Mais
de uma quadrilha de empresários e lobistas agia recentemente
no Ministério da Saúde com o auxílio
de funcionários públicos da área de compras,
segundo as investigações realizadas pelo Ministério
Público Federal e a Polícia Federal.
Seus integrantes, ainda de acordo com as apurações,
disputavam as facilidades "vendidas" pelos agentes
públicos e não se limitavam ao setor de hemoderivados
--medicamentos feitos a partir do sangue. Eles agiriam também
nas compras de outros remédios.
Foram essas suspeitas, sobre processos de compra recentes
e que não se restringem à área de sangue,
que motivaram a PF a prender anteontem o ex-coordenador de
Recursos Logísticos do Ministério da Saúde
Luiz Claudio Gomes da Silva, indicado pelo ministro Humberto
Costa para o cargo em agosto do ano passado.
Além de Silva, que já havia trabalhado com
o ministro quando ele foi secretário da Saúde
da Prefeitura de Recife, a PF prendeu outras 13 pessoas em
quatro capitais na Operação Vampiro, cujas investigações
continuam.
Parte dos presos é suspeita de participar de esquema
de fraude em licitações de hemoderivados detectado
no início de 2003 pelos procuradores e pelo Tribunal
de Contas da União. O Ministério Público
estima que só os dois produtos licitados (fator oito
e fator nove) tenham representado um prejuízo para
os cofres federais de US$ 120 milhões desde 1997.
No dia das prisões, no entanto, não foi esclarecido
quais seriam as evidências contra o ex-coordenador,
uma vez que ele assumiu o cargo depois que a licitação
com irregularidades ser suspensa e que o governo conseguiu
reduzir em 42% os preços dos produtos.
O que as apurações indicam é que, apesar
de ter assumido o cargo no ministério com a missão
de sanar irregularidades nas compras dos hemoderivados, Gomes
da Silva acabou envolvido em novas fraudes, na aquisição
de outros produtos.
O nome do ex-coordenador é citado nas transcrições
dos grampos de telefones de funcionários públicos,
empresários e lobistas realizados a pedido do Ministério
Público Federal depois da descoberta dos problemas
nas compras dos hemoderivados, segundo a reportagem apurou.
As referências a Gomes da Silva e a um suposto pagamento
de propina a ele são todas feitas de maneira cifrada.
O próprio ex-coordenador também teve os telefones
grampeados.
Na casa de Gomes da Silva em Recife foram encontrados R$
120 mil, US$ 20 mil e 7.000.
Fraudes em Estados
Segundo o procurador regional da República
em São Paulo, Marlon Alberto Weichert, a análise
das concorrências dos hemoderivados no início
de 2003 foi o ponto de partida para a fase de interceptação
telefônica da Operação Vampiro.
Nessa fase, afirmou Weichert ontem em São Paulo, foi
encontrado "muito mais", como indícios de
fraudes em compras de hemoderivados de seis Estados e prefeituras.
Pernambuco, Minas e Paraná são alguns dos Estados
alvo das quadrilhas, segundo as investigações
da PF.
"O que se descobriu é que aquelas empresas não
estavam atreladas só àquele produto. As organizações
criminosas atuam em outras frentes e não só
nas vendas ao governo federal. Temos provas cabais de que
o cartel fraudou compras de outros governos", disse o
procurador.
Weichert, que investigou as concorrências do setor
de sangue de 98 ao início deste ano --hoje está
afastado por ter sido promovido--, disse que não há
evidências do envolvimento de servidores municipais
e estaduais com corrupção --diferentemente do
que ocorre com as compras federais. O que se descobriu foi
a ação de cartel semelhante à encontrada
nas licitações federais.
Conforme a investigação, nas compras da União
os servidores atuaram sob a orientação dos empresários
Lourenço Rommel Peixoto-foragido- e Armando Garcia
Coelho. Eles foram, até dezembro do ano passado, sócios
na Editora dos Esportes Spa XXI Ltda., editora do "Jornal
dos Sports". Os empresários, no segmento de hemoderivados,
defendiam os interesses de três laboratórios
internacionais.
As compras anuais do ramo, até 2002, somavam algo
entre R$ 370 milhões e R$ 400 milhões -sempre
por meio de licitações internacionais, já
que os laboratórios brasileiros não produzem
esse tipo de medicamento.
De acordo com Weichert, a Procuradoria busca agora, com auxílio
internacional, investigar se houve participação
direta das multinacionais que participaram da licitações,
como a francesa Aventis, a americana Baxter e a suíça
Octapharma --ganhadora da concorrência alvo de auditoria.
LUCIANA CONSTANTINO
ANDRÉA MICHAEL
FABIANE LEITE
da Folha de S.Paulo
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