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Dez anos depois de firmado entre
o governo do Estado do Rio de Janeiro e organismos estrangeiros,
o Programa de Despoluição da Baía de
Guanabara (PDBG) consumiu cerca de US$ 1,1 bilhão e
não limpou a baía. Ao contrário: com
o aumento das cidades em volta, cresceu a quantidade de lixo
e esgoto despejados no mar.
Segundo o contrato, o PDBG estaria concluído em 1999
-as oito estações de tratamento deveriam estar
em plena operação, captando esgotos domiciliares
e industriais, retirando parte das impurezas e jogando-os
na baía.
As praias mais próximas à saída da baía,
como Flamengo (zona sul) e Icaraí (em Niterói),
deveriam apresentar condições de banho. Não
haveria mais despejos de resíduos industriais.
Nada disso ocorreu. Cinco anos após o prazo de conclusão
previsto, as 52 praias da
baía continuam imundas. As estações foram
construídas, mas não funcionam. Os prédios
foram erguidos e as máquinas, compradas. Mas a maior
parte do esgoto não chega às estações
por falta troncos coletores e redes domiciliares.
Por dia, a baía de Guanabara recebe cerca de 1,7 milhão
de toneladas de esgoto e 1.500 toneladas de lixo. Mais 10.500
toneladas vão para "lixões" e aterros
ditos sanitários vizinhos. Parte desse material acaba
escorrendo para o mar.
As grandes indústrias, como a Refinaria Duque de Caxias,
diminuíram os despejos de materiais sem tratamento,
para se adequar às normas ambientais. Já a fiscalização
das pequenas e médias é precária. Cerca
de duas toneladas de óleo são despejadas todo
dia na baía, estimam ambientalistas. Não se
sabe o quanto de metais pesados acaba indo para o mar.
Circuito
Na última quarta, a Folha esteve nos sete
municípios no entorno da baía (Rio, Duque de
Caxias, Magé, Guapimirim, Itaboraí, São
Gonçalo e Niterói). Visitou praias, deltas dos
principais rios e manguezais. A sujeira predominava.
Nas laterais da foz do rio Bomba (São Gonçalo),
o chão era forrado por plásticos e madeira.
Na avenida Litorânea (Niterói), pescadores jogavam
anzóis em meio aos detritos. Em Mauá (Magé),
um valão de esgoto sai direto no mar.
Os rios viraram esgotões, que deságuam na baía
sem tratamento. O lixo chega por eles à baía.
O pesado vai ao fundo. O leve flutua até chegar à
orla.
Áreas nos municípios de Magé e São
Gonçalo estão sendo favelizadas, o que resulta
num aumento da sujeira, levada para a baía por causa
do desmatamento.
Um exemplo do aumento no despejo de lixo pode ser constatado
em Niterói. Em fevereiro de 2001, a empresa de limpeza
da cidade recolheu, nas praias da baía, 522 toneladas
de lixo. Em fevereiro de 2003, foram 700 toneladas.
Melhora temporária
No governo Anthony Garotinho (janeiro de 1999-abril
de 2002), a Feema (Fundação Estadual de Engenharia
do Meio Ambiente) chegou a registrar melhorias na qualidade
do mar em Niterói e no Flamengo. Trechos da orla foram,
então, considerados próprios para o banho pelo
órgão, vinculado ao governo estadual.
A Feema, na ocasião, informou ter recolhido amostras
da água e constatado a diminuição da
quantidade de coliformes fecais, indicativo da contaminação
por esgoto.
Mas o quadro não se manteve. A própria Feema
tem feito alertas diários: banhistas devem evitar as
praias da baía.
A CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) da
Assembléia Legislativa do Estado que, no ano passado,
investigou o PDBG concluiu que, "apesar dos excessivos
gastos ocorridos até o momento, o programa não
funciona".
"Esta CPI constatou que, se um objetivo foi alcançado
até agora, foi o de conseguir gastar quase que na totalidade
os recursos destinados ao programa, sem que isso significasse
o efetivo funcionamento", diz o documento.
Segundo o relatório, houve "abuso da ordem econômica"
por parte dos responsáveis pelo PDBG, ao atrasar os
serviços. Por causa dos atrasos, os contratos foram
prorrogados cinco vezes.
"Com os aditamentos, o programa já está
orçado em mais de US$ 1 bilhão, que terá
de ser pago pelo povo fluminense, com juros."
O relatório critica a opção por obras
de saneamento. Cerca de 80% dos recursos do PDBG são
destinados a melhorias no saneamento básico da região.
"O benefício para a baía será mínimo,
[porque] representará apenas a redução
de cerca de 30% da carga de matéria orgânica."
Concluído no fim de 2003, o relatório da CPI
ainda não foi votado pelo plenário da Assembléia.
Segundo o presidente da comissão, Alessandro Calazans
(PV), isso deve acontecer na quarta-feira.
SERGIO TORRES
da Folha de S.Paulo
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