Apesar
da pressão da Igreja Católica e de representantes
islâmicos, o governo brasileiro decidiu reapresentar
a proposta de resolução "Direitos Humanos
e Orientação Sexual", na 60ª Sessão
da Comissão de Direitos Humanos da ONU, que começou
ontem, em Genebra (Suíça).
Em fevereiro, a CNBB (Conferência Nacional dos Bispos
do Brasil), atendendo à recomendação
do Vaticano, enviou carta ao presidente Luiz Inácio
Lula da Silva pedindo a não-reapresentação
da proposta, por considerá-la "uma vergonha"
para o país.
A representação brasileira apresentada em 2003
foi a primeira a tratar de orientação sexual
na ONU. O documento tem seis pontos, todos abordam a inadmissibilidade
de discriminações por causa da orientação
sexual da pessoa.
Na proposta, o Brasil manifestou preocupação
com a violação de direitos humanos sofrida por
indivíduos devido a suas orientações
sexuais e requereu à Comissão de Direitos Humanos
e ao Alto Comissariado da ONU que dessem atenção
ao tema e monitorassem as violações.
A proposta que será apresentada pela delegação
brasileira neste ano será mais sucinta, mas deverá
ter a mesma essência da de 2003, segundo o ministro
Especial de Direitos Humanos, Nilmário Miranda. A decisão
foi tomada em reunião no mês passado, junto com
o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim,
e do diretor do setor de Direitos Humanos do Itamaraty, Tadeu
Valadares.
Segundo Nilmário, o Brasil irá defender a proposta
em co-autoria com outros países e poderá aceitar
sugestões de alterações que não
mudem a essência do documento. "Temos consciência
de que a resolução é polêmica,
mas temos convicção de que é justa."
No ano passado, a representação ficou fora
da agenda da comissão por causa de uma manobra política
dos países islâmicos. A Líbia, que presidia
a mesa, argumentou que o projeto pretendia impor valores que
atingem o cerne da religião muçulmana.
"Resolvemos reapresentar o projeto neste ano porque
a pressão não vai diminuir", disse Nilmário.
O secretário-geral da CNBB e bispo-auxiliar de São
Paulo, d. Odilo Pedro Scherer, avalia que seria melhor que
o Brasil não fosse o proponente da resolução.
Para ele, se aprovada, ela "pode estabelecer um princípio
de inversão de valores. Não discriminamos as
pessoas. Discriminamos comportamentos. Nem toda orientação
sexual pode ser colocada no mesmo nível de valores".
Para Cláudio Nascimento, da Associação
Brasileira de Gays, Lésbicas e Transgêneros,
a aprovação da resolução "é
importante para tirar a homossexualidade de um estatuto de
criminalidade, como ocorre no Egito".
O diretor da Conectas Direitos Humanos, Oscar Vilhena, disse
que, apesar de o Brasil não possuir uma lei muito clara
a respeito dos direitos dos homossexuais, "é uma
tendência dos tribunais brasileiros reconhecerem a união
estável de pessoas do mesmo sexo".
Para aprovar a resolução, a Conectas acionou
uma rede de cerca de 400 ONGs no mundo, instando-as a pedirem
a governantes de seus Estados e países para apoiarem
a aprovação da resolução.
Ontem, hackers invadiram o site da Conectas para reunir militantes.
"Liberdade de Crença e de Religião sob
Ameaça. Vamos colocar um ponto final na resolução
brasileira", dizia o título da página,
que podia ser traduzida em inglês, francês, espanhol
e árabe.
FABIANA CIMIERI
da Folha de S.Paulo
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