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Um teste realizado com 244.836 crianças
da primeira série do ensino fundamental dá uma
valiosa pista sobre os meios de produzir melhores alunos.
A imensa maioria dos que passaram pela pré-escola teve
melhores notas em língua portuguesa.
Dos que obtiveram ótimo, a nota máxima, como
conceito somente 10,2% não tinham passado pela chamada
educação infantil. Esse é apenas um detalhe
observado num exame (Saresp) em que se avaliaram 4,5 milhões
de alunos paulistas -grande parte dos quais da rede estadual-
do ensino fundamental e médio.
Diagnóstico: os cidadãos que tiveram a oportunidade
de serem estimulados desde o berço demonstraram mais
chance de progresso intelectual e profissional. Prognóstico:
se o poder público investir em educação
infantil, os futuros trabalhadores serão mais qualificados,
e os cidadãos, mais educados.
Apesar da extensão do teste realizado pela Cesgranrio,
com inúmeras lições sobre avanços
e deficiências -é inédita no Brasil uma
avaliação de 4,5 milhões de alunos desse
nível de ensino-, houve baixa repercussão.
Primeira explicação: ainda não nos convencemos,
de fato, da importância do capital humano para o desenvolvimento
de uma nação. Segunda: o país ainda não
sabe que a gestão sofrível, além de retardar
a qualificação dos cidadãos, é
o maior ralo de dinheiro público que existe no país.
Terceira: a onda de suspeitas de corrupção,
em ritmo de espetáculo, concentra quase toda a atenção.
Na semana passada, num debate na Folha, o ministro Patrus
Ananias, o secretário do Desenvolvimento Social do
município de São Paulo, Floriano Pesaro, Lena
Lavinas, da UFRJ, e Marcelo Nery, da FGV-RJ, demonstraram
uma série de divergências. Concordaram, entretanto,
em que as centenas de bilhões de reais drenados em
programas de educação, saúde e assistência
social poderiam ser mais bem usadas se tivéssemos mais
indicadores e melhor gerência.
Como os gastos sociais significam, nos três níveis
de governo, 25% do PIB (R$ 1,8 trilhão), estamos falando
de R$ 470 bilhões. É sabido que parte desse
dinheiro se perde na ineficiência. Por exemplo, falta
de foco, dispersão de programas e dificuldade de entrosamento
das ações em âmbitos municipal, estadual
e federal.
Na galeria de assuntos vitais e submersos na barulheira da
crise política está o Fundeb -a proposta de
uma nova repartição de recursos da educação,
que altera o financiamento dos ensinos médio e infantil.
Foi proposto o aumento do ensino fundamental para nove anos.
O problema gira em torno dos especialistas, longe, muito longe,
dos beneficiários da educação: pais e
seus filhos.
Um grupo de especialistas, por exemplo, lamenta que as creches
tenham ficado de fora da proposta. Pesquisas e mais pesquisas
têm demonstrado como o estímulo na fase de zero
a três anos de idade é decisivo no desenvolvimento
das crianças.
O governo federal lançou uma espécie de lei
de responsabilidade fiscal aplicada à saúde,
cujo objetivo é assegurar mais rigor nos gastos em
saúde pública, nos quais existe, como se sabe,
muito desperdício. Repercussão zero.
Nas últimas semanas, liberaram-se documentos que revelaram
como a disseminação do programa Médico
da Família reduziu a mortalidade infantil. Também
baixíssima repercussão. É o mesmo impacto
das estatísticas divulgadas há dez dias, nas
quais se vê a redução da taxa de gravidez
de adolescentes no Estado de São Paulo. Essa é
uma praga nacional, que envolve 1 milhão de adolescentes
todos os anos, sem contar os efeitos deletérios dos
abortos. Gravidez na adolescência é uma praga
que ajuda a explicar o aumento da miséria e até
da violência.
Uma experiência que envolve governo, fundações
e empresários, realizada em 2.400 escolas públicas
abertas nos fins de semana, conseguiu reduzir os índices
de agressão, as depredações, o tráfico
de drogas e o desrespeito aos professores. Instrumentalizaram-se,
nessas escolas, jovens para atuar como agentes comunitários.
Mais uma vez, nenhuma repercussão.
Uma das mais importantes experiências sociais brasileiras
é a redução da taxa de homicídios
na região metropolitana de São Paulo; só
na capital, a queda foi de 40%. Em bairros pobres devastados
pela violência, como Heliópolis (120 mil habitantes),
Cidade Tiradentes (150 mil habitantes) e Jardim Ângela
(120 mil habitantes), graças a engenhosas articulações
comunitárias, conseguiram ir mais longe: baixa de,
respectivamente, 50%, 70% e 75%. Lembre-se de que, até
pouco tempo atrás, o Jardim Ângela era apontado
como a região mais violenta do planeta.
A repercussão dessas descobertas limitou-se, ainda
assim escassamente, a São Paulo.
O efeito da corrupção é, como se vê,
maior do que se imagina. Além do desvio de dinheiro
e de abater o moral de todo um país, colabora para
tirar ainda mais o foco do que realmente importa numa nação,
que é a melhora de seu capital humano, cuja prosperidade
significa mais empregos e salários.
PS - Estaremos atingindo um novo estágio de aprimoramento
democrático quando nós, da mídia, dermos
tantas páginas às mazelas da educação
quanto damos à corrupção. Seremos um
país de fato desenvolvido quando resultados como o
do Saresp produzirem tanta emoção como os resultados
futebolísticos. Pode não parecer, mas a habilidade
de nossos alunos é mais importante do que a dos jogadores.
Coluna originalmente publicada na
Folha de S. Paulo, na editoria Cotidiano.
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