Era
a segunda vez na semana em que cartazes, faixas e apitos atordoavam
a entrada da Facet (Faculdade de Artes, Ciências e Tecnologias),
particular de Salvador (BA). Ao microfone, o estudante Marcell
Moraes, 29, protestava contra os 15 dias de suspensão
que havia tomado depois do último protesto que organizou
- contra o "aumento abusivo das mensalidades".
Moraes incluiu a professora Ceres Guedes, então responsável
pelo curso de administração, em seu discurso:
"Professora, venha dizer por que fui suspenso. Você
é uma péssima coordenadora".
Moraes, em 2006, na manifestação em que chamou
professora de "péssima"
Ela não gostou, pediu retratação e a
saída de Moraes da presidência do Diretório
Acadêmico. Mas ele não cedeu: "Pago para
ver quem me tira". E pagou, literalmente, caro: R$ 12.450,
depositados na última terça-feira (1º)
em conta de entidade assistencial do interior da Bahia como
alternativa aos 2 meses e 20 dias de prisão a que foi
condenado pela justiça baiana.
A juíza Auristela Dias Ribeiro, que deu a sentença
do processo movido pela professora, entendeu que Marcell Moraes
praticou, naquele junho de 2006, crime de "injúria"
- ferir a "honra" de outra pessoa.
Moraes "jura" que não ofendeu a professora.
Admite que a chamou de "péssima coordenadora",
mas que não foi além. Nenhum palavrão.
Nenhuma comparação com qualquer animal.
Para se livrar dos dois meses na prisão, Moraes recorreu
a uma "vaquinha". Com ajuda dos colegas de faculdade,
conseguiu juntar R$ 7 mil. O restante, pegou em empréstimo
no banco.
"Agora terei de pagar o empréstimo e a mensalidade.
É um absurdo. A Justiça não me propôs
sequer trabalhos comunitários. Era pagar ou ir para
a cadeia", diz Moraes.
Para o advogado Roberto Batochio, especialista em direito
criminal, a sentença é "exagerada".
"Ainda mais num ambiente universitário, que deveria
estimular a expressão de idéias e opiniões,
uma condenação dessas é desproporcional
e não favorece o senso crítico de nossos jovens",
disse Batochio.
O estudante se diz vítima de perseguição
e insinua que a faculdade tenha usado a professora para "se
vingar" de suas manifestações. "Colocaram
um dos maiores advogados de Salvador para me processar; eu
tive de contar com a ajuda de amigos recém-formados,
foi uma batalha desleal", disse Moraes.
Procurada pela reportagem, a Facet disse que quem comentaria
o caso seria a advogada Thaís Bandeira, sócia
do escritório Gamil Föppel Advogados Associados,
responsável pelo processo.
"O processo foi movido pela professora, individualmente,
é ela quem teve a honra lesada e decidiu buscar reparação
de seus direitos", disse Bandeira. "O estudante
se excedeu no direito de expressar opinião. Ele ofendeu
a professora, conforme a Justiça reconheceu".
No último semestre de administração
de empresas, Marcell Moraes prepara-se para o próximo
vestibular. Diz que ter passado um ano brigando nos tribunais
lhe despertou uma nova vocação: ser juiz.
Convicto, já escolheu até a faculdade. "Vou
fazer Facet de novo. Eles vão ter de me agüentar
por mais cinco anos", disse.
Bruno Aragaki
Portal UOL
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