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TENDÊNCIAS/DEBATES
Inovação tecnológica: realidade e miragem
ROBERTO NICOLSKY e ANDRÉ KOROTTCHENKO DE OLIVEIRA
Reverter o quadro do baixo número de patentes do Brasil não é missão para as universidades, ao contrário da opinião de muitos
O BRASIL ainda está longe de gerar tecnologia competitiva o
suficiente para garantir espaço
entre os grandes players mundiais em
setores estratégicos da economia.
Tal situação pode ser claramente
percebida ao analisar as últimas três
décadas do ranking de registros de patentes no escritório norte-americano,
o USPTO. O país vem gradativamente
involuindo quando comparado com
os emergentes asiáticos. Conhecido
por sua objetividade e assertividade,
terá de aprender algumas lições com
os parceiros do outro lado do globo.
Em países desenvolvidos, concede-se maior número de patentes a inventores nacionais que a estrangeiros,
não sendo diferente nos EUA, líder
em seu território.
Ao analisar, porém, os demais países, fica evidente a ocorrência no cenário recente de uma "dança das cadeiras", na qual o velho continente
perdeu paulatinamente o lugar. O Japão ultrapassou a Alemanha em patentes concedidas nos EUA em 1975
e, desde então, as duas nações se mantiveram, respectivamente, nas segunda e terceira posições do ranking do
USPTO. A grande mudança nos últimos dez anos é a ascensão de Taiwan
e, principalmente, da Coréia do Sul.
Coréia do Sul e Taiwan, hoje em
quarto e e quinto lugares, deixaram
para trás países como Grã-Bretanha e
França, ocupantes dessas posições
por três décadas. Trata-se de um claro
indício do declínio tecnológico dos
tradicionais países europeus. Caso a
tendência se mantenha, em menos de
dez anos, os asiáticos ultrapassarão
também a Alemanha.
O fato de os emergentes citados estarem patenteando fortemente no exterior indica que eles investem para
dominar a tecnologia de produção e
de processos.
O furacão asiático também atingiu
o Brasil, que hoje está na 29ª posição
do ranking, tendo sido ultrapassado,
em 2007, pela pequena Malásia. Desde 1975, perdemos lugar para Taiwan,
Coréia (1983), China (1986), Cingapura (1996) e Índia (1998), demonstrando pouca capacidade de absorver as
tecnologias dos países desenvolvidos
e de gerar inovações próprias.
O baixo número de patentes brasileiras está diretamente relacionado
ao escasso investimento em pesquisa
e desenvolvimento na indústria.
Essa situação, por sua vez, é reflexo
da falta de incentivo público mais eficiente, que é o compartilhamento
universal do risco tecnológico entre
Estado e empresa, mecanismo que
alavanca o crescimento dos outros
emergentes e o mais usado pelos países desenvolvidos para manter as
suas lideranças tecnológicas.
Reverter esse quadro não será uma
missão para as universidades, ao contrário da opinião de muitos. Vale registrar que, historicamente, menos de
2% do total de patentes dos EUA são
concedidos a universidades. Em nenhum país emergente bem-sucedido
a inovação veio da academia, apesar
da inestimável importância dessa instituição na sua missão de formar recursos humanos qualificados.
Como as inovações atendem a necessidades dos consumidores e usuários, é natural que sejam geradas no
pólo produtor, isto é, nas empresas.
O recente desenvolvimento tecnológico da Índia e da China reforça essa
tese. Não existe nenhum produto novo lançado por esses países, mas as
suas patentes crescem exponencialmente por meio de processos de engenharia reversa, ou cópia criativa, e,
em um segundo momento, geração de
inovações incrementais. Agregar valor por meio de inovações incrementais em tecnologias importadas é uma
atividade que conta com fomento explícito na Índia (lei nº 44/95).
Assim ocorreu no Japão do pós-guerra e, posteriormente, na Coréia
do Sul e em Taiwan. E é isso que, entre
nós, faz o sucesso de Petrobras, Embraer e outras empresas brasileiras
que estão continuamente agregando
pequenas inovações incrementais aos
seus produtos e processos.
Em vez de dar toda a força às inovações incrementais, as políticas públicas no nosso país insistem há mais de
30 anos na estratégia equivocada de
apostar no ineditismo, ainda que o insucesso desses projetos nos distancie
cada vez mais dos emergentes orientais no ranking de patentes e na taxa
de crescimento do PIB.
Isso se evidencia na fala repetida
"ad nauseam" por algumas autoridades brasileiras: "O que nos falta é apenas saber transformar em patentes a
ciência produzida nas nossas universidades". Como toda miragem, essa
também se desmancha no ar quando
nos aproximamos dela.
ROBERTO NICOLSKY, 70, físico, é diretor-geral da Sociedade Brasileira Pró-Inovação Tecnológica.
ANDRÉ KOROTTCHENKO DE OLIVEIRA é engenheiro
eletrônico e consultor em gestão de patentes.
Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo. debates@uol.com.br
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