60% das
mulheres já sofreram algum tipo de violência
(física, sexual ou psicológica) provocada pelos
parceiros. Dentre elas, 20% afirmaram terem sido agredidas
durante a gestação. Os dados são o resultado
da pesquisa de mestrado da psicóloga Julia Durand,
que entrevistou, em 2002, 1922 mulheres que engravidaram pelo
menos uma vez.
Segundo a pesquisa, a gravidade dos dados é resultante
da maneira como a relação é estabelecida,
o que geralmente se faz diante da história de vida
dos parceiros. "Normalmente, ambos já sofreram
com a violência dentro da família. Isso cria
entre as mulheres um sentimento de baixa auto-estima, sendo
o relacionamento um possível ponto de fuga. Enquanto
isso, no homem, as idéias de virilidade e violência
são identificadas como recursos de controle e dominação",
diz a pesquisadora.
Dentro dessa dinâmica, a gestação é
um momento no qual se intensificam os sentimentos. Muitas
vezes, a gravidez é algo não planejado e que
provoca mudanças em relação à
identidade, com os homens não se sentindo aptos para
ser pai, por exemplo. "O mais grave é que as mulheres
que sofrem violência nesse período acabam sendo
vítimas dos três tipos juntos", revela Durand.
Foram identificados casos de agressões como socos,
queimaduras e ameaça de morte.
Tudo isso pode provocar impactos fortes, tanto para a saúde
da mulher quanto para a da criança. "Identificamos
o uso abusivo de álcool e drogas entre as mulheres
agredidas, além de distúrbios como a depressão
e a busca tardia pelos exames pré-natal. Tais fatores
provocaram falhas no desenvolvimento da criança. Muitas
delas nasceram com menos de 2,5 kg, o que representa uma situação
de risco, e que podem ter gerado um elevado nível de
abortos", explica ela que apresentou sua dissertação
na Universidade de São Paulo (USP).
Segundo a pesquisa, 429 mulheres tiveram pelo menos um aborto,
119 dois abortos e quase 100 mais de três. Para a pesquisadora
esses números são graves, mas complicados de
interpretar. "A condição social dessas
mulheres acaba produzindo uma tendência para um número
maior de gestações, o que provoca uma possibilidade
maior de aborto. Dessa forma, fica difícil determinar
que a violência foi o fator determinante para a perda
da criança, mas foi um dos complicadores".
Ao serem questionadas sobre os atos dos parceiros, a maioria
das mulheres não os identificava como violência.
Segundo Durand, elas não se sentem confortáveis
para falar disso e imaginam que os homens, em algum momento,
vão parar de violentá-las. "As perguntas
eram feitas por meio de descrições. Por exemplo:
seu marido já lhe deu um soco? Nesses casos as respostas
eram afirmativas. Mas caso a pergunta fosse: você sofre
violência? A maioria respondia que não",
revela.
A constatação indica o motivo pelo qual poucas
queixas são registradas nas Delegacias de Proteção
às Mulheres. "Elas não querem punir seus
parceiros, mas sim resolver o problema. Por isso, muitas das
queixas que são feitas, acabam sendo retiradas, pois
existe o medo de que o marido seja preso", diz Durand.
Segundo dados das delegacias da mulher, em 2004, foram registradas
289.127 ocorrências em todo o estado de São Paulo,
número menor que o indicado no ano anterior, 290.961.
Para tentar solucionar o problema, a maioria das unidades
de saúde da cidade de São Paulo tem profissionais
preparados para identificar casos de violência doméstica
no momento em que a mulher dá entrada com ferimentos
suspeitos. "Enfermeiras e médicos possibilitam,
de forma adequada, a abertura para cada mulher revelar o seu
problema, espaço que elas não encontram com
familiares ou amigos. A partir daí, o importante é
fazer a mulher perceber que vive em uma situação
de violência, para que, em cada caso, uma solução
seja encontrada", diz.
Alan Meguerditchian
do site Aprendiz
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