentido e com outra finalidade. Começou nas catacumbas de
Roma, pode terminar onde começou.
O que não pode é mudar de gênero
para ficar sintonizada com o grau do
mundo.
Em sua essência teocrática, o mundo é que deveria estar sintonizado
com ela. Para dar um exemplo grosseiro: dificilmente num pagode suburbano poder-se-ia tocar os "Concertos de Brandemburgo". Evidente
que, no grau, um músico habilidoso
poderia fazer um arranjo suportável
aos ouvidos dos pagodeiros. Mas não
seria a mesma coisa.
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