DO CORRESPONDENTE EM NOVA YORK

VAI FINALMENTE ao ar no Brasil, às 20h30 de hoje no canal de TV paga Fox, o polêmico episódio em que os Simpsons visitam o Rio de Janeiro e fazem troça dos brasileiros em geral e dos cariocas em particular. A passagem causou revolta e reações hipócritas.
Da hipocrisia, falo no final. Já a revolta veio principalmente do órgão local de turismo, que não gostou da maneira como a cidade foi mostrada e pediu retratação do desenhista Matt Groening. Até mesmo o presidente FHC teria reclamado.
O capítulo em questão foi rebatizado de "O Feitiço de Lisa" ("Blame It on Lisa", no original), Lisa sendo a filha mais velha de Homer e Marge. Ambos os títulos trocadilham o filme mais-do-que-esquecível "Feitiço do Rio", de 1984.
"O Feitiço de Lisa" começa com a conta telefônica dos Simpsons explodindo de tanta ligação para o Brasil. Então, Homer e Marge descobrem que Lisa patrocina um menor carente brasileiro, Ronaldo, que desapareceu.
Logo, os quatro estão a caminho do Rio de Janeiro para tentar descobrir o paradeiro do garoto. Aí entra em cena o que vem fazendo deste desenho o mais engraçado e mais longevo (13 temporadas) da televisão norte-americana atual: o tom politicamente incorreto.
Assim, na mesma penada, Groening ironiza a já famosa ignorância geográfica norte-americana (Homer aprende espanhol para se preparar para a viagem), reforça erros históricos (os cariocas dançam conga, Ronaldo se defende de um ataque de macacos, cobras andam soltas nas ruas, a Amazônia é vizinha do Rio) e critica aspectos pouco lisonjeiros do dia-a-dia local (malandragem, táxis clandestinos, sequestros, trombadinhas).
De quebra, faz seu comentário sobre a tal sensualidade brasileira, estereótipo que o estrangeiro está cansado de ver nos pôsteres em agências de turismo no exterior. Brasileiros têm sexualidade ambígua, diz Marge, ao visitar a escola que ensina a dança "penetrada" e antes de assistir ao programa infantil em que a apresentadora é ultra-sexy...
O Brasil não é o primeiro país a ser alvo dos Simpsons (Canadá, África, Japão são alguns dos destinos já ridicularizados) nem o único a reclamar (Austrália e Hungria chiaram), mas está entre os que fizeram mais barulho.
A hipocrisia local é a de sempre: ninguém reclama quando os jornais sérios dos EUA e da Europa noticiam que o tráfico mandou mais uma vez fechar o comércio carioca ou que os chefões das drogas continuam controlando as favelas mesmo de dentro da prisão; mas quem este desenhista pensa que é para sugerir que temos cobras e macacos nas ruas? (SÉRGIO DÁVILA)