A atual
organização dos conteúdos no ensino superior
não irá durar mais uma década, avalia
o filósofo Mario Sergio Cortella, professor da pós-graduação
em currículo da PUC-SP. Para ele, a universidade não
pode apenas transmitir informações -precisa
dar ao estudante uma "autonomia intelectual". Leia
abaixo os principais trechos da entrevista com Cortella, 51.
(FT)
Folha - O currículo do ensino superior precisa mudar?
Mario Sergio Cortella - A reforma que gerou a organização
curricular atual é de 1968. Foram criados a estrutura
de currículo, os departamentos e as disciplinas com
uma configuração que, com uma mudança
ou outra, não sofreram alteração. A organização
curricular hoje está defasada? Sem dúvida. Ela
não responde a alguns requisitos como a interdisciplinariedade,
que é a relação de conexão dentro
dos conteúdos, e a multidisciplinariedade, que é
oferecer um repertório maior de conteúdos na
formação de uma pessoa.
Folha - Qual a dificuldade que há com o currículo
tradicional?
Cortella - É muito fechado. E cai em uma armadilha
contida no próprio nome: grade curricular. Esse modelo
está anacrônico. Há múltiplas fontes
de conhecimento e de informação, especialmente
a mídia. Não podemos usar o espaço escolar
apenas para transmitir informação. O que se
deve buscar é a autonomia intelectual.
Folha - As universidades serão forçadas a mudar?
Cortella - As mudanças precisam ocorrer. O distanciamento
entre a necessidade e a formação pode levar
a uma ruptura. Claro que a universidade tem uma instância
de criação e de iniciativas que não pode
ser vinculada ao mercado, porque ele é muito volátil.
Mas ela não pode deixar de tê-lo como referência.
[Essa ruptura] seria, cada vez mais, as próprias empresas
procurarem fazer a formação de seus funcionários.
Folha - Para o sr., até quando o atual modelo irá
persistir?
Cortella - Ele não resistirá a mais uma década.
Esse modelo de flexibilização, porém,
assusta dentro e fora da universidade. Há alunos que
não o aceitam, por entender que isso será uma
formação ruim.
Folha - Como esse tema está em discussão no
exterior?
Cortella - Os modelos são diversos, vão desde
turmas com três professores abordando o mesmo tema até
o trabalho com projetos, em que todos os conteúdos
são vistos ao mesmo tempo.
Folha - O que precisa ser considerado ao criar essas propostas?
Cortella - Não cair na teoria da curvatura da vara.
Quando você está com uma vara estendida para
um lado e a solta, a tendência é que ela se curve
totalmente para o outro, causando um descompasso muito grande.
Para que isso não ocorra, é necessária
a participação de professores, funcionários
e alunos. Precisa também de uma avaliação
contínua. E, quando necessário, não ter
medo de mudar a rota.
As informações são
da Folha de S.Paulo, editoria Cotidiano.
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