Terceirização
irregular, cooperativa de trabalho fraudulenta e pagamento
de funcionários "por fora" fazem parte do
negócio de bingos no país. É o que revela
levantamento da Procuradoria Geral do Trabalho. Nem todos
os empregos do setor estão amparados pela CLT (Consolidação
das Leis do Trabalho), relataram à Folha funcionários
de bingos.
O levantamento da Procuradoria mostra que 42 irregularidades
trabalhistas envolvendo bingos em diversas regiões
estão sob investigação nos Ministérios
Públicos do Trabalho de todo o país. Outros
30 processos foram resolvidos após a interferência
de fiscais das DRTs (Delegacias Regionais do Trabalho) e procuradores
do trabalho desde 2001.
Nove termos de ajustamento de conduta (TACs) -espécie
de contrato em que o empresário se compromete a regularizar
a situação dos trabalhadores- foram firmados
com representantes de bingos em sete Estados.
Os casos mais graves em andamento envolvem a exploração
do trabalho de crianças e de adolescentes, principalmente
na venda das cartelas, e a contratação de empregados
por meio de cooperativas fraudulentas, informa Sandra Lia
Simón, procuradora-geral do Trabalho. Estão
ainda na lista de irregularidades a falta de registro em carteira,
o não-pagamento de horas extras e más condições
de trabalho.
"É um segmento que descumpre a lei trabalhista,
o que pode ser comprovado pelo número de ações
ajuizadas por procuradores de diversas regiões para
garantir os direitos dos trabalhadores", diz a procuradora.
"Quarenta e duas denúncias é um número
alto para um segmento novo no país."
Rita de Cássia Siqueira, 33, vendia cartelas de um
estabelecimento da região central de São Paulo.
Ela quer que os bingos voltem a funcionar. "É
a forma que tenho para garantir o sustento da minha família.
Se o Lula deixar os bingos fechados, vou ter de tirar o meu
filho da escola particular", diz.
A funcionária mantinha o orçamento de casa
com um salário de R$ 320. "Na carteira ganhava
isso, mas "por fora" tirava mais R$ 1.000 por mês",
afirma a vendedora.
Seis processos envolvendo a contratação por
meio de cooperativas fraudulentas estão em investigação
nos MPTs em São Paulo, Campinas e Rio Grande do Sul.
As cooperativas irregulares lesam os trabalhadores ao não
pagar direitos trabalhistas. Lesam o governo porque sonegam
tributos.
"Uma das principais fraudes é descontar a contribuição
ao INSS [Instituto Nacional do Seguro Social] dos funcionários
e não repassá-la ao Ministério da Previdência.
O empregado pensa que o tempo que trabalhou na cooperativa
vai contar para a sua aposentadoria. Mas, de fato, a contribuição
nunca é paga", afirma Simón.
Proteção
Ex-funcionária de uma cooperativa de um bingo na Lapa
(zona oeste de São Paulo), Sabrina Ingrid Alves de
Melo, 25, avalia que a utilização de cooperativas
"seja uma maneira de os empresários se protegerem
de funcionários que queiram processar os bingos na
Justiça do Trabalho".
Para Ariane Moreira, 26, diante do desemprego, tanto faz
ser empregada de uma cooperativa ou ter registro do bingo
em que trabalha no centro de São Paulo. A falta de
registro em carteira preocupa a família de Homero Lima
Lopes, 20. Ele, a mulher, Regiane Cristina Calaça,
30, e a irmã, Odete Lima Lopes, 22, são funcionários
de bingos. "A situação mais crítica
é a da minha irmã, que trabalha sem registro
há cerca de quatro meses", diz Homero.
Grávida de quatro meses, Calaça diz que só
recebeu parte do salário a que tem direito como vendedora
de cartela -R$ 359- para trabalhar das 14h à 0h30.
"Recebi metade desse dinheiro; a diferença vai
fazer falta", diz.
"Com o dinheiro da caixinha que recebia, comprei um
terreno em Guarulhos. Trabalhei durante dois anos e nunca
vi nada de errado no bingo", afirma Edna de Lima Almeida,
23.
O salário registrado na carteira é de R$ 320,
e o restante vem das gorjetas. "Vamos entrar em férias
coletivas no dia 15 [hoje]. Já estou procurando emprego."
No caso de os bingos não voltarem a abrir, a Procuradoria
montou uma força-tarefa para garantir que o pagamento
de rescisões dos contratos de trabalho seja feito pelos
empregadores -e não pelo governo, como querem os empresários
do setor.
As informações são
da Folha de S. Paulo.
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