Erika Vieira
Atleta, estudante de educação física
e com emprego. Esse era o perfil de João (nome fictício
do entrevistado que pede para não se identificar),
24 anos, antes de se envolver mais a fundo com os alucinógenos
que usava para curtir melhor a música eletrônica
que rolava nas raves. Típico filho de classe média
paulistana, o jovem já viveu ativamente a rotina de
ir todos os fins de semana para as festas que duram mais de
um dia. Consumiu e vendeu diversos tipos de drogas. Das loucuras
sintéticas já experimentou quase todas.
Mas depois que seu pai encontrou a
balança que ele usava para pesar as substâncias,
de perder o pique para praticar esportes e de se decepcionar
com a corrupção que se passava com a polícia
por trás das organizações das raves,
João mudou de comportamento. Hoje se dedica à
namorada, melhorou o relacionamento com pai, voltou para a
academia e se tornou mais caseiro. Todo o relato de como foi
seu passado e como é seu presente está sendo
contado na entrevista a seguir.
Você gosta de rave?
Antes eu gostava de rave, agora não gosto mais. Faz
um ano e um mês que eu não vou em festa nenhuma.
Na verdade em festas em São Paulo eu já não
vou tem uns dois anos. Lugar que toca música eletrônica
eu vou mas pouco, hoje em dia não estou mais tão
apegado que nem era antes.
Por quê você gostava?
Eu ia para curtir. Porque tenho muitos amigos que são
produtores musicais e drogas também influenciaram.
Mas eu não associava muito, teve festas que eu curti
sem está drogado também.
Você freqüentou
quanto tempo?
Freqüentei uns seis, sete anos.
Qual foi a primeira rave que
você foi? Quem te convidou?
Eu fui porque, quando eu tinha uns 15 anos, meus amigos que
moravam fora do Brasil já me falavam. Na época
o pessoal já escutava música eletrônica,
lá fora já era mais divulgado e eu comecei a
ir atrás desse som. A festa foi bem fechada em um sítio
de amigos.
O que essa festa tinha de
diferente das outras?
A música. O som era legal. Eu podia fumar maconha com
meus amigos. Era um ambiente aberto, legal e tranqüilo.
A sensação que
você sentiu na primeira rave e nas outras foi igual?
Não porque conforme foi crescendo foi piorando, começou
a ter um consumo muito grande de droga. A droga caiu de qualidade.
Como você conhece a
pureza da droga?
O LSD tem a loucura mais pesada, a anfetamina você fica
mais acordado.
Qual a maior quantidade que
você já usou?
Diversas juntas. Cocaína já chegou a 5 gramas.
Umas 10 gotas de LSD.
Que tipo de droga você
já usou?
Diversos tipos de LSD, ecstasy, o MDMA, pó, maconha,
anfetamina, diversos tipos de cogumelo, crack.
Por que você passa de
uma droga para a outra?
Os diversos tipos de droga que experimentei são alucinógenos,
eu criei gosto pelas drogas. Mas uma com o qual mais me identifiquei
foi o LSD. Troquei porque o ecstasy é uma sensação
de alegria falsa. Já o LSD é uma loucura mais
relaxada, às vezes você vê plantas se mexerem,
tem alucinações, eu via pessoas dançando
no reflexo da lua na água.
Você tem medo pela sua
saúde?
Não paro para pensar muito nisso. Uma coisa com a qual
me preocupava era de usar quando sentia que estava bem comigo
mesmo, com a minha vida pessoal, quando eu não estava
brigado com a minha família nem com a minha namorada.
Você usava droga com amigos. Dava para outras
pessoas?
Sim, compartilhava e trocava.
Considera isso tráfico?
A troca não considero, mas é considerado.
Por que não considera?
A troca não. Vender sim. Eu já cheguei a vender.
Por que você vendia?
Não por necessidade, mas por envolvimento. Envolvimento,
talvez com amizades erradas que eu criei depois de um tempo.
Não era por dinheiro, nem ambição. Tudo
que me veio com droga foi com droga.
Quais eram as amizades erradas?
Um traficante de drogas nem sempre é uma boa amizade.
Te traz riscos e quem está no meio está exposto
a riscos.
Se você gostava, por
que parou de ir?
Parei de ir porque desde que está crescendo muito as
festas a polícia começou a entrar muito no meio
das festas, viram que era um jeito de ganhar dinheiro fácil.
Eles controlam o tráfico dentro de festas. E também
está indo muita garota de programa indo nas festas,
não é um ambiente que eu fui me sentindo a vontade.
Eu falo isso da polícia, porque eu sempre pratiquei
esporte (lutas) e tinha contato com policiais civis que depois
eu via na rave. Não gostava de saber que eles tinham
contato com traficantes que eu também já tive
contato. Hoje eu até iria, mas ia limpo. Em relação
ao que eu já fui hoje eu sou limpo.
Com qual freqüência
você ia em rave?
Quase todos fins de semana.
Você prefere hoje ou
antes?
Acho que são momentos. Já gostei muito de antes,
mas agora gosto muito de hoje.
Voltaria para as raves?
Não.
Seu pai deixava você
ir na rave? Você falava que ia?
Para o meu pai não. Para ele sempre foi mais escondido.
Ele sempre foi mais fechado, centrado, educação
muito rígida. Para minha mãe nunca tive muito
problema, ela é minha melhor amiga, tudo que já
experimentei de droga nunca escondi dela. Ela não gosta,
não me apóia, mas eu converso com ela. Apesar
de que ela prefere nem saber.
Seu pai nunca soube?
Sabe. Não tem como esconder. Seu corpo muda, eu era
uma pessoa muito atlética, me machuquei feio e ai parei.
Já estava no meio da música eletrônica
então parei de me exercitar e o corpo vai mudando,
vai dando na cara que você está se drogando.
Meu pai chegou a mexer nas minhas coisas e acabou encontrando
o que não devia. Ele descobriu maconha e uma balança,
que eu usava para conferir o que eu comprava e também
para a droga que eu vendia.
O que seu pai disse?
Fez todo um sermão, me passou valores de vida. Todas
essas conversas que eu já tive com a minha mãe
e com meu pai me fez ser o que sou, se eu falar que não
foi bem instruído estou mentindo. Sempre tive apoio,
estudei em escola particular e uma boa educação.
Antes você conversava
com seu pai sobre drogas?
Não. Meu pai sempre foi muito fechado com relação
ao consumo de drogas, porque já teve problemas de alcoolismo
na família, então ele não gosta.
Como está sua vida
hoje. O que você faz para se divertir?
Namoro muito. Essa é minha principal diversão.
Como você pretende levar
sua vida de agora para frente?
Eu trabalho e pretendo ter uma família e filhos.
Você levaria seu
filho para uma rave?
Não. O jeito que vejo a rave hoje é diferente
do jeito que via antes. Eu nunca levaria meu filho para as
drogas. Nunca falaria para ele usar drogas. Faça o
que eu digo, mas não faça o que eu faço.
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