À primeira vista, a cidade
de São Paulo é um desastre anunciado. Faltam
380 mil moradias, 4 milhões de pessoas vivem em áreas
onde não há um único leito hospitalar
e a velocidade média dos ônibus regrediu ao patamar
do século 19 -é similar à das diligências
que conquistaram o oeste dos Estados Unidos, de 12 a 15 quilômetros
por hora. Como a capacidade de investimento da prefeitura
é cada vez menor, por causa da dívida, os números
podem provocar uma sensação de impotência:
como não há nada a fazer, que venha o desastre.
Dez especialistas ouvidos pela Folha mostram que essa avaliação
é equivocada: ainda há uma série de medidas
simples, óbvias (por serem praticamente consensuais
entre os especialistas) e baratas que podem mexer com o tecido
urbano.
Obviedades ainda não foram feitas por uma razão
mais ou menos simples: há um déficit de políticas
públicas em virtualmente todas as áreas de atuação
do poder público. Os entraves, na maioria dos casos,
são políticos ou administrativos -a prefeitura
usa ferramentas gerenciais do século 19.
Quer ver? Os cerca de 10 mil ônibus que transitam pela
cidade não contam com um sistema de controle e informação,
seja via satélite ou por ondas de rádio, como
ocorre nos Estados Unidos e na Europa. Os ônibus respondem
por cerca de 80% das viagens do transporte coletivo.
"Tem de existir um sistema de controle de ônibus,
que interfira rápido nos problemas para garantir que
esse sistema tenha eficiência", diz Eduardo Vasconcellos,
engenheiro de transportes que já foi diretor da Associação
Nacional dos Transportes Públicos.
Outra obviedade que falta aos ônibus, segundo Vasconcellos,
é a informação prévia e nos pontos
sobre linhas e horários.
Na saúde, ocorre um fenômeno similar, de acordo
com Paulo Eduardo Mangeon Elias, professor de políticas
de saúde da Faculdade de Medicina da USP. Não
há um sistema que informe o que faz cada uma das unidades
ou hospitais. O resultado é que ninguém sabe
a quem recorrer e hospitais altamente especializados, como
o das Clínicas, acabam sendo utilizados por pacientes
que poderiam ser tratados por unidades básicas.
O arquiteto João Filgueiras Lima, o Lelé, que
projetou os hospitais da rede Sarah em Brasília e Salvador,
diz que há soluções para a habitação
-a produção de peças pré-moldadas
em escala industrial. O que falta, para ele, é vontade
política de afrontar o sistema segundo o qual as empreiteiras
financiam as campanhas políticas e os políticos
dão o troco em forma de obras quando chegam ao poder.
José Teixeira Coelho, professor da Escola de Comunicações
e Artes da USP e especialista em políticas culturais,
sugere que São Paulo volte a debater uma questão
óbvia e clássica para as cidades -a beleza urbana.
A busca da beleza poderia começar, de acordo com ele,
pelo combate à pichação.
MARIO CESAR CARVALHO
da Folha de S.Paulo
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