O
pontapé formal a um dos mais avançados projetos
de ônibus ecológicos do mundo será dado
na próxima terça-feira, na sede da Empresa Metropolitana
de Transportes Urbanos, a EMTU, em São Bernardo do
Campo (SP). Na ocasião serão apresentados os
detalhes de um segredo bem guardado - o do primeiro ônibus
brasileiro movido a célula de hidrogênio.
Trata-se de um veículo mais silencioso, movido a hidrogênio
e não-poluente que, se tudo correr conforme o script,
deverá ter um protótipo rodando nos 33 quilômetros
do corredor Jabaquara-São Mateus, na região
metropolitana de São Paulo, no final de 2007 ou início
de 2008. Deve ter 12 metros, piso rebaixado, três portas
e ar-condicionado. O plano é testá-lo por seis
meses. A partir daí, mais três ou quatro similares
serão produzidos, diz Marcio Rodrigues Schettino, gerente
de desenvolvimento da EMTU e o engenheiro que coordena toda
a iniciativa.
Há vários parceiros no projeto iniciado em
1997 e gerenciado pela EMTU. O consórcio responsável
pelo fornecimento dos ônibus e pela infra-estrutura
de hidrogênio têm oito nomes: a AES Eletropaulo
fornecerá a energia para o processo de eletrólise
da água; a canadense Ballard Power Systems, líder
mundial neste negócio, será a fornecedora das
células de hidrogênio; a EPRI International,
uma instituição americana sem fins lucrativos,
fará a administração do conjunto de empresas
envolvidas; a canadense Hydrogenics providenciará os
equipamentos que produzem o hidrogênio; as brasileiras
Marcopolo e Tuttotrasporti são responsáveis,
respectivamente, pela carroceria e pelo chassi; a Nucellsys,
joint venture entre DaymlerChrysler e Ford, dará o
suporte técnico e a Petrobras fornecerá a infra-estrutura
para a estação de abastecimento.
O Ministério das Minas e Energia é o diretor-nacional
do projeto e a EMTU, a agência executora. O PNUD, o
braço da ONU que cuida do desenvolvimento, é
a agência implementadora. "A idéia é
reduzir as emissões de gases responsáveis pelo
efeito-estufa no transporte público", diz a oficial
de programa do PNUD Rose Diegues. O GEF, o Global Environment
Facility, um fundo internacional que destina recursos a projetos
ambientais, custeia a iniciativa com o equivalente a US$ 12
milhões. A contrapartida brasileira - US$ 3,8 milhões
- é bancada pela Finep.
O princípio do ônibus a hidrogênio é
basicamente o seguinte: a célula-combustível
produz energia com eficiência utilizando o hidrogênio
como combustível e, pelo cano de escapamento, ao invés
de fumaça preta e material particulado, só emite
vapor d'água. "Trata-se de um processo eletroquímico,
o mesmo das células do corpo humano", diz Schettino.
O ônibus a hidrogênio é uma opção
ambientalmente limpa à dependência do transporte
público aos combustíveis fósseis - o
único problema é que se trata de uma tecnologia
cara.
A solução não é novidade nas
cidades européias. As iniciativas do gênero na
Califórnia também são emblemáticas.
O próprio PNUD havia apoiado iniciativas no México,
no Egito e na Índia, mas só vingaram os projetos
na China e no Brasil. "Mas são diferentes",
diz Rose Diegues. Os chineses compraram modelos já
prontos. "No caso do Brasil, há um avanço
tecnológico. O nosso é uma nova geração
de ônibus", anima-se. Na Olimpíada da China,
em 2008, espera-se que os ônibus a hidrogênio
estejam circulando por lá.
O projeto brasileiro passou por várias fases. No processo,
por exemplo, as células diminuíram de tamanho,
diz Symone de Santana Araújo, coordenadora geral do
departamento de gás natural do Ministério das
Minas e Energia e responsável pelo projeto do ônibus
a hidrogênio no ministério.
A contribuição ambiental à uma cidade
poluída como São Paulo é evidente. Veículos
movidos a diesel emitem óxidos de nitrogênio
e material particulado, dois poluentes que irritam as vias
respiratórias. No caso de material particulado, também
emitido por indústrias e queimas, os níveis
nacionais considerados satisfatórios são constantemente
ultrapassados na Grande São Paulo.
Segundo dados do relatório de qualidade do ar da Cetesb
de 2005, a frota de veículos que circula na região
metropolitana de São Paulo emite 95% de todo o óxido
de nitrogênio medido, sendo que ônibus e caminhões
são responsáveis por 78% das emissões.
O poluente produz, junto com hidrocarbonetos, o ozônio
que se forma na baixa altitude e prejudica olhos, nariz e
vias respiratórias assim como causa danos à
vegetação.
Quanto ao material particulado, a frota é responsável
por 65% do total emitido - os ônibus e caminhões
contribuem com 28% da poluição. "Com os
ônibus a hidrogênio a emissão destes dois
poluentes pode cair muito", anima-se Homero Carvalho,
gerente da divisão de engenharia e fiscalização
de veículos da Cetesb, a agência ambiental paulista.
Não é de hoje que se procura uma alternativa
ambientalmente limpa para cidades como São Paulo. A
região metropolitana já chegou a ter mil trólebus
- hoje são só 300. O grande problema neste tipo
de transporte coletivo está no custo da energia elétrica.
"A maior demanda é no horário de pico,
quando o custo da energia é mais elevado", diz
Schettino. Nas contas do engenheiro, o custo do trólebus
acaba saindo 10% mais caro que o do veículo a diesel.
Para ele, o hidrogênio é a perspectiva de futuro
tanto pela eficiência energética quanto pelo
impacto ambiental. "Em pouco tempo, o custo da energia
será alto e as fontes, escassas", diz ele. "O
petróleo pode não acabar, mas terá que
ser usado para funções mais nobres."
Daniela Chiaretti
Marli Olmos
As informações são do jornal Valor Econômico.
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