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CARLOS HEITOR CONY
Velhos tempos
RIO DE JANEIRO - Nada tenho contra nenhuma reforma, seja qual for,
desde a agrária até a de uma nota
promissória. Ali nos inícios dos anos
60, como editor da primeira página
de um jornal, cismava com o pessoal
do copidesque que poluía o noticiário
com as reformas então pretendidas.
O Brasil atravessava o governo de
João Goulart, e "reforma" era a palavra de ordem. Não se colocava um
prego na estrutura do país, não se asfaltava um metro de estrada, não se
abria uma vaga no mercado de trabalho, uma sala de aula, um ambulatório.
O noticiário era consumido pelas
reformas, pelas negociações entre os
sindicatos e os representantes disso e
daquilo; ficava difícil encaixar uma
chamada que não tivesse no título
uma reforma qualquer. Havia dias
em que, por mais que espremesse o
engenho e a pouca arte, não podia
evitar três ou quatro chamadas com
a palavra que parecia saltar do papel.
Deu no que deu. Tanto falaram em
reformas que reformaram tudo. Os
militares, muitos deles já reformados,
tomaram o poder em 64 e ficaram 21
anos reformando as reformas pretendidas pelo governo reformista de
Goulart.
Temos agora o governo Lula, que
prometeu reformas e até agora só
pensa nisso. Como nos anos de Goulart, a palavra salta de todas as páginas dos jornais, não há editor capaz
de impedir a geração espontânea
produzida pelas reformas políticas,
sociais e econômicas.
Uma pesquisa nas edições dos anos
62, 63 e começo de 64 mostra que as
reformas de hoje são as mesmas daquele tempo: previdenciária, tributária, partidária e, por mais incrível
que seja, agrária, a mais velha de todas, a mais empurrada pela barriga
dos governos que tivemos.
Se Jango ressuscitasse e lesse um
jornal de hoje, diria para o Darcy Ribeiro: "Tá tudo como nos velhos tempos. Chame o Pellacani e o Talarico!".
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