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Dos alunos que se formaram nas
Fatecs (Faculdades de Tecnologia do Estado de São Paulo),
mantidas pelo Centro Paula Souza, 89% estão empregados
e ganham, em média, R$ 1.740 por mês.
Apesar desses resultados, levantados em pesquisa no ano passado,
os cursos de tecnologia, voltados para o mercado de trabalho,
ainda sofrem preconceito. São, entretanto, um dos caminhos
óbvios para democratizar o ensino, qualificar os trabalhadores
e, assim, estimular a produtividade da economia brasileira
-o que se traduz em incentivo à geração
de empregos e de melhores salários.
Persiste, porém, o que poderíamos chamar "mania
de doutor", especial reverência ao diploma universitário.
Temos, no Brasil, cerca de 3 milhões de alunos nas
universidades e 60 mil estudantes nos programas para tecnólogos.
Estamos diante de mais uma daquelas obtusidades sociais brasileiras.
Os cursos para a formação de tecnólogos
têm duração inferior (variam de dois a
três anos) à dos das universidades. Ensinam especializações
nas mais diversas áreas de gestão (saúde,
logística, transporte, têxtil, meio ambiente)
e engenharia (mecânica de precisão, informática,
eletrônica, mecatrônica, navegação
fluvial). A cada ano, essas instituições ampliam
suas áreas de ensino.
A formação de um tecnólogo custa, em
média, R$ 3.000 por ano; a de um estudante de universidade
pública sai por R$ 8.000, já descontadas as
despesas com pesquisa e hospitais universitários.
É menos difícil, como se vê, expandir
os programas de nível superior focados no mercado de
trabalho. Isso inclui os chamados cursos seqüenciais,
de dois anos, que, ministrados em várias faculdades,
abrangem as mais diversas áreas de atuação,
como o desenvolvimento de videogames, culinária, moda
e até a formação de juiz de futebol.
Há, entretanto, uma diferença entre esses dois
tipos de programa; os tecnólogos estão habilitados
a cursar mestrado e doutorado.
O movimento por cotas é a expressão popular
da convicção de que mais vagas nas universidades
significam melhores empregos. Ocorre, porém, que, como
mostrou o caderno especial da Folha na sexta-feira passada,
as vagas nas faculdades mais concorridas são, em sua
maioria, preenchidas por alunos de escolas privadas. Alunos
de apenas 16 escolas da cidade de São Paulo abocanham
36% das vagas das faculdades mais cobiçadas da USP.
Nesse seleto grupo, existem três escolas públicas,
todas de ensino médio técnico, que exigem vestibulares
duríssimos.
Goste-se ou não, a verdade é que as universidades
em que existe pesquisa foram, são e sempre serão
agrupamentos de elite.
Basta fazer as contas para ver que é matematicamente
impossível a universalização do ensino
superior. Tal universalização, aliás,
não ocorre nem nos países mais ricos.
Nas homenagens ao trabalhador, como as de hoje, os líderes
sindicais costumam esbravejar -e com razão- contra
o desemprego, o subemprego, o baixo salário etc. Por
ignorância ou vício corporativo, não se
engajam em campanhas pela melhoria do ensino público.
Um dos sinais da indigência social brasileira é
a desconexão entre as bandeiras trabalhistas e as educacionais.
Isso apesar dos números contundentes. Em março
deste ano, quem tinha mais de 11 anos de estudo ganhava, em
média, R$ 1.382 mensais, segundo pesquisa divulgada
na semana passada pelo IBGE. Entre aqueles que estudaram menos
de um ano, a média baixa para R$ 361.
De 2002 até agora, apenas na faixa superior a 11 anos
de estudo aumentou a taxa de ocupação no mercado
de trabalho.
Traduzindo: maior escolaridade, melhores salários e
mais empregos.
Apesar desses números, a agenda sindical não
exibe preocupação com a qualificação
do trabalhador em nível superior ou até em nível
médio técnico.
Não vou aqui discordar da concessão de cotas
nem concordar com ela, mas a expansão de cursos de
curta duração, centrados no mercado de trabalho,
é uma bandeira mais viável do que essa para
a democratização do ensino superior.
PS - Uma boa notícia, interessante para quem gosta
de experiências em educação: o coreógrafo
Ivaldo Bertazzo e o maestro João Carlos Martins, ambos
de renome nacional e internacional, ganharam na semana espaço
fixo nos CEUs (Centros Educacionais Unificados) para detectar
e desenvolver, na periferia de São Paulo, talentos
na área da dança e da música clássica.
Vale a pena ler a edição, divulgada na semana
passada, do caderno Sinapse, da Folha, que mostra pesquisas
sobre como o contato contínuo com a arte produz, entre
os mais pobres, alunos mais atentos, criativos e com melhor
desempenho escolar.
Coluna originalmente publicada na
Folha de S. Paulo, na editoria Cotidiano.
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