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O
rápido crescimento do interesse por energias alternativas
capazes de aplacar o aquecimento do planeta terá um
impacto significativo na criação de empregos
"verdes" no mundo nos próximos anos. Um estudo
inédito divulgado pelo Programa de Meio Ambiente das
Nações Unidas (Unep, em inglês) prevê
a geração de pelo menos 20 milhões de
novos postos até 2030 - 12 milhões apenas na
indústria de bionergia, onde o Brasil é um dos
principais players. O resultado econômico dessas mudanças
será um mercado global de serviços e produtos
"verdes" de cerca de US$ 2,74 bilhões em
2020.
"Projeções individuais para países
indicam forte potencial para criação de empregos
nos próximos anos. Os empregos verdes estão
claramente em alta", afirma o estudo, divulgado em meio
ao furacão financeiro que assola o mundo. Mas a crise,
vale dizer, não deverá mudar esse quadro no
longo prazo: as inovações tecnológicas
continuarão a despontar já que as mudanças
climáticas são um processo comprovado e irreversível.
O que pode acontecer, especula-se, é um retardamento
desse processo. Por isso, "políticas arrojadas
dos governos continuam sendo imprescindíveis",
alerta o estudo, citando subsídios, reforma fiscal
e orçamento para pesquisa e desenvolvimento como opções.
Intitulado "Empregos verdes: em busca de um trabalho
decente num mundo sustentável e de baixo carbono",
o estudo feito pela Unep, pela Organização Internacional
do Trabalho e outras organizações, traz um amplo
olhar para a emergência de uma "economia verde"
e seu impacto no trabalho no Século XXI.
Abrange uma vasta gama de profissões: de engenheiros
e pesquisadores a designers, arquitetos, auditores e agricultores.
Tudo o que, de uma forma ou outra, estiver ligado à
preservação de ecossistemas, à redução
do consumo de água e energia e à mitigação
ou prevenção da geração das diferentes
formas de lixo e de poluição.
O segmento de energia renovável tende a ser um dos
mais beneficiados. Globalmente, cerca de 300 mil pessoas trabalham
hoje com energia eólica e 170 mil com energia solar.
Quase 1,2 milhão de pessoas estão empregadas
no setor de geração de energia com biomassa,
sobretudo biocombustíveis, em apenas quatro países
- Brasil, Estados Unidos, Alemanha e China.
"São empregos com rápido ritmo de crescimento",
diz o estudo. "Comparado com as termelétricas,
a energia renovável gera muito mais empregos por unidade
de capacidade instalada, unidade de energia gerada e dólar
investido".
Se ainda são modestos, esses números têm
um potencial gigantesco para crescer. O estudo prevê
uma guinada no número de empregos de 600% no setor
de energia eólica, para 2,1 milhões de postos
em 2030. A energia solar deverá ter um incremento de
3.605% no mesmo período, chegando aos 6,3 milhões
de postos. As 1,2 milhão de pessoas ligadas atualmente
aos biocombustíves se transformarão em um exército
de 12 milhões de pessoas, como se a cidade de São
Paulo inteira se dedicasse unicamente à produção
de etanol.
Mas outros setores também serão "chacoalhados"
com as exigências cada vez maiores por tecnologias limpas
que solucionem velhos problemas. O imobiliário é
um deles. Prédios com isolamento melhor, ventilação
e aquecimento mais econômicos e iluminação
inteligente serão o padrão do futuro. A União
Européia prevê abrir, sozinha, mais 2,5 milhões
de cargos relacionados a essas melhorias até 2030 e
outros 1,4 milhão até 2050.
Esse mundo em transformação mexerá diretamente
com a estrutura das profissões. Cargos serão
adaptados para a nova realidade, caso de eletricistas, encanadores
e pedreiros da futura geração de edifícios
"verdes". Outros serão substituídos,
com funcionários de aterros sanitários migrando
para a incineração. Alguns setores serão
turbinados - a reciclagem é um exemplo. E muitos empregos
serão simplesmente eliminados do mapa. "No dia
em que a embalagem for banida ou desencorajada, isso levará
à descontinuidade da sua produção",
explica o estudo.
Dessa dança das cadeiras participarão todos
os países, sobretudo os desenvolvidos, onde ainda estão
concentrados a maioria esmagadora dos empregos verdes. Segundo
a consultoria Roland Berger, os empregos na indústria
de tecnologia ambiental na Alemanha representarão 16%
da produção industrial do país até
2030, nada menos que o quádruplo do que se verificou
em 2005. Mais: o setor ultrapassará em um prazo de
12 anos o número de empregos das poderosas indústrias
manufatureira e automobilística alemãs. "O
negócio verde está se tornando o motor do desenvolvimento
econômico alemão", diz a consultoria.
No Brasil, a criação de empregos ocorrerá
de forma mais acentuada no setor de bioenergia, onde os empregos
já acompanham o aumento de investimentos polpudos para
a produção de etanol. "A médio e
longo prazo é possível crescer muito no setor
de biocombustível", diz Ricardo Baitelo, coordenador
da campanha de energias renováveis do Greenpeace Brasil.
Ele cita como indicações disso as previsões
do setor de 28 mil MW gerados a partir da co-geração
do bagaço da cana até 2020. "É uma
Itaipu", diz o especialista. Outro fator que contribui
para um futuro de mais empregos "verdes" no país
é a recente criação da Comissão
Especial de Energias Renováveis do Congresso, onde
tramitam onze projetos-de-lei que convergirão para
a nova legislação de energia limpa. "Com
isso serão necessários mais projetistas de caldeiras
e engenheiros", exemplifica Baitelo.
De acordo com estimativas do setor, o Brasil tem cerca de
500 mil pessoas trabalhando com biomassa, número que
pode duplicar nas próximas décadas se houver
sinalização política correta. É
justamente aí, porém, que vem a ressalva: mais
emprego não significa uma vida melhor. O estudo alerta
que muitos trabalhadores - citando nominalmente o setor de
biocombustíveis no Brasil, Malásia e Indonésia
- ainda estão sujeitos a condições longe
do ideal. "Em certas áreas, sobretudo nos países
em desenvolvimento, os empregos que estão sendo criados
ainda deixam a desejar. Mal podem ser considerados trabalhos
decentes", afirma.
Bettina Barros
O Valor Econômico
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