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BELO HORIZONTE (MG) - No lugar
dos tradicionais calendários eróticos, estantes
com enciclopédias, revistas e livros. Desde agosto
de 2002, a borracharia do Joaquim, em Sabará (região
metropolitana de Belo Horizonte), faz as vezes de biblioteca
para os moradores da região.
De tão inusitado, o lugar foi batizado com um neologismo
-"borralioteca"- por seu idealizador, o borracheiro
Marcos Túlio Damascena, 26. Ele é o responsável
pela montagem do acervo de 1.600 exemplares, distribuído
em seis prateleiras e disponível para empréstimos
gratuitos. O movimento de pessoas atesta a popularidade da
borracharia. Na última sexta, durante a meia hora em
que a reportagem da Folha esteve no local, duas mulheres e
três crianças utilizaram a biblioteca. Três
clientes foram consertar pneus.
Damascena diz que o gosto pela leitura veio na adolescência.
Alguns anos depois, cansado de ler somente jornais nas horas
de folga, começou a levar livros para a borracharia
do pai. "Estava precisando de algo a mais", disse.
De 70 livros espremidos entre máquinas e câmaras
de ar, a idéia cresceu. Fregueses da borracharia e
de outras bibliotecas da cidade -que doaram livros repetidos-
ajudaram a engrossar o acervo, no qual figuram Machado de
Assis e Gabriel Garcia Márquez.
Os "clientes" da biblioteca são, na maioria,
estudantes em busca de livros didáticos e enciclopédias.
Os mais novos preferem os gibis. Não há espaço
para leitura, mas alguns se arriscam por lá mesmo,
encostados nos pneus.
Em um caderninho, Damascena controla a entrada e a saída
dos livros. "Qualquer um pode pegar, é só
deixar endereço e telefone." Embora não
haja prazo fixo para devolução, os mais esquecidos
recebem um telefonema de alerta.
A criação da "borralioteca" rendeu
a Damascena uma bolsa em uma faculdade da cidade. Ele passou
em 5º lugar no curso de letras, que freqüenta desde
o início do mês. Paga 40% da mensalidade de R$
345. Fã do poeta alagoano Lêdo Ivo, ele diz que
quer ser professor de literatura. Pelo menos no nome, o filho
do borracheiro também segue o caminho das letras. Sartre,
3, teve o nome inspirado no do filósofo existencialista
francês Jean Paul Sartre (1905-1980).
THIAGO GUIMARÃES
da Folha de S. Paulo
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