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17/03/2006
Carta da semana
REFLEXÕES SOBRE A VITÓRIA CONTRA
O NEPOTISMO
“O tema em voga, da extinção
do nepotismo nos tribunais, tem suscitado cobertura pelos meios
de comunicação de massa, porém superficial,
deixando de lado vários aspectos que pretendo abordar
aqui. O primeiro detalhe ignorado
é que se trata de um tema bem mais transcendente do
que parece. Sua vocação natural é a de
iniciar uma luta pelo fim do nepotismo em todas as esferas
do Estado Brasileiro, como tratarei adiante.
Em segundo lugar, não se tem dado o devido crédito
aos verdadeiros responsáveis pelo sucesso da empreitada.
É claro e indubitável que houve sensibilidade
por parte do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) para
com o assunto. Mas a luta partiu das próprias entidades
representativas da classe dos magistrados. Foi a Associação
Nacional dos Magistrados do Trabalho que provocou o órgão
de controle externo, que estendeu os efeitos do que lhe foi
pedido (originalmente limitado àquela Justiça
Especializada) para todo o Judiciário Brasileiro. Foi
a ação corajosa da Associação
dos Magistrados Brasileiros, propondo ação direta
de constitucionalidade perante o Supremo Tribunal Federal
(STF) que permitiu, na prática, que a resolução
antinepotismo produzisse todos os seus efeitos.
Há importantes detalhes, com não menos relevantes
conseqüências práticas, que estão
sendo deixados de lado pela imprensa. Se o STF proclamou que
o Conselho Nacional de Justiça estava atuando nos limites
de suas atribuições – isto é, que
ele não estava legislando, nem se arrogando competências
do Congresso Nacional – isso significa que a proibição
de nepotismo vale para todos os Poderes e para o Ministério
Público. Este último já conta com uma
resolução semelhante à do CNJ, emitida
por seu próprio órgão de controle externo.
Mas que dizer do Poder Legislativo e do Poder Executivo?:
É óbvio que se espera do Poder Judiciário
um comportamento ético mais exigente, mas isso não
significa que os demais possam exibir relaxamento moral nesta
matéria, quanto mais depois da decisão do Supremo
Tribunal Federal, que parece indicar que certos princípios
da administração pública – dentre
eles, o da moralidade – apontam diretamente –
quer dizer, sem a necessidade de regulamentação
por outras normas – para livrar o Estado Brasileiro
do nepotismo, pouco importa qual seja o Poder ou a esfera.
Infelizmente, é previsível que o restante do
Estado brasileiro resistirá. A magistratura precisará
do apoio de toda a população para por fim a
esse problema em todos os setores da administração.
Quanto a este último tópico, é significativo
que já houvesse uma lei antinepotismo aplicável
à Justiça Federal desde 1996 (ela foi inclusive
lembrada durante o julgamento da liminar pelo STF), enquanto
que o mesmo não se verificava em todos os Estados e
não se verifica, até hoje, para o parlamento
ou para o Poder Executivo.
Outro ponto importante e igualmente pouco valorizado: a vitória
do combate ao nepotismo demonstrou o que internamente se conhecia,
mas que o público externo nem sempre tem consciência.
A magistratura não é um bloco compacto e homogêneo
de pensamento, como costuma ser descrita – muitas vezes
implicitamente – pelos meios de comunicação
social. Se houve quem resistisse contra a moralização
do Poder Judiciário, houve muitos mais juízes
– e estavam bem representados por suas entidades de
classe – que apoiaram e se alegraram com a vitória
na luta antinepotismo. Isso está a indicar que a democratização
da gestão dos tribunais, com a participação
direta de todos os magistrados na eleição de
seus corpos diretivos seria um passo na direção
correta.
Há, sim, um setor progressista na magistratura brasileira,
que é onerada e sofre com os vícios do engessado
sistema judiciário – e não são
apenas vícios de ordem ética, mas principalmente
funcionais – e que pretende ver tal situação
modificar-se (e logo). Esse setor saiu-se vitorioso desta
vez. É preciso que se saia bem em novas oportunidades.
É necessário que participe mais direta e ativamente
da gestão do Poder Judiciário.
Ainda se pode fazer um rápido balanço, positivo,
da atuação do CNJ neste primeiro mandato. Ele
evitou ser manipulado – embora até mesmo certas
entidades de classe tenham tentado desvirtuar suas funções
– como meio de influência e revisão de
decisões judiciais. Nas vezes em que foi pressionado
a reduzir ou eliminar a independência dos magistrados
– perigo que sempre ronda o exercício do controle
externo – o CNJ recusou-se, acertadamente. Preferiu,
corretamente, engajar-se em combates mais produtivos para
a reforma das instituições judiciárias.
Esperemos que com isso os que tentam valer-se do controle
externo com fins esconsos – os de garantir decisões
de mérito favoráveis a seus interesses, ou pressionar
juízes que decidem legalmente contra seus interesses
– tenham aprendido a lição”,
Erik Frederico Gramstrup -
christo@uol.com.br
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