Hoje em
dia, quando saem da faculdade, médicos e advogados
têm muito mais opções de áreas
de atuação do que no início do século
20. As tecnologias são mais avançadas, e as
preocupações deste século não
são iguais às de antes. Quando uma mudança
social implica uma necessidade diferente, nascem outras áreas
para as velhas carreiras, que entram no novo campo tentando
cada uma delas estabelecer a sua parte.
Com o desenvolvimento da internet e o aumento de sua importância
na sociedade, por exemplo, profissionais foram deslocados
para esse novo campo. Cada carreira que poderia ganhar um
pedaço do terreno, então, tratou de demarcar
o seu território.
Os jornalistas, que escreviam para jornais, passaram a fazer
textos para a rede; designers, que diagramavam revistas, passaram
a desenhar páginas; publicitários foram produzir
anúncios; programadores começaram a desenvolver
sites; advogados foram cuidar das questões legais.
"Sempre que surge um novo objeto na sociedade, as carreiras
tratam de recortá-lo, cada uma com a sua especificidade.
Esse recorte, entretanto, é conflituoso e sempre envolve
relações de poder entre as profissões.
Se não surge uma carreira com força suficiente
para dizer "isso é meu e ninguém tasca",
elas vão disputar esse objeto", disse Maria da
Gloria Bonelli, professora de sociologia das profissões
da UFSCar (Universidade Federal de São Carlos).
Segundo ela, nem só de inovações tecnológicas,
como a internet, vive a evolução das profissões.
"A tecnologia tem um peso importante, mas muitas áreas
surgem de mudanças de valores."
Exemplo disso é a bioética, em que novas tecnologias
trouxeram outras preocupações. O problema de
até que ponto manter o tratamento de um paciente que
não teria melhora do quadro não existiria se
não houvesse as técnicas para mantê-lo
vivo. O mesmo acontece com o dilema de o que fazer com embriões
não-utilizados em clínicas de fertilização.
"Com essas técnicas, os profissionais começaram
a se ver diante de novas situações em seu dia-a-dia.
Para ajudar uma família a tomar uma decisão,
há comissões de bioética que englobam
profissionais da medicina, do direito, da filosofia e da antropologia
e que explicam a situação para os familiares
para que eles tomem suas decisões", disse Rosana
Fiorini Puccini, coordenadora da graduação em
medicina da Unifesp.
Outro caso de nova preocupação é a área
ambiental. Apenas no meio do século passado a sociedade
começou a se perguntar o que fazer com os restos de
sua produção, já que os seus efeitos
nocivos começaram a ser comprovados. Com isso, por
exemplo, engenheiros foram trabalhar nos novos sistemas de
tratamento, advogados passaram a tratar da legislação
e geógrafos e biólogos começaram a fazer
análises de impacto.
Racionalização
Outra possibilidade de ampliação da área
de atuação de velhas carreiras acontece quando
campos que já existiam são racionalizados e
profissionalizados para que dêem mais lucro, ou seja,
se transformam em negócios.
O esporte, por exemplo, por muito tempo não foi considerado
uma forma de gerar lucros e era mantido de forma amadora.
Quando se tornam negócios, todas as atividades têm
de ser racionalizadas para evitar prejuízos, e profissionais
especializados, como administradores, advogados, médicos,
fisioterapeutas e publicitários são contratados.
O mesmo aconteceu com as atividades do setor rural, que viraram
agronegócios. Para ser competitivo no mercado internacional
e evitar prejuízos por causa de condições
naturais ou de falta de planejamento, o que produzir, como
produzir e para quem vender passam a ser decisões de
carreiras como administração, economia, zootecnia,
agronomia, meteorologia e engenharia.
ANDRÉ NICOLETTI
da Folha de S. Paulo
|