São Paulo, domingo, 28 de julho de 2002

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ALCA EMPRESARIAL

No mar de ignorância técnica que prevalece no Brasil quando o assunto é a Área de Livre Comércio das Américas, o esforço da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo em promover uma simulação de seus impactos no setor produtivo do país deve ser especialmente louvado. Uma das conclusões da pesquisa é a estimativa de que, se as barreiras dos países americanos forem zeradas em 1º de janeiro de 2006, o saldo para o Brasil, em termos de comércio exterior, será negativo em US$ 1 bilhão. Esse dado está longe de ser o que mais preocupa no estudo da Fiesp, que, em seu conjunto, expõe o gritante despreparo brasileiro para a Alca.
Na verdade, a conta total efetuada pelos técnicos da Fiesp vale mais para esboçar o potencial "total" de impacto da Alca no setor empresarial brasileiro do que para precisar o que, de fato, ocorrerá quando -e se- a área de livre comércio for implantada. Isso porque as condições em que se encontram as negociações não indicam que haverá queda abrupta de tarifas em todos os setores. Esse aspecto, paradoxalmente, pode tornar o resultado do acordo muito pior para o Brasil do que a perda estimada de US$ 1 bilhão em divisas.
A Fiesp arrola 24 nichos em que os brasileiros são muito competitivos em relação a seus potenciais parceiros de Alca -entre eles calçados, aço e suco de laranja. Parte importante desses segmentos não estará na mesa de negociações da Alca porque o Congresso dos Estados Unidos, na prática, impediu o presidente George W. Bush de tratar deles e de outros tópicos vitais para os interesses brasileiros, como as barreiras estabelecidas por meio de antidumping.
Além disso, prevê o estudo da Fiesp que a perda do Brasil com a Alca será mais intensa no conjunto de produtos mais dinâmicos no mercado global. Ou seja: o Brasil corre sério risco de ver-se cada vez mais reduzido a um exportador de "commodities".
Se o nome do jogo é preparo burocrático para enfrentar as duras batalhas de uma economia mais aberta, então a conclusão também não é das melhores. Os EUA arregimentam mais de 16 mil pessoas para seus serviços de defesa comercial; o Brasil dispõe de 62. Se se for comparar a carga de tributos nos produtos exportados, também o Brasil se sai pessimamente mal.
A não ser que haja uma verdadeira "revolução", num curto espaço de tempo, tanto institucional como de cultura empresarial no Brasil, aceitar enfrentar negociações da Alca com tamanha assimetria será desastroso. E o sucessor de FHC, aos 15 dias de sua posse, terá de enfrentar uma rodada de negociações decisiva a esse respeito. Se os candidatos demorarem muito a "refletir" sobre o tema e a expor suas propostas, o Brasil pode ser prejudicado fortemente.


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