São Paulo, domingo, 28 de julho de 2002

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CLÓVIS ROSSI

Pequenas mentiras inúteis

SÃO PAULO - Na sua coluna de terça-feira, o filósofo Roberto Mangabeira Unger deu comovente lição de humildade a todos os que pretendem governar. A certa altura, diz:
"É preciso a cada dia decidir (...), decidir, entretanto, sabendo que nunca sabemos o bastante para decidir sem risco de erro."
É uma pena que nenhum dos quatro principais candidatos à Presidência tenha temperamento para seguir tal norma. Nem mesmo Ciro Gomes, o candidato de Mangabeira.
Ao contrário, Ciro é campeão em tentar passar a impressão de que jamais erra e de que tudo sabe. E, ao fazê-lo, mente ou desinforma.
Cito apenas uma mentira, menor, mas reveladora. Ao falar sobre o escândalo do Sivam (Sistema de Vigilância da Amazônia), que o repórter Marcio Aith reintroduziu no noticiário, Ciro disse: "Já conhecia essa denúncia, é antiga. Explodiu na Europa, sob censura no Brasil, há mais de um ano e meio". Em duas frases do candidato, três mentiras.
Mentira 1 - Não explodiu só na Europa. Foi no mundo todo, Brasil inclusive, porque a firma francesa Thomson, prejudicada pela espionagem em favor da norte-americana Raytheon, gritou alto.
2 - Não foi há mais de um ano e meio só. Foi há exatamente sete anos, em 1995, como uma das sequelas do grampo no telefone do chefe do Cerimonial do Planalto, embaixador Júlio César Gomes da Silva, que revelou conversas complicadas.
3 - Não houve censura no Brasil. Já sabia disso, mas pelas dúvidas fui checar nos arquivos da Folha de 1995. Só com minha assinatura, há 42 textos sobre o Sivam, quase todos duramente críticos.
Ciro não tem a obrigação de saber tudo sobre tudo a todo momento. Mas tem, sim, a obrigação de não fingir que sabe. Fica feio e permite suspeitar que outras coisas que ele diz são igualmente mentirosas ou são igualmente desinformadas.


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