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ELIANE CANTANHÊDE
A cada dia sua agonia
BRASÍLIA - Dizem o bom senso, a prudência, a política e a história que
não se devem abrir muitos flancos ao
mesmo tempo. Um inimigo de cada
vez, um alvo também. Mas não é isso
que vem ocorrendo com o governo
Lula, que amontoa adversários e problemas semana após semana.
A reforma tributária entalou na
garganta dos governadores. A da
Previdência abriu a possibilidade da
primeira greve de juízes da história.
A Lei de Falências reapareceu no
Congresso toda alterada.
Mas isso não é nada, faz parte da
rotina de governos. O que preocupa
não é Brasília, que muitos chamam
de "ilha da fantasia". É Rio, São Paulo, Sergipe, Minas e tudo o que se convencionou considerar "país real".
É aí, nesse inquieto país real, que o
MST e difusos movimentos dos sem-teto invadem, ocupam prédios e pátios, bloqueiam rodovias. E deixam
como rastro a suspeita de que, se o PT
evoluiu para o estágio reformista,
disputando e ganhando eleições, a
dissidência revolucionária sobreviveu e está forte, ativa.
Para emoldurar o quadro, a decisão de uma juíza federal do DF determinando a abertura de todos os documentos sigilosos do Exército sobre
a guerrilha do Araguaia. Se os militares foram poupados da batalha da
reforma da Previdência, agora estão
sendo jogados na guerra da história.
E isso, claro, é tudo o que o governo
petista não quer. Com tantos flancos
e tantos inimigos tão precocemente, é
melhor não mexer com os militares.
Quanto mais quietos, melhor para
todos. Inclusive para eles.
Palocci sentou na economia e resistiu a tudo e a todos na disposição de
garantir o básico: estabilidade. Mas,
na política, muitas vezes isso escapa
ao controle e aos manuais, ganha vida própria e chega às ruas.
A elite produtiva pode até fazer
muxoxo por causa da política econômica ortodoxa, mas não é problema.
O problema de Lula está onde sempre
esteve, desde o primeiro dia de governo: nas próprias bases e nos próprios
aliados tradicionais do PT. É aí que
mora o perigo: a instabilidade.
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