Brasil
entra na corrida para dominar a quebra química da celulose,
o que pode elevar a produção de etanol em até
50%
Segundo pesquisador da Unicamp, país tem situação
privilegiada devido ao baixo custo da matéria-prima
e ao programa do álcool
O Brasil disputa para valer a corrida tecnológica que
decidirá quem vai conseguir tirar etanol de celulose.
A partir de 2009, o país poderá ter dominado
uma via de obtenção da energia contida no bagaço
e na palha da cana-de-açúcar, afirma um cientista
da Unicamp.
Em tempos de aquecimento global, a obtenção
do álcool de celulose -que pode ser obtida até
mesmo do papel e de parte do lixo orgânico- tem uma
elevada importância estratégica.
"No caso do Brasil, onde há uma situação
privilegiada de custo de matéria-prima, existem grandes
chances de viabilizar a hidrólise ácida comercialmente
de dois a cincos anos" afirmou à Folha Carlos
Rossell, do Nipe (Núcleo Interdisciplinar de Planejamento
Energético) da Unicamp.
Para o especialista, todo o esforço feito nas últimas
décadas com o etanol é que coloca o Brasil na
posição de liderança. "Hoje, por
exemplo, estamos em uma posição mais vantajosa
do que os EUA na produção dos biocombustíveis."
A própria visita ao Brasil do presidente George W.
Bush, marcada para 9 de março -e cujo principal tema
devem ser os biocombustíveis-, sustenta a opinião
do pesquisador.
Em São Paulo, representantes do governo americano disseram
na semana passada que a pesquisa e o desenvolvimento de biocombustíveis
podem ser o "eixo simbólico" de uma parceria
"nova e mais forte" entre o Brasil e os Estados
Unidos.
Para o Rossell, que também faz consultorias para empresas
do setor sucroalcooleiro, o Brasil terá seu próprio
modelo de hidrólise da celulose. "Isso não
é uma questão de nacionalismo. Teremos um modelo
próprio, porque nossas condições são
especiais", explica.
Um das dificuldades hoje na fase da hidrólise da celulose
é evitar o surgimento de substâncias que depois
vão dificultar o processo de fermentação.
Guerra tecnológica
A hidrólise ácida (a quebra da longa molécula
de celulose em açúcares por meio de substâncias
químicas) é uma das vias que estão sendo
estudadas para produzir álcool de celulose.
A outra é a chamada hidrólise enzimática.
Por essa via, que imita a natureza, o ataque à celulose
é feito por enzimas (grandes biomoléculas).
"A hidrólise enzimática hoje é a
que tem o maior potencial de conversão. O problema
é que não há enzimas disponíveis
capazes de fazer a transformação", explica
Rossell.
Segundo o pesquisador, o histórico do processo de produção
com a hidrólise ácida é muito mais antigo.
"Ele vem desde a 2ª Guerra Mundial. O que se faz
agora é tentar adaptar o processo para que essa produção
possa ter escala comercial, o que nunca foi feito".
Pelos cálculos de Rossell, a hidrólise poderá
ajudar muito o país na sua vontade de produzir etanol,
sem ter de aumentar muito a área plantada. O modelo
dele emprega como base uma destilaria capaz de produzir de
1 milhão de litros ao dia.
Desde que a geração de resíduos seja
otimizada - hoje a palha, por exemplo, é quase toda
queimada no campo- haverá 240 toneladas de biomassa
celulósica para ser utilizada. Superadas as barreiras
tecnológicas, esse total pode ser convertido em quase
500 mil litros de álcool, calcula o cientista.
Apesar dessa aposta na hidrólise ácida, nada
deve ser descartado, segundo Rossell. Até mesmo a opção
de alguns países da Europa e dos Estados Unidos, que
integraram a fase da quebra da celulose no mesmo processo
da fermentação (SSF, na sigla em inglês)
merece atenção. "Na pesquisa científica,
nós temos que aproveitar o que é feito lá
fora, e vice-versa", lembra Rossell.
Eduardo Geraque
Folha de S.Paulo
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