Uma empresa que teve como executivo um secretário
da gestão Marta Suplicy (PT) foi habilitada na licitação
do lixo da Prefeitura de São Paulo que irá escolher
dois responsáveis por contratos de até R$ 9
bilhões para coleta, transporte, tratamento e destinação
final dos resíduos por 20 anos -prorrogáveis
por igual período.
Documentos da Junta Comercial de São
Paulo apontam que, até 28 de julho de 2003, Roberto
Luiz Bortolotto, secretário de Infra-Estrutura Urbana
desde julho de 2001, constava como diretor da LOT Operações
Técnicas Ltda. Ele diz que deixou a empresa em 2000
(para ir trabalhar em Santa Catarina), embora a alteração
só tenha sido oficializada no registro competente em
julho passado.
O nome de Bortolotto como ex-administrador
da LOT consta do contrato social que os participantes da disputa
entregaram e que é vistoriado por integrantes da comissão
de licitações.
A LOT, que teve uma receita de R$
15 mil em 2002 e que estava praticamente sem serviços
havia três anos, "ressuscitou" no mercado
do lixo por conta das regras estabelecidas na concorrência,
cujo edital foi apresentado em audiência pública
no dia 16 de julho de 2003 e publicado no "Diário
Oficial" no mês seguinte.
O ressurgimento da LOT nesse segmento
-ela nunca fez os serviços de coleta na capital paulista,
mas em cidades menores, como Cachoeiro de Itapemirim (ES)-
foi possível em razão de uma exigência
da licitação de que os participantes tivessem
experiência em operação de usinas de compostagem
numa quantidade mínima de 9.000 toneladas por mês.
"Muita pouca gente tem a prerrogativa
desse trabalho", reconhece Elias Chamma, proprietário
da LOT, que inclui entre os detentores do atestado a Vega
e a Qualix (ex-Enterpa), líderes dos outros dois grupos
classificados.
O trunfo da LOT foi conquistado em
razão de um contrato de operação da usina
de compostagem da Vila Leopoldina (a única em funcionamento
na cidade de São Paulo) obtido no final da gestão
Luiza Erundina (1989-1992). Esse atestado fez ela ser convidada
a integrar um consórcio liderado pela Queiroz Galvão,
que, sozinha, não atenderia à exigência.
O motivo alegado para a necessidade
desse atestado é que, diferentemente do que ocorre
hoje, a licitação vai conceder uma série
de serviços ao mesmo tempo (coleta, manutenção
de aterros e de usinas) a somente dois grupos -que precisam
ter, entre seus integrantes, empresas com experiência
em todas essas atividades.
Assim, ficam de fora os que tiverem
muita experiência em apenas um desses trabalhos -e que
até hoje podiam disputar um dos nove lotes da coleta
ou contratos separados para cada especialidade.
Para a prefeitura, seu modelo atual
é pioneiro (no resto do país prevalecem contratos
para cada serviço). Com ele, a experiência em
usinas de compostagem, embora tenha representatividade inferior
a 5% no montante contratual de até R$ 9 bilhões,
ganha importância estratégica na seleção.
Demissão
O secretário Bortolotto é filiado ao PT e começou
a administração Marta Suplicy como chefe-de-gabinete
de Walter Rasmussen Júnior, que cuidava tanto da Secretaria
de Serviços e Obras, responsável pelos contratos
de lixo, como da de Infra-Estrutura Urbana.
Rasmussen pediu demissão, em
julho de 2001, na primeira crise da gestão petista,
depois da revelação feita pela Folha, de que
ele havia trabalhado numa empresa de lixo (Intranscol S/A
Coleta e Remoção de Resíduos) até
dezembro de 2000 e que a havia contratado sem licitação.
Com sua queda, Bortolotto assumiu a Infra-Estrutura.
A participação da LOT
no consórcio com a Queiroz Galvão e com a Heleno
e Fonseca se dará sem que ela saiba exatamente se terá
que prestar algum serviço -ou se vai receber somente
em razão do atestado fornecido na fase de concorrência.
A proporção oficial dela no grupo é de
1%.
"Para mim, 1% de uma coisa muito
grande já é uma coisa razoável",
afirma Chamma. Segundo ele, se qualquer um dos dois lotes
em disputa for conquistado pelo consórcio do qual faz
parte, a LOT deverá receber algo proporcional à
sua participação no grupo. Esse montante se
aproxima de R$ 2,3 milhões anuais -153 vezes a receita
da empreiteira em 2002.
ALENCAR IZIDORO
CHICO DE GOIS
da Folha de S.Paulo
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