SÃO
PAULO. Quase um ano após a lei que criou o Estatuto
do Desarmamento entrar em vigor, o governo já comemora
a redução no número de mortes violentas
em pelo menos dois estados. Só em São Paulo
o número de homicídios por armas de fogo caiu
18% nos primeiros nove meses deste ano em comparação
com o mesmo período de 2003. São 2.630 mortes
a menos, já que entre janeiro e setembro foram registrados
6.855 homicídios, contra 9.485 nos três primeiros
trimestres de 2003. Na região metropolitana de Curitiba,
no Paraná, o número de homicídios caiu
em 27%.
Com a campanha, organizada pelo Ministério da Justiça,
o governo recolheu 191.616 armas. Em São Paulo foram
recolhidas 53.880 armas — o recorde do país.
Em segundo lugar ficou o Rio de Janeiro, com a apreensão
de 23.832 armas. No Rio Grande do Sul, que ficou em terceiro
lugar, foram apreendidas 14.518 armas.
Anos 90
Levantamento do Núcleo de Estudos da Violência
da USP revelou que de 1991 e 2000 as armas de fogo foram responsáveis
por 265.975 mortes. Dessas, 82% foram homicídios; 5%,
suicídios e 2%, mortes acidentais. O estudo da pesquisadora
Maria Fernanda Tourinho Peres aferiu que só 11% das
mortes a tiro não foram intencionais.
O secretário-executivo do Instituto Sou da Paz, Denis
Mizne, disse que o menor número de armas em circulação
e a transformação do porte ilegal em crime inafiançável
colaboraram para a redução das mortes.
"Para se ter uma idéia, caiu em 24% o número
de armas apreendidas pela polícia. Isso vinha crescendo
antes da campanha", disse Mizne, acrescentando que a
redução no número de assassinatos após
a campanha é significativa. "A população
está mais consciente e não entrega as armas
só pelo dinheiro. Muitos estão cientes de que
ter arma é perigoso. O fato de 2.630 pessoas terem
deixado de morrer em São Paulo é um dado eloqüente,
mas há muito a fazer".
O custo da violência é alto para os cofres públicos.
Entre janeiro e setembro deste ano o governo gastou quase
R$ 400 milhões em gastos com internação
de vítimas da violência, sem considerar gastos
com atendimentos ambulatoriais e consultas. O gasto médio
com o atendimento de uma vítima de violência
é de R$ 643, segundo o Ministério da Justiça,
enquanto as demais internações custam R$ 475
ao Sistema Único de Saúde (SUS).
Faixa etária
De acordo com a Secretaria Nacional de Segurança
Pública e do Ministério da Saúde,106.317
óbitos foram causados por armas de fogo entre 2000
e 2002. As estatísticas mostram que, diariamente, cerca
de cem brasileiros morrem a tiros. A maior parte das vítimas
tem de 15 a 34 anos.
A partir do dia 12 o Comitê Desarma São Paulo
vai criar novos postos de coleta de armas nos 645 municípios
do estado. O governo federal está pagando entre R$
100 e R$ 300 para cada arma entregue pela população.
Cerca de R$ 30 milhões foram reservados para essas
indenizações e pelo menos R$ 14 milhões
foram efetivamente pagos. Dados do Viva Rio indicam que apenas
11% das armas entregues têm registro. Em São
Paulo, as armas destruídas se transformaram em brinquedos
para crianças carentes. Há dez dias foi inaugurado
o Parque dos Brinquedos, em Sapopemba, construído com
ferro derretido de armas entregues pela população.
O diretor do Departamento de Cooperação e Articulação
das Ações de Segurança Pública
de São Paulo, Tulio Khan, disse que o Estatuto do Desarmamento
ajudou a diminuir os índices de mortes por armas de
fogo, mas houve outros fatores.
"Muitos municípios adotaram a lei seca",
lembrou.
FLÁVIO FREIRE
do jornal O Globo
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