Pessoas
de diversas profissões e idades, bons ouvintes e muita
experiência para trocar. São algumas características
de voluntários de grupo de apoio a familiares de dependentes
químicos, que promovem encontros semanais onde debatem
seus problemas e buscam saídas para as dificuldades
no relacionamento familiar.
Para Kléver Francisco Campos, gerente administrativo,
os voluntários do Grupo de Apoio a Pais (GAP), da entidade
Esquadrão Vida, são fundamentais para a orientação
das famílias, já que eles adoecem junto com
o dependente tornando-se co-dependentes. "O Esquadrão
Vida exige a participação da família
nos grupos de apoio. Não precisa freqüentar o
GAP, pode ser em outros grupos desde que tragam algum comprovante.
Isso é fundamental para a validade do tratamento".
O Esquadrão Vida é uma entidade sem fins lucrativos,
voltada à recuperação e prevenção
da dependência química. Há quatro unidades,
distribuídas em Sorocaba, Porto Feliz, Boituva e Araçoiaba
da Serra. O GAP é um dos serviços oferecidos
pelo Esquadrão com, aproximadamente, seis voluntários
para atender uma demanda de 15 a 18 famílias. As reuniões
acontecem às terças-feiras com intermédio
de psicólogos para orientar o debate.
Antonio Reis Prado, projetista aposentado, teve seu filho
envolvido com drogas há quatro anos. Procurou ajuda
no GAP, porque não sabia como agir. "Ele não
chegou a ser internado, mas ficamos numa situação
que eu e minha esposa não sabíamos o que fazer
e decidimos ir para o GAP. Após o tratamento dele,
a própria vivência como co-dependente nos reforçou
na decisão de sermos voluntários", conta
Antonio.
De acordo com Antonio, a primeira coisa que um voluntário
de apoio deve fazer é escutar muito os problemas dos
familiares e explicar como agir em situações
difíceis. "É fundamental levar uma palavra
de amor para levantar a auto-estima da pessoa, que está
isolada e envergonhada por toda a situação familiar.
Ouvimos histórias de todos os tipos nos encontros",
conta Antonio.
Os voluntários comentam que a qualidade do tratamento
é guiada pelo dependente químico, em que força
de vontade é fundamental no processo de abstinência
da droga. A família tem um papel importante no acompanhamento
do tratamento do doente ao observar seus atos e, principalmente,
compreendendo suas carências. Os familiares são
co-dependentes já que ficam totalmente concentrados
no dependente, deixando de lado sua própria vida e
trabalho.
"Não existia uma disciplina em casa e aprendi
muitas coisas no Esquadrão, como observar se meu filho
teve uma recaída e não cair em sua manipulação,
quando pedia dinheiro para um lanche, porque sabia muito bem
com que gastaria. Além disso, nós, co-dependentes,
somos responsáveis por muitos dos problemas que o afetam.
Assim, comecei a passar responsabilidades e deveres para meu
filho e vi que todos têm uma chance", diz Antonio.
Já a voluntária Luci Salun Sanches, funcionária
pública aposentada e mãe de dependente químico,
também trabalha em grupos de apoio há mais de
10 anos. Passou por outras entidades e desde 2000 está
no Esquadrão Vida.
"O grupo de apoio é como uma auto-ajuda, pois
os familiares tendem a se isolar quando têm esse tipo
de problema. No começo da dependência do meu
filho, tinha vergonha de vizinhos, familiares e colegas de
trabalho. Evitava ir a certos lugares para não ter
que levá-lo com medo dele dar vexame. No entanto, a
saída mais saudável é falar mesmo do
seu problema, desabafar", afirma Luci.
No início Luci não sabia como agir, que atitudes
tomar nem como impor limites. "As reuniões com
a família e o dependente são separadas, pois
eles não utilizam a mesma linguagem. Cada dependente
está num grau, pois existem aqueles que precisam ser
internados e outros que conseguem se recuperar em casa. Geralmente,
quem passou por essa experiência dá algumas dicas",
conta Lucii que comenta também que essas orientações
ajudam no tratamento.
Há cerca de três meses, o filho de Luci está
internado no Esquadrão Vida. "Não deixo
por nada meu voluntariado. Com ele, aprendi a viver minha
vida mesmo e estou de pé graças à ajuda
de meus colegas do GAP. Só quem teve esse tipo de problema
sabe o que é", ressalta.
Márcia Lessa Braga, vereadora e empresária
na cidade Cambuí, interior de Minas Gerais, começou
por acaso com o trabalho voluntario há mais de 12 anos.
Passou por várias entidades, mas nos últimos
quatro anos se dedica a um grupo de ajuda de dependentes químicos,
o Núcleo Espírita Kardecista Amor e Perseverança,
que desenvolve trabalhos assistenciais como doação
de alimentos para população de baixa renda.
"Há um roteiro de 12 passos para seguir nos
encontros de duas horas semanais. É difícil
dar conselhos para os pais, porque muitos não aceitam
que o filho ou marido é dependente. Assumir a doença
é fundamental para o desenvolvimento do tratamento",
relata Márcia. A vereadora falou que há pessoas
dependentes de outros tipos de drogas como calmantes. Por
exemplo, uma mulher que freqüentou poucas vezes o grupo
cometeu suicídio há pouco tempo, pois misturou
bebida alcoólica com calmantes.
O voluntariado trouxe força para Márcia no
seu dia-a-dia, já que valoriza cada vez mais o que
tem e ganhou um discernimento das causas de seus problemas.
Além de dependentes químicos, a vereadora atende
pessoas da periferia de Cambuí. "Minha experiência
com voluntariado foi boa e pretendo continuar nessa área",
afirma Márcia.
O metalúrgico aposentado, Antonio Tarifa Martins,
possui 11 anos de voluntariado e trabalho com crianças
de quatro a 16 anos no Núcleo de Atendimento Fraterno
Casa do Caminho, no Jardim Ipiranga, em Sorocaba (SP).Como
os jovens e crianças estavam se envolvendo com drogas,
Antonio queria conhecer melhor o mundo do dependente químico.
Assim, decidiu se tornar voluntário no GAP do Esquadrão
Vida e já está dois anos.
"O mais importante é tratar a co-dependência
na família, já que todos os membros param suas
atividades normais para voltar-se ao dependente químico.
Ele fica sendo o objeto central da casa e, muitas vezes, os
outros irmãos passam a fazer coisas erradas para chamar
atenção", fala o metalúrgico aposentado.
No começo, Antonio achava que iria resolver muitas
coisas, mas acabou aprendendo mais que os familiares. "É
bem aquela frase de Sócrates: 'Só sei que nada
sei'. A gente derruba muitos conceitos conservadores. Geralmente,
cerca de 60% dos casos mostram que houve uma desestrutura
familiar antes de estourar a dependência química.
Ou seja, as pessoas vivenciavam uma situação
crítica e já eram doentes, pré-dispostas
ao vício da droga", fala Antonio.
Após o trabalho voluntário no grupo de apoio,
Antonio soube discutir melhor a dependência química
entre os jovens em outra entidade social, na periferia de
Sorocaba. "O trabalho voluntário mudou minha maneira
de entender a vida. Hoje, faço trabalho voluntário
todas as noites de terça-feira no GAP. Aos sábados,
atendo três grupos de 12 jovens e dou aulas de computador,
arte e cultura e discuto vários temas relacionados
à saúde. Já nos domingos, faço
atividades com crianças de oito a 12 anos para despertar
assuntos do cotidiano delas, como drogas e violência",
conta Antonio.
Voluntariado trouxe até casamento
O vendedor Paulo Roberto Soares começou a freqüentar
o GAP para ajudar no tratamento de seu ex-enteado, que estava
internado no Esquadrão Vida. Depois de seis meses de
grupo de apoio, passou para o outro lado. Ficou como ouvinte
dos familiares, já que foi convocado pela equipe da
instituição a se tornar mais um voluntário.
Hoje, Paulo é coordenador dos voluntários do
GAP e seu ex-enteado está trabalhando e dispensado
do tratamento.
"Muitas vezes a pessoa não admite que é
dependente e os pais nos procuram. Falamos para eles apressarem
o fundo do poço, ou seja, a família vai demonstrar
aos poucos para o dependente que não há outra
saída a não ser a internação",
diz Paulo.
De acordo com Paulo, muitas famílias chegam separadas,
brigadas e envergonhadas, o que dificulta a conversa entre
voluntário e famílias. "Procuramos falar
que não tem que ter vergonha pelo ato do dependente.
Chega uma hora que nos tornamos confidentes e recebemos até
ligação em nossas casas para dar conselhos ou
ouvir os pais", fala Paulo.
Enquanto Paulo se envolvia com o voluntariado, foi conhecendo
e gostando da religião evangélica. Em pouco
tempo, se tornou evangélico e depois de cinco meses
se casou com uma estagiária do Esquadrão Vida.
"O voluntariado só me trouxe resultados positivos:
paz espiritual e uma ótima companheira", afirma.
SUSANA SARMIENTO
do site setor3
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