|
A capacidade de se comunicar é
uma das principais características do homem. Transmitir
conhecimentos acumulados permite repassar experiências
às gerações futuras, educando-as. A falta
que a comunicação faz está bem ilustrada
no episódio bíblico da Torre de Babel, mas também
pode ser resumida na frase do velho guerreiro Chacrinha: “quem
não se comunica, se trumbica”. Para pessoas que
vivem em comunidades distantes dos grandes centros, em que
educação e outros serviços públicos
não são garantidos a todos, a tarefa de se comunicar
é mais difícil e ainda mais importante.
Justamente para que essas populações
não se “trumbiquem”, o Projeto Saúde
& Alegria (PSA), a Rede de Desenvolvimento Humano (Redeh)
e o Comunicação, Educação e Informação
em Gênero (Cemina) vêm desenvolvendo projetos
que estimulam processos de comunicação em locais
distantes e isolados. Nestes lugares, onde internet e televisão
são raros, ganha força o meio de comunicação
que parece nunca perder seu potencial: o rádio.
Nos municípios de Santarém
e Belterra, oeste do Pará, o PSA, integrante do Banco
de Tecnologias Sociais da Fundação Banco do
Brasil, proporciona aos caboclos mocorongos (chama-se mocoronga
a pessoa natural de Santarém) uma intensa troca de
informações. A Rede Mocoronga de Comunicação
Popular é composta por 31 comunidades ribeirinhas,
formadas, em sua maioria, por descendentes de índios.
Organizada por jovens, que são capacitados como repórteres
rurais, a Rede serve como espaço para a expressão
da cultura local, fortalece a identidade das comunidades e
promove o uso de conhecimentos tradicionais para a conservação
da floresta. São produzidos programas radiofônicos
(transmitidos por alto-falantes espalhados pelos vilarejos),
vídeos (exibidos em telões montados) e jornais
comunitários (reproduzidos por mimeógrafo).
O coordenador do PSA, Caetano Scannavino,
lembra que antes da Rede, os jovens não se interessavam
muito pelas outras ações do programa, mas ficavam
de olho em câmeras e microfones. “Percebemos isso
e começamos o trabalho que iria originar isso tudo.
A comunicação para essas populações
é fundamental. Ela serve para mobilizar toda a comunidade
a partir de instrumentos geridos pelo público jovem,
que passa a ser valorizado, ganha o respeito dos mais velhos”,
diz. O conteúdo gerado vai desde acontecimentos locais,
pequenas histórias e entrevistas com idosos, até
campanhas de vacinação, de higiene e de prevenção
contra queimadas.
“O trabalho dos jovens resgata,
registra e difunde a cultura local”, destaca o coordenador.
“E resgatar a cultura, na Amazônia, pode ser considerado
educação ambiental, pois para essa população
é uma questão de sobrevivência”,
complementa, referindo-se ao fato de que a escassez de serviços
e a baixa circulação de moeda obrigam os caboclos
a usar os recursos naturais de forma sustentável. As
fitas de vídeo e cassetes são trocadas entre
as comunidades, permitindo o intercâmbio de experiências.
Além disso, o PSA seleciona os melhores conteúdos
e os divulga fora da região, permitindo que se tenha
uma imagem da Amazônia a partir da ótica de seus
próprios moradores.
O próximo passo, agora, é
entrar no mundo digital. A Rede já conta com dois telecentros
e o objetivo é estender o acesso à Internet
a todas as comunidades e construir um portal. A Rede Mocoronga
já recebeu o Prêmio Telemar de Inclusão
Digital e o Prêmio Yeomans para Conteúdos Locais,
oferecido pela Global Knowledge Partnership, uma parceria
entre organizações de 144 países.
Enquanto isso, no semi-árido...
No sertão nordestino, a Redeh e o Cemina também
usam o rádio para potencializar suas ações.
Atualmente, o Programa de Capacitação em Convivência
com o Semi-Árido ocorre nos municípios baianos
de Paulo Afonso e Curaçá e em Delmiro Gouveia,
Alagoas. A metodologia, vencedora de um edital do Programa
Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familar (Pronaf),
capacita jovens agricultores para que eles abordem em suas
comunidades temas importantes, como questões ambientais
e de gênero e técnicas de convivência com
o semi-árido.
Os beneficiados, principalmente mulheres
e jovens de até 35 anos, recebem orientações
sobre esses temas e são capacitados em produção
radiofônica para produzir programas a fim de repassar
aos demais membros da comunidade as informações
recebidas. “Quase todo município do Brasil tem
um pequeno programa de rádio acessível à
população e que serve quase como um núcleo
comunitário”, justifica a coordenadora-geral
da Redeh e do Cemina, Thais Corral.
Os principais temas abordados
nos programas são: gravidez na adolescência e
a sua prevenção, violência contra a mulher,
corrupção e meio ambiente. “Usamos o rádio
como meio de comunicação e de cidadania”,
define Thais. A metodologia do Programa de Capacitação
em Convivência com o Semi-Árido constituirá
uma das técnicas a serem apresentadas no seminário
Promovendo o Uso de Tecnologias Adequadas ao Desenvolvimento
Sustentável de Comunidades Remotas do Semi-Árido
Brasileiro. O evento, organizado pela Redeh/Cemina, está
marcado para os dias 17 a 19 de agosto, em Maceió.
IVAN KASAHARA
do site da Fundação Banco do Brasil
|