Pelo
menos 15 instituições municipais desrespeitam
a Constituição e recebem dos alunos como se
fossem particulares
Pelo menos 15 faculdades criadas por prefeituras depois de
1988 cobram mensalidades de seus alunos, como se fossem instituições
particulares. A cobrança vai contra a Constituição
Federal, que determina que a educação oferecida
pela União, pelos Estados e pelas prefeituras deve
ser gratuita.
Algumas instituições só continuam cobrando
mensalidades porque recorreram aos tribunais e conseguiram
liminares favoráveis, o que indica que, apesar da lei,
a questão é controversa.
Existem no País, segundo o Ministério da Educação
(MEC), 61 faculdades e universidades municipais. Dessas, somente
3 não exigem pagamento de mensalidade. As 58 restantes
cobram, mas a maioria (43) tem respaldo legal para isso. A
Constituição, elaborada em 1988, diz que as
faculdades municipais que cobravam mensalidades até
aquele ano manteriam esse direito. Mas as criadas depois disso,
não.
O Estado localizou, a partir de dados do MEC, as 15 faculdades
municipais que se encontram nessa situação.
Ficam no interior dos Estados de São Paulo, Minas,
Mato Grosso, Pernambuco, Paraná e Rio.
A cobrança das mensalidades - que não costumam
ser altas (R$ 300 em média), embora exista uma que
cobre R$ 934 pelo curso de Odontologia - foi confirmada ao
Estado, por telefone, por todas as instituições.
Questionados por estudantes, os funcionários das secretarias
costumam dar a seguinte confusa resposta: 'A faculdade é
pública, mas é particular'.
'Juridicamente, a instituição é pública
ou privada. Não existe meio-termo', diz o advogado
João Roberto Moreira Alves, do Instituto de Pesquisas
Avançadas em Educação (Ipae), do Rio.
'Infelizmente nem todos têm acesso à legislação,
que realmente é complicada para os leigos', acrescenta
o também advogado especializado em direito educacional
José Roberto Covac.
Autarquia e Fundação
Normalmente essas instituições têm
como mantenedora uma autarquia ou uma fundação
municipal, com certa autonomia em relação às
prefeituras. 'Esse argumento não vale. As faculdades
não deixam de ser públicas por causa disso',
afirma o promotor Marcos Tofani Baer Bahia, do Ministério
Público Estadual de Minas.
Segundo ele, sempre existem recursos públicos envolvidos.
Normalmente não são na forma de dinheiro, já
que as mensalidades cobradas dos alunos são suficientes
para mantê-las em funcionamento, mas sim por meio do
uso de terrenos e prédios da prefeitura e da desobrigação
do pagamento de impostos municipais.
As faculdades das prefeituras não são fiscalizadas
pelo MEC, que cuida só das instituições
federais e particulares. As municipais, assim como as estaduais,
estão sob a responsabilidade dos Conselhos Estaduais
de Educação (CEEs), que freqüentemente
são questionados a respeito das mensalidades cobradas.
'As instituições dos municípios são
públicas. É-lhes vedada a solicitação
de pagamento pelo ensino', afirma, categórico, o presidente
do CEE de São Paulo, Pedro Kassab.
No ano passado, o Conselho de Educação paulista
decidiu que três faculdades municipais do interior teriam
que ou parar de cobrar ou fechar as portas. O Instituto Matonense
de Ensino Superior, a Faculdade de Filosofia, Ciências
e Letras de Ibitinga e o Instituto Taquaritinguense de Ensino
Superior só continuam funcionando e cobrando mensalidade
porque obtiveram liminares (decisões provisórias)
na Justiça. Ainda não houve julgamento definitivo.
'Elas podem cobrar mensalidade porque não são
mantidas preponderantemente com dinheiro público',
argumenta o advogado da três instituições,
Sérgio Roxo. 'As prefeituras criaram as faculdades
que o Estado de São Paulo e o governo federal não
abriram. Acho um verdadeiro absurdo exigirem o fechamento
de escolas no Brasil.'
A Procuradoria-Geral do Estado de São Paulo já
emitiu pareceres afirmando que a cobrança de mensalidades
é ilegal, inclusive quando a autarquia ou fundação
mantenedora criada antes de 1988 abriu uma faculdade depois
daquele ano.
Ricardo Westin
O Estado de S.Paulo
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