Durante
o debate sobre se o valor do salário mínimo
deve ser de R$ 260 -como quer o Planalto- ou de R$ 275 -com
quer a oposição-, o Ipea elaborou um estudo
defendendo o valor menor.
O trabalho, ainda não publicado, argumenta que só
29% da elevação da renda das famílias
proporcionada pelos R$ 15 a mais no mínimo vai para
famílias efetivamente pobres. Segundo o estudo, a soma
da renda anual das famílias subiria R$ 2,4 bilhões
com o mínimo maior. Disso, R$ 1,8 bilhão viria
de benefícios previdenciários, e R$ 600 milhões,
de aumento de salários. Mas só R$ 700 milhões
do total iriam para as famílias pobres.
O mesmo efeito, diz o estudo, poderia ser conseguido com a
elevação do valor do benefício básico
do programa Bolsa-Família em R$ 10,90 por mês.
O custo seria bem menor: R$ 700 milhões. O estudo supõe,
portanto, que todo o dinheiro destinado à elevação
do benefício chegaria até os pobres.
A linha de pobreza adotada no trabalho do Ipea (Instituto
de Pesquisa Econômica Aplicada) não é
mencionada no resumo a que a Folha teve acesso. O Bolsa-Família
adota dois cortes. Famílias com renda mensal per capita
de até R$ 100 recebem o benefício básico
-R$ 50 por mês. Aquelas com renda de até R$ 50
recebem também o benefício variável -R$
15 mensais por filho, até um máximo de R$ 45.
O economista Marcelo Neri, da Fundação Getúlio
Vargas, defendeu um argumento semelhante ao do Ipea na comissão
mista que discutiu o mínimo no Congresso.
O ministro Antonio Palocci (Fazenda) também disse,
há duas semanas, que o Bolsa-Família e o salário-família
têm impacto maior que o mínimo na redução
da pobreza.
O também economista Luiz Gonzaga Belluzzo, da Unicamp,
contesta as conclusões do instituto. Segundo ele, o
estudo deixa de considerar o efeito do aumento do mínimo
no mercado de trabalho. Uma das hipóteses de que partiu
o trabalho é que só os salários do setor
formal se beneficiariam do aumento.
Belluzzo argumenta que a elevação do mínimo
faz subir toda a escala de salários, já que
é comum haver uma indexação informal,
mesmo para quem ganha dois ou mais mínimos. "Você
está substituindo uma política que é
reguladora do mercado de trabalho por uma política
focalizada", disse ele.
Lena Lavinas, economista da UFRJ, concorda. "Transformar
salário em benefício assistencial é surpreendente
num país cuja Presidência está nas mãos
da maior liderança sindical."
Ela lembra que um estudo da Cepal -órgão de
assessoramento da ONU- de 2002 concluiu que maior a causa
da pobreza na América Latina são os baixos salários
associados à baixa escolaridade -de cada dez trabalhadores
pobres, sete o são por esse motivo.
Para Lavinas, o trabalho do Ipea também peca por deixar
de analisar quantas pessoas deixariam a linha de pobreza com
o aumento do benefício do Bolsa-Família, preocupando-se
apenas com o custo.
GUILHERME BAHIA
da Folha de S. Paulo
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