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DE VOLTA AO FUTURO
Urbanização planejada da ilha remonta ao século 19
Com casas de madeira vindas dos EUA, balneário foi aberto em 1893; prédios foram demolidos nos anos 60
DO ENVIADO ESPECIAL AO GUARUJÁ
Para Geraldo Anhaia Mello,
53, que organizou um pequeno
e interessante museu de fotos
no edifício Sobre-As-Ondas, na
divisa entre as praias das Pitangueiras e das Astúrias, o local
desse prédio marca a passagem
estreita que seria a "guaru-yá".
Justamente ali, nessa passagem onde ficavam grandes rochas chamadas de Sala de Pedras, segundo Anhaia Mello, o
alemão Hans Staden teria escapado de ser comido por canibais num ritual antropofágico
(veja texto à pág. F8).
Verdade ou imaginação fértil, o arcabuzeiro virou escritor,
empreendendo duas viagens ao
Brasil e legando à historiografia
tupiniquim um livro, publicado
na Alemanha em 1557, um trabalho único sobre os primórdios da colonização do Brasil.
Mas, de acordo com documentos de época, a ilha já era
bem conhecida dos colonizadores portugueses antes disso: foi
doada, em 1534, pelo rei d. João
2º, a Martim Afonso de Sousa,
que desembarcou na sua capitania hereditária trazendo entre os tripulantes seu irmão Pero Lopes de Sousa.
Outra referência ao Guarujá
anterior ao livro de Staden data
de 1554, quando o genovês José
Adorno edificou uma capela
dedicada a Santo Amaro, em
cuja alusão a ilha onde hoje fica
a cidade balneária foi então denominada.
Além do nome Guarujá, o
termo indígena Guaibê, cuja
etimologia deve ter relação
com "separada" e "cortada",
também serviu para denominar a ilha de Santo Amaro nos
primórdios da colonização, o
que mostraria que, entre os habitantes nativos, havia a intuição de que o local era uma ilha.
Por volta de 1540, os portugueses Jorge Ferreira e Estevão
da Costa estavam entre os primeiros povoadores do Guarujá
e, cinco anos depois, já havia no
local um engenho de cana-de-açúcar cujos proprietários
eram Gonçalo Afonso e Manoel
de Oliveira, o Gago.
O nascimento do balneário
Mas o Guarujá, talvez o primeiro conjunto urbano brasileiro planejado, remonta a
1892. Foi então que chegaram
ao porto de Santos as primeiras
partes de casas pré-fabricadas
em Rhode Island, nos EUA.
Por trás da empreitada estavam Elias Chaves, Elias Fausto
Pacheco Jordão, Valêncio Teixeira Leomil e a idéia de construir um balneário elegante,
com traçados regulares para as
ruas, grande hotel e cassino, à
semelhança do que ocorria na
época na Riviera Francesa.
Quatrocentão nascido em
Rio Claro (SP), Pacheco Jordão
é quem tinha na cabeça a idéia
de um balneário europeizado.
Ainda que a companhia tenha sido adquirida, depois, pelo
financista norte-americano
Percival Farquhar, foi dele a
idéia bem-sucedida de implantar um balneário com jogo e finesses que atraíram a burguesia paulista, os turistas estrangeiros e até mesmo figuras internacionais como o inventor
Alberto Santos Dumont (leia
mais na pág. F9).
Concluído em dez meses, o
elegante balneário foi aberto
em 1893 -e fotos de época documentam estruturas imponentes, ainda que de madeira.
Um bangalô de pinho da Geórgia, da primeira leva de 46 chalés de luxo da era da implantação do Guarujá, ficou de pé até
os anos 1960, na rua Mário Ribeiro, diante do hotel Ferrareto. E, para trazer turistas, os
empreendedores também
construíram uma pequena estrada de ferro turística.
Uma das locomotivas, da
marca Baldwin, ainda está exposta num singelo nicho envidraçado na esquina das avenidas Puglisi e Leomil, onde também há um busto de Elisas Pacheco Jordão.
No lado oposto da mesma esquina, na rua que antigamente
era chamada de "rua do canal",
está o carro funerário que levou
os despojos do inventor Alberto Santos Dumont, que teria
cometido suicídio num quarto
do Grand Hôtel La Plage, em
1932.
Tempos modernos
No início, as ruas do centro,
diante da praia das Pintangueiras, tinham nomes diferentes
dos atuais. A rua Hans Staden,
defronte à praia das Pitangueiras, se tornou a rua Marechal
Deodoro; a rua Cunhambebe,
primeira paralela, foi rebatizada e se tornou a rua Mário Ribeiro. E, justamente na quadra
formada por essas paralelas e
pelas transversais Petrópolis e
Cavalheiro Nami Jafet, ficava o
hotel construído em 1898 e demolido em 1910.
Nesse mesmo local, diante
das Pitangueiras e da ilha Pombeva, onde hoje está o shopping
La Plage e, no passado, foi o clube da Orla, foi construído o
Grande Hôtel La Plage, esse demolido nos anos 1960.
Fotos antigas mostram esse
conjunto requintado, projeto
do escritório Ramos de Azevedo, inaugurado em 1912. Sua
piscina em forma de ameba,
aterrada na implantação do
shopping, foi, aliás, a piscina do
extinto clube da Orla.
A história desse outro hotel
grandioso se entrelaça com a do
controvertido financista norte-americano Percival Farquhar
(leia à pág. F7), que, no início do
século 20, virou o proprietário
da companhia do balneário.
Numa fase mais contemporânea, o Guarujá teve entre
seus líderes comunitários um
padre italiano, dom Domênico
Rangoni, que angariou, nos
anos 1950 e 1960, doações para
concluir a igreja Nossa Senhora
de Fátima e construir, entre
outras obras sociais ainda hoje
importantes para a população
guarujaense, o hospital Santo
Amaro.
(SILVIO CIOFFI)
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