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O desafio da cana
A LABUTA diária em um canavial é dura, se não desumana. A reportagem de
Mário Magalhães e Joel Silva publicada domingo nesta Folha
deixa isso bem claro. Mesmo em
torno das usinas mais modernas
do país, no interior paulista, o
corte da cana ainda assume feições de trabalho degradante.
Sob vários aspectos, porém, as
condições melhoraram, por
pressão de sindicatos e Ministério Público. Houve avanços reais
na formalização do emprego e
no transporte de lavradores, por
exemplo, nas últimas décadas.
Mesmo assim, é chocante
constatar que o pagamento por
tonelada de cana colhida diminuiu, em termos reais. Em 1980,
pagavam-se R$ 6,53/t em média;
em 2007, só R$ 3,29/t.
Apesar disso, a remuneração
média diária de um cortador subiu 11,6%. A razão é simples: hoje
ele corta quase dez toneladas de
cana em um dia; há três décadas,
eram menos de quatro.
Trata-se de um dos efeitos perversos da substituição do trabalho braçal por tecnologia, que
encontra na cana um caso de
manual. Embora a produção tenha mais que dobrado em oito
anos, o emprego de mão-de-obra
se retrai, por força da mecanização (metade da safra paulista já é
colhida por máquinas). Só os
mais jovens, dispostos e produtivos encontram trabalho.
A mecanização traz benefício
ambiental, pois dispensa a queima realizada para facilitar a colheita manual da cana. O fogo
destrói a palha e lança fuligem
no ar, piorando a poluição atmosférica e a saúde da população do interior.
O governo estadual paulista
firmou um protocolo com o setor sucroalcooleiro, em 2007,
que antecipa de 2021 para 2014 o
fim das queimadas na maior parte do Estado (áreas mecanizáveis). É o caminho correto.
Com as queimadas desaparecerão também os piores empregos. Resta por equacionar, contudo, o problema social representado pela perda projetada de
mais de cem mil vagas só em São
Paulo. A saída é requalificar e recolocar essa legião de lavradores.
Governo federal e entidades
sucroalcooleiras lançaram um
Plano Setorial de Qualificação,
mas com a meta tímida demais
de beneficiar 2.700 trabalhadores. Basta dizer que esse é o mesmo contingente desempregado a
cada ponto percentual de avanço
na mecanização da colheita.
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