A diretora
de "Antônia", Tata Amaral, precisou conhecer
a periferia para reencontrar-se no centro de São Paulo
Depois de ter lançado comercialmente seu filme "Antônia",
no início deste mês, Tata Amaral já estuda
roteiros para futuras filmagens. Durante a leitura, ela foi
percebendo uma viagem íntima e involuntária
pelos cenários perdidos de sua infância. "É
uma estranha coincidência." Tata é um desses
personagens que aprenderam a se reencontrar com São
Paulo. No caso dela, usando o cinema.
Tata nasceu há 46 anos na rua Major Quedinho, a poucos
metros da biblioteca Mário de Andrade. Estava cercada
de elegância. Divertia-se na praça D. José
Gaspar e passeava pela galeria Metrópole. Diariamente,
percorria a avenida São Luiz, com seus imponentes edifícios,
em direção à praça da República,
onde estudava em escola pública. "Eu tinha sete
anos e ia a pé até a escola." Caminhava
sozinha, sem o menor receio.
Na adolescência e na juventude, ela ainda viveu a efervescência
da região central. Aproveitou a liberalidade do cine
Bijou, cujos filmes para adultos eram acessíveis a
qualquer estudante, as peças do teatro Arena e os encontros
culturais do Colégio Equipe, com seus shows baratos
de Caetano Veloso, Gilberto Gil, Tom Zé, Os Novos Baianos,
Jorge Mautner.
Com a deterioração paulistana, ela abandonou
o centro, as praças ficaram sujas e os marginais conquistaram
espaço. A biblioteca entrou em decadência e a
galeria Metrópole ganhou um ar sombrio. Crianças
andando sozinhas só se fossem moradores de rua. Tatá
perdeu o hábito de caminhar. "Comecei a me sentir
com medo e estrangeira."
Até que veio a festa dos 450 anos de São Paulo,
quando ela leu o livro do jornalista Roberto Pompeu de Toledo
sobre a história da cidade, intitulado "A Capital
da Solidão". Deu-se conta, então, das profundas
raízes paulistanas de sua família. "Minha
família está aqui há tanto tempo e eu
não me sentia em casa."
O centro de sua infância transformou-se, para ela, numa
espécie de periferia. Mas precisou conhecer a periferia
para reencontrar-se no centro.
Ao investigar sobre como o rap se alastrava entre jovens
pobres em busca de uma identidade, muitos dos quais vivendo
em guerra, Tata acabou dirigindo "Antônia"
e levando a Brasilândia, onde foram rodados o filme
e o seriado de televisão, para todo o país.
Lançado "Antonia", ela começou a ler
novos roteiros e se encantou por um deles: uma história
de um desencontro amoroso, no qual a galeria Metrópole
e a praça D. José Gaspar são os principais
cenários, atualmente, aliás, espaços
em recuperação. "São Paulo voltou
a ser meu cenário criativo."
Coluna originalmente publicada na
Folha de S.Paulo, editoria Cotidiano.
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