Você
pensa que ao jogar algo fora o problema do lixo está
resolvido? Pense de novo. Segundo o Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística (IBGE), 21% das 228 mil toneladas
de lixo recolhidas por dia no país ainda são
despejadas em vazadouros a céu aberto, sem nenhuma
medida para minimizar o impacto ambiental, e 36% vão
para aterros que não atendem a todas as medidas de
segurança.
O IBGE também aponta que 35% do lixo são jogados
em aterros sanitários, chamados assim por cumprirem
todas as normas técnicas de proteção
ao meio ambiente. No entanto, esses percentuais não
são confiáveis, pois, para obtê-los, o
instituto partiu de informações fornecidas pelos
municípios, responsáveis legais pelo lixo, e
não de pesquisas próprias. Ou seja: a realidade
é um pouco pior. Espalhados pelo território
nacional, os lixões dissipam odores desagradáveis,
contribuem para a proliferação de vetores de
doenças, como ratos, mosquitos e moscas, e podem contaminar
cursos d’água e lençóis freáticos
por meio do chorume – liquido proveniente da decomposição
do lixo orgânico.
Mas, se depender da cidade catarinense de Chapecó,
o IBGE pode confiar nas informações recebidas.
Em 2000, após um investimento inicial de R$ 1 milhão,
a prefeitura colocou em funcionamento seu aterro sanitário,
cadastrado no Banco de Tecnologias Sociais da Fundação
Banco do Brasil. “As cerca de 70 toneladas de lixo doméstico
recolhidas diariamente vão para lá, onde também
tratamos, à parte, o lixo hospitalar. Os rejeitos industriais
vão para um aterro terceirizado”, explica Jair
Antunes, diretor do Departamento de Meio Ambiente da cidade.
Medidas severas
No local, distante de mananciais e zonas residenciais,
8,2 hectares tiveram seu solo impermeabilizado e coberto por
uma membrana especial de plástico, impedindo a penetração
do chorume na terra. O lixo recolhido é distribuído
pela área, compactado, coberto com terra e argila,
“lacrado” por uma camada de plástico e
novamente recoberto por terra, sobre a qual são plantadas
gramíneas que evitam a erosão. Além disso,
o aterro conta com sistemas de drenagem especiais para a captação
do chorume e dos gases resultantes da decomposição.
O chorume é tratado e os gases, como o metano, são
queimados.
O novo procedimento substituiu o lixão de Parque das
Palmeiras, que por mais de 20 anos recebeu os detritos da
cidade e agora passará por um processo de recuperação,
além de as famílias que trabalhavam lá
como catadores terem formado, com o apoio da prefeitura, uma
cooperativa de reciclagem. Antunes ressalta que o aterro faz
parte de um processo mais amplo: “Implantamos a coleta
seletiva, o recolhimento de pneus, e fazemos um trabalho de
educação ambiental em parceria com as escolas
públicas.”
Porém, Odair Balen, coordenador do Programa Verde
Vida, ONG local, levanta alguns pontos ainda falhos. “Tecnicamente,
não temos o que reclamar do aterro, mas a coleta seletiva
é precária. Nossa organização
recicla cerca de 230 toneladas por mês, enquanto a cooperativa
da prefeitura apenas 50”, critica Odair.
Cidadãos devem ter papel ativo
Segundo Odair, parte do problema é causada
pelos próprios moradores. “As pessoas acham ‘bonito’
que seus restos sejam levados ao aterro e não se preocupam
em diminuir a produção de lixo ou separá-lo
corretamente para a coleta seletiva. Falta-lhes cultura e
consciência”, afirma. Os números estão
a seu lado.
Tanto é assim que estudo feito pelo Compromisso Empresarial
para Reciclagem (Cempre), organização não
governamental fundada em 1992 e mantida por diversas empresas
privadas, revela que o brasileiro produz, em média,
700 gramas de lixo por dia. Levando-se em conta a expectativa
de vida da população nacional, de 68 anos, isso
significa que, até a morte, cada pessoa gera pouco
mais de 17 toneladas de lixo. Esse número tende ser
tanto maior quanto mais urbanizado for o local. Nos Estados
Unidos, por exemplo, o índice é de 2 kg/habitante/dia.
A preocupação com o lixo é tamanha que
o tema mereceu um capítulo à parte na Agenda
21, um dos principais documentos aprovados durante a Rio-92.
Elaborado por governos e ONGs de 179 países, a Agenda
21 se propõe a traduzir em ações o conceito
de desenvolvimento sustentável e apresenta o princípio
dos três Rs: reduzir ao mínimo a geração
de resíduos e aumentar ao máximo sua reutilização
e reciclagem. Em países desenvolvidos, a maior parte
das políticas públicas é voltada para
ações que envolvam os três Rs. De acordo
com o Cempre, na Suíça, por exemplo, somente
13% do lixo recolhido vão para aterros. Quase a metade,
45%, são incinerados, com a recuperação
de energia e sem agressão à atmosfera, 11% (os
restos orgânicos) são transformados em adubo
e 31% são reciclados. No Brasil, 60% vão para
aterros, enquanto 0% são incinerados, 1,5% vira adubo
e apenas 8% são reciclados.
Lixo mínimo
Preocupada com o lixo gerado pelo Hotel Bühler,
um dos mais tradicionais da região de Visconde de Mauá
e do qual é proprietária, Norma Bühler
incorporou os Rs em seu cotidiano. Há três anos,
ela criou o projeto Lixo Mínimo, cuja idéia
é simples: dar um fim correto aos dejetos por meio
do reaproveitamento e da reciclagem de material orgânico
e inorgânico. “Pesquisei como tratar diferentes
tipos de resíduos e encontrei ajuda num projeto desenvolvido
em Volta Redonda, chamado Lixo Zero”, explica Norma.
No hotel, todos os restos orgânicos são transformados
em adubo ou aproveitados para a alimentação
de animais. O lixo inorgânico é separado e lavado.
Os materiais em boa condição para reciclagem,
como latas de alumínio e embalagens Tetrapak, são
doados à Sociedade Pestalozzi de Resende, instituição
que atende pessoas com deficiência mental. Outros materiais,
como preservativos, cigarros e restos de remédios,
são enterrados para se decomporem ao longo de anos
em locais conhecidos como cemitérios, longe de rios
e lençóis d’água.
IVAN KASAHARA
da Fundação Banco do Brasil
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