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Técnica
em teste reduziu sintomas em pacientes de tumor carcinóide
que reagiram mal a outros tipos de tratamento
Novo método em teste no
hospital A. C. Camargo usa elemento radiativo ligado a moléculas
que procuram as células tumorais no corpo
Um grupo de médicos está
testando em São Paulo um novo tratamento contra um
tipo de câncer raro. A técnica, que pode ser
descrita como um "veneno radiativo teleguiado",
conseguiu abrandar os sintomas de 13 pacientes dos chamados
tumores carcinóides -variedade persistente da doença
que tem origem em células de glândulas ligadas
ao sistema nervoso. O método está agora em fase
final de validação.
Para desenvolver a técnica no Brasil foi necessária
a participação do Ipen (Instituto de Pesquisas
Energéticas e Nucleares), conta o médico Eduardo
Nóbrega, do Departamento de Imagem do Hospital A. C.
Camargo (antigo Hospital do Câncer de São Paulo),
um dos responsáveis pelos testes da técnica
no Brasil (por enquanto ela só existe na Holanda e
nos Estados Unidos).
A radioatividade usada pelos pesquisadores vem do elemento
químico lutécio, que os cientistas ligam a uma
molécula orgânica artificial batizada de octreotato.
Os tumores carcinóides produzem grande quantidade de
hormônios e provocam metástase, o espalhamento
do câncer pelo corpo. A molécula criada pelos
cientistas se vale justamente dessa característica
para identificar o tumor e atacá-lo com lutécio-177,
a variedade radiativa do elemento.
"A porção lutécio-177 [da molécula]
consegue destruir as células do tumor em todos os locais
onde ela se esconde [metástases]", diz o médico.
Isso porque, com a fixação do elemento na superfície
das células tumorais, a irradiação se
torna bastante localizada.
Ainda não é
a cura
Os teste da nova técnica no A.C. Camargo inspira otimismo.
Um dos voluntários é um médico que voltou
a clinicar, e outro é um estudante que agora frequenta
as aulas. A palavra "cura", porém ainda não
se aplica nestes casos, alertam Nóbrega e o seu colega
de instituição Marcelo Cavicchioli.
A técnica é segura e eficaz -e já foi
até oferecida em algumas instituições
particulares- dizem eles, mas seu papel primordial é
melhorar a qualidade de vida das pessoas.
"Estes tumores carcinóides surgem principalmente
no trato gastrointestinal" conta Nóbrega. "A
produção de hormônios determina a síndrome
carcinóide, que se caracteriza pela presença
de ondas de calor, rubor facial e diarréia constante
e incontrolável", diz.
Último recurso
Apesar de os médicos não conseguirem precisar
o benefício da técnica em números, ela
fez com que os 13 pacientes ganhassem meses ou anos a mais
de vida. "Esse tratamento é para quando não
resta mais nada a fazer. Os resultados são animadores",
diz Cavicchioli.
O primeiro paciente a ser testado em São Paulo recebeu
a dose inicial em março de 2006. Ao todo, 18 pessoas
começaram o estudo. Além de duas mortes -o estado
dessas pessoas já era quase irrecuperável, segundo
os médicos-, uma mulher engravidou e interrompeu o
tratamento. Outros dois pacientes desistiram de tomar mais
doses porque conseguiram melhora com técnicas mais
comuns.
Nem todo paciente de tumor carcinóide pode suportar
as infusões venosas da nova molécula terapêutica,
diz Nóbrega. O método traz um certo grau de
risco para os rins, entre outros problemas. Por isso, a lista
de pré-requisitos para receber esse tratamento não
é curta.
Outra opção em curso hoje é a intervenção
cirúrgica. "O problema é que, às
vezes, os tumores se instalam em locais inacessíveis,
e a radioterapia e a quimioterapia já não respondem
mais", diz o médico.
É nesses casos que técnicas novas como a testada
por Nóbrega têm papel fundamental.
Eduardo Geraque
Folha de S.Paulo
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