Uma pesquisa
feita com freqüentadores de shoppings da Grande São
Paulo mostrou que em 95% dos carros as crianças pequenas
não eram transportadas em "cadeirinhas" no
banco de trás. O estudo foi realizado pela ONG Criança
Segura Brasil, que na semana passada realizou em São
Paulo o 1º Fórum de Prevenção de
Acidentes com Crianças, com a presença de nove
instituições nacionais e internacionais.
A ONG Safe Kids foi fundada em 1987 nos EUA pelo cirurgião
pediátrico brasileiro Martin Eichelberger. Hoje, está
presente em 15 países e em quatro capitais brasileiras.
Segundo o Ministério da Saúde, no ano de 2001,
foram registradas no Brasil cerca de 7.000 mortes por "lesões
não intencionais" entre crianças até
14 anos. Estima-se que 40 mil ficaram com incapacidade física
permanente e 140 mil tiveram de ser internadas. "As mortes
por acidente representam mais que todas as mortes por doenças
juntas", diz o cirurgião pediatra João
Gilberto Maksoud Filho, presidente da ONG.
No fórum da semana passada, foi criado um comitê
justamente com a preocupação de reunir entidades
e iniciativas para reduzir os acidentes. Muitas vezes sem
a atenção e os cuidados que necessitam, as crianças
acabam vítimas de sua própria curiosidade e
brincadeiras. Se os adultos não cuidarem delas -num
universo com mais carros, com mais velocidade e menos espaço
de lazer-, a tendência é que continuem se ferindo
em maior número.
Abaixo, trechos da entrevista que o médico Maksoud
Filho concedeu à Folha.
Folha - Não há lei que obrigue
os pais a manter a criança devidamente "restrita"
em cadeirinha no banco de trás dos carros?
João Gilberto Maksoud Filho - Há
apenas recomendação, mas não legislação
ou multa. Os pais tendem a achar que segurar a criança
pequena no colo é mais seguro.
Segundo o Ministério da Saúde, as mortes de
criança em acidentes de carro chegaram a 1.250 em 2000.
Como em outros casos de acidentes, 90% das mortes e dos traumas
poderiam ser evitados. O problema é que não
há coleta rotineira sobre as condições
em que as crianças foram acidentadas dentro dos carros,
o que dificulta ações mais objetivas.
Folha - E os atropelamentos?
Maksoud - Eles ocuparam o terceiro lugar
entre os acidentes, com mais de 1.150 mortes, segundo dados
do governo. Crianças com menos de dez anos são
proibidas de atravessar a rua sozinhas, e a maioria dos pais
não sabe disso. Mesmo acompanhadas, elas são
vítimas da falta de faixas de pedestre e do desrespeito
de muitos motoristas.
Folha - As quedas, segundo dados do ministério,
ocupam o quinto lugar, com mais de 800 mortes, segundo dados
de 2001. O que explica esse tipo de acidente?
Maksoud - Sem espaços para brincar,
as crianças sobem nas lajes para empinar pipas ou sobem
nas janelas dos apartamentos. No segundo caso, é possível
protegê-las com redes ou grades, mas o que fazer com
as casas semi-acabadas das periferias, em que as lajes são
espaços de lazer?
Folha - As queimaduras por álcool
vinham caindo, mas estão voltando a subir.
Maksoud - A Anvisa, Agência Nacional
de Vigilância Sanitária, tinha exigido que o
álcool fosse vendido em forma de gel, o que dificulta
que se inflame. Com isso, os acidentes caíram 70%,
mas os fabricantes conseguiram uma liminar na Justiça
e voltaram a vender o álcool líquido.
Folha - Os afogamentos estão em primeiro
lugar entre as mortes de criança por acidente, com
quase 1.800 casos em 2.000.
Maksoud - São resultados de descuidos
no banho, brincadeiras na piscina ou imprudência no
mar ou lagoas. No geral, as crianças são vítimas
da falta de cuidados dos pais. Elas não utilizam equipamentos
de proteção para bicicleta ou skate, pais compram
detergentes clandestinos em garrafas de refrigerante, as armas
de fogo não são bem guardadas, crianças
brincam com sacos plásticos e acabam sufocadas.
AURELIANO BIANCARELLI
da Folha de S.Paulo
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