Estudo
mostra que nascem menos meninos nas áreas mais poluídas
de SP; cromossomo Y é muito sensível a agentes
químicos
Em municípios agrícolas
do Estado do Paraná, o uso de agrotóxicos também
estaria relacionado à diminuição na proporção
de meninos
A poluição atmosférica,
a fuligem da queima da cana-de-açúcar e o uso
de agrotóxicos nas lavouras têm reduzido o número
de nascimentos de bebês do sexo masculino, indicam estudos
da USP e da Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz).
A hipótese é que as substâncias químicas
-chamadas de desreguladores endócrinos-, presentes
nesses poluentes alterem o mecanismo de regulação
do eixo hipotálamo-hipófise-gônadas e
inibam a fabricação de espermatozóides
que carregam o cromossomo Y (que determina o sexo masculino).
Diversos estudos na Europa e nos EUA vêm relatando que,
além da tendência de declínio na proporção
de homens, a exposição ambiental às substâncias
químicas pode contribuir para um maior surgimento de
cânceres hormônio-dependentes, redução
da fertilidade e malformações congênitas.
Uma análise publicada em outubro passado na revista
científica francesa "Gynécologie Obstétrique
& Fertilité" diz que há 15 anos diversos
estudos epidemiológicos têm demonstrado possíveis
associações entre o câncer de mama e os
pesticidas que levam na composição desreguladores
endócrinos.
No Brasil, ao menos dois trabalhos de pesquisadores da USP
mostram que quanto maior o número de partículas
suspensas na atmosfera, menor a quantidade de meninos nascidos
em regiões de São Paulo.
Foram avaliados o nível de poluição medido
em 15 estações da Cetesb e o número de
nascimentos registrados em cartórios da capital paulista.
Segundo o patologista Paulo Saldiva, pesquisador do Laboratório
de Poluição da USP, entre a área menos
poluída e a com maior índice de poluição
atmosférica, a diferença da proporção
de nascimento de bebês do sexo masculino foi de 1%-
51,7% e 50,7%, respectivamente, com 1.180 meninos a menos
na área mais poluída. A análise foi feita
entre 2001 e 2003.
"Sempre nascem mais homens do que mulheres [numa proporção
média de 51% e 49%] porque a mortalidade masculina
é maior. Porém, a proporção de
homens vem caindo conforme o nível de poluição
da região", diz Saldiva.
Segundo o urologista Jorge Hallak, outro autor do estudo,
estudos mostram que o cromossomo Y, que define o sexo masculino,
é muito sensível à exposição
de agentes químicos presentes na atmosfera. "Há
uma morte maior da linhagem germinativa que carrega o Y."
Em trabalho experimental, Hallak observou que ratos expostos
à poluição ejaculam menos espermatozóides.
"A poluição afeta a qualidade e a quantidade
de sêmen."
Em março, o urologista apresentará em congresso
em Roma um estudo inédito feito no interior de São
Paulo em que demonstra que as cidades onde há maior
queima de cana-de-açúcar -monitorada por satélites-
também têm redução do nascimento
masculino.
Agrotóxicos
Nas regiões agrícolas do Paraná, o declínio
do nascimento de homens é atribuído aos agrotóxicos,
segundo estudo da biomédica e pesquisadora da Fiocruz
Gerusa Gibson. A análise foi realizada entre 1994 e
2004, com base nos registros do IBGE (Instituto Brasileiro
de Geografia e Estatística).
O município de Jardim Olinda, no noroeste paranaense,
registrou a menor proporção de nascimentos de
homens no período analisado. Em 1994, teve uma taxa
de 62,5% e, dez anos depois, o índice de nascimentos
de meninos caiu para 26%.
Segundo Gibson, os agrotóxicos atuam como desreguladores
endócrinos porque, entre os mecanismos de ação,
têm estrutura molecular semelhante à de hormônios
naturais.
Alguns autores, como o inglês Willian H. James, sugerem
que não se pode atribuir a responsabilidade pelo declínio
na proporção de nascimento masculino só
à poluição ambiental, uma vez que não
se sabe como seria tal proporção na ausência
dessas partículas poluentes.