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07/04/2006
Carta da semana
O Bananal é imenso
"Dona Lu Alckmin recebeu
quatrocentos vestidos de graça de um costureiro. O marido
de Dona Lu era até ontem o Governador do Estado de São
Paulo, o mais importante Estado do país, detentor do
segundo orçamento da República. Ninguém
sabe das motivações do generoso costureiro. Talvez
seja o amor ao belo.
Mas o fato é que os vestidos entregues à mulher
do poderoso homem público foram gratuitos. A digna senhora
os vestiu. Certamente os decotes foram moderados como convém
ao decoro de mulher de tão importante homem, ambos católicos
praticantes. Surgiram diferentes versões para o destino
dos vestidos. Ninguém sabe direito onde estão.
Como ninguém sabia direito quem tinha quebrado o sigilo
do Francelino. Graças à imprensa, que faz bem
ao país ao exigir a investigação dos poderosos,
agora sabemos. Parabéns.
O
fato é a mulher do homem que detém o segundo
mais importante cargo eletivo do país recebeu presentes
privados. Presentes como esses, vestidos caros, que certamente
não se encontram na Vinte Cinco de março, habitualmente
não são dados à mulheres de homens que
não sejam importantes, como importantíssimo
é o cargo de Governador do Estado de São Paulo!
Cargo público dos maiores! Nem banco estatal falta,
como falta ao infeliz governador do Amapá.
Como a imprensa brasileira tratou
a questão dos quatrocentos vestidos? Mal tratou! Algumas
matérias esparsas, técnicas, nada mais. Os intérpretes
da opinião pública não se indignaram
ao assunto. Tudo soou normal, ético, lícito.
São presentes, apenas presentes. Todo mundo pode dar
e receber presente. Outro dia dei uma saia para minha esposa.
Ela gostou, achou delicado de minha parte.
Um certo Silvinho Pereira ganhou de
presente uma Land Rover! A imprensa brasileira partiu como
fera ferida contra o absurdo de um presidente de partido no
poder ganhar um carro de luxo. A Folha de S. Paulo buscou
na língua de Camões, "a última flor
do Lácio, inculta bela", todos os adjetivos negativos
para qualificar o caso e desqualificar o receptor do presente.
E fez muito bem! Eu gostaria de saber o valor de mercado dos
quatrocentos vestidos usados por Dona Lu. Em outras palavras,
o valor dos vestidos equivalem a uma Land Rover? Valem mais,
valem menos?
Mas seja honesto meu leitor amigo,
aí na sua intimidade, você já imaginou
o que imprensa brasileira diria se Dona Marisa da Silva recebesse
quatrocentos vestidos? O que diria a Folha de São Paulo,
a guardiã da moral pública do governo federal?
Faltariam adjetivos ao vernáculo. Veriam crimes, não
faltariam dispositivos legais a serem a citados com correção
e precisão. A tal Dona Marisa da Silva, mais seu marido,
o Presidente da República, seriam ambos ofendidos e
qualificados em termos pouco honrosos. E que ninguém
tivesse com piedade! Afinal delinqüiram. Homens públicos,
diz a lei, não podem receber presentes dessa monta.
Quatrocentos vestidos para a mulher
do Presidente! A prova da afetação mais que
ridícula dos suburbanos no poder. Coisa de uma republiqueta
de bananas, diria o Clóvis Rossi, que soltaria enfim
o grito preso na garganta, com a alegria similar a um gol
do Palmeiras. Impeachment ao canalha que governa o Brasil
e a canalha que o serve! Alguém aí acha que
esses vestidos são de graça, indagaria o premiado
o jornalista. Quatrocentos vestidos, meu Deus, aonde chegamos!
Nem Collor!
(A Veja dissertaria sobre a saudade
da elegância e da discrição de Fernando
Henrique e sua esposa. Quatrocentos vestidos para uma mulher
feia, diria Diogo Mainardi! E a Ângela Guadagmin? A
roliça senhora, nos termos usados por Josias de Souza,
teria vestido uma blusa amarela do mesmo costureiro? Diriam
que o crime se associara a breguice do subúrbio).
Quatrocentos vestidos à mulher
do Presidente! Ridículo, não fosse trágico.
O signo da morte da ética. Até a Danuza Leão
investiria contra o casal presidente delinqüente, aproveitando
para considerá-los pouco bonitos e bastante desajeitados,
face aos padrões metropolitanos. Quatrocentos vestidos
à mulher do Presidente! Porque a namorada de Francenildo
nunca recebeu quatrocentos vestidos? Mas a mulher do ocupante
do Planalto sim? Porque, é a pergunta que não
quer calar.
Vinicius Torres Freyre faria uma coluna
com requinte intelectual, para provar o sentido anti- republicano
patente nos vestidos "dados" (diriam entre aspas)
à mulher do poderoso de turno. Toda a Folha de S. Paulo
se insurgiria em favor da ética e do decoro republicano,
constrangida e ofendida pelo horror do Brasil, onde a mulher
do Presidente recebe quatrocentos vestidos. Nem no Haiti!
Alguém já viu Laura Bush ou Hillarie Clinton
receber "de graça" vestidos? Na França
jamais!
Eliane Cantanhêde e Fernando
Rodrigues não ficariam atrás. Fariam colunas
entre irônicas e iradas, sobre o ridículo tipicamente
brasileiro, onde os poderosos são brindados com "presentes"
ofertados de diferentes maneiras, dê-se o nome de caixa
dois, mensalão ou o que for.
Se os honrados jornalistas e colunistas
contestassem veementemente o Presidente, o qual sua mulher
veste quatrocentos vestidos, todos dados de presente, não
fariam mal, fariam muito bem! Convenhamos, quatrocentos vestidos
à mulher do Presidente operário seria um escárnio!
Mas quando o poderoso é Geraldo
Alckmin, um médico de interior, filho de boa família
e marido da honrada Dona Lu, aí as coisas são
diferentes. São bem diferentes! Os adjetivos são
outros, as perguntas outras. O foco é outro, "Porque
agora é Lula".
O Clóvis Rossi tem razão! Que bananal é
o país inteiro. Inteiro! E as redações,
como manda a constituição, não estão
fora do país.
O Bananal é imenso. Imenso é o Bananal",
Alberto Luiz Schneider.
Texto enviado ao site através do mailling.
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