As estatísticas
indicam que a ampliação do ensino fundamental de oito para
nove anos não deverá causar falta de vagas. Mas especialistas
em educação prevêem uma mudança prejudicial ao aluno se o
professor não for preparado e se começarem mais cedo as cobranças
por resultados e a repetência, inexistente na pré-escola.
Dados tabulados a pedido da Folha
pelo IBGE a partir da Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra
de Domicílios) mostram que, já em 2004, apenas 11,5% das crianças
de seis anos estavam fora da escola. Dos que estudavam, 26%
já cursavam o ensino fundamental, não mais a pré-escola.
O preocupante é que os Estados que
mais matriculavam em 2004 alunos de seis anos no fundamental
tinham altos níveis de repetência. Rio Grande do Norte (42,1%),
Alagoas (38,1%) e Paraíba (37%) possuíam a maior proporção
de crianças de seis anos no ensino fundamental. E tinham índices
de repetência de, respectivamente, 45,5%, 44,6% e 46,6% na
primeira série, segundo o Censo Escolar de 2004. A média nacional
de repetência para essa série é de 29%.
Para sindicatos de professores desses
Estados, a ampliação teve o objetivo único de obter mais verba
do Fundef, que distribui recursos segundo o número de alunos
no fundamental. Com a entrada de estudantes de seis anos nessa
faixa, cresce o repasse recebido.
Desde 1996, a LDB (Lei de Diretrizes
e Bases da Educação) permite a matrícula no ensino fundamental
de crianças de seis anos, mas define que, na pré-escola, não
pode haver avaliação para repetir ou promover os alunos. A
sanção do ensino fundamental de nove séries, para a maioria
dos educadores consultados pela Folha, ajuda a universalizar
o acesso de crianças de seis anos à escola. Mas é unânime
a preocupação com a forma como isso ocorrerá.
"Há o perigo de as redes adotarem
a repetência na 1ª série com alunos de seis anos. Isso colocaria
a criança diante do fracasso muito cedo, o que prejudica todo
o período escolar", diz o presidente da Câmara da Educação
Básica do CNE (Conselho Nacional de Educação), Cesar Callegari.
Rose Neubauer, ex-secretária estadual
da Educação de São Paulo e ex-integrante do CNE, é contra
o aumento do fundamental e prefere a ampliação do ensino profissionalizante
para jovens. "A faixa de crianças na pré-escola já estava
mais bem atendida. Aumentar a escolaridade obrigatória aos
seis sem resolver o problema da qualidade significa enfiar
essas crianças precipitadamente na cultura de repetência e
submetê-las a uma pedagogia absolutamente inadequada para
a faixa etária." Para Regina de Assis, especialista em educação
infantil e também ex-integrante do CNE, a ampliação é, sim,
positiva, mas há risco para essas crianças: "Nada adiantará
se os professores tiverem as mesmas deficiências que hoje
têm no trabalho com alunos de sete".
O aprendizado nos anos iniciais deve
ser prazeroso, diz ela. "A criança aprende de maneira lúdica
aos seis ou sete anos, mas muitos professores trabalham com
uma seriedade que cria aversão. Ela aprende que o mundo da
escola foi interessante, mas, a partir daquele momento, será
uma chatice: ditados, copiar, repetir."
Ângela Soligo, psicóloga e coordenadora-associada
do curso de pedagogia da Unicamp, diz que não se deve esperar
que as crianças de seis anos aprendam a ler imediatamente.
"Essa primeira série será importante para a criança começar
o contato com leitura e escrita. Se forçar, ela achará que
a escola é chata e desanimará."
ANTÔNIO GOIS E FÁBIO TAKAHASHI
da Folha de S.Paulo
Lula sanciona
ensino fundamental de 9 anos
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