Segundo
pesquisa Seade/Dieese, negro tem rendimento médio de
R$ 4,36 por hora em SP; não-negro recebe R$ 7,98
Causas da diferença são
o menor acesso à educação e o preconceito,
que impede o negro de subir na carreira, segundo os especialistas
O trabalhador negro (preto e
pardo) ganha apenas cerca da metade do que o não-negro
(branco e amarelo) recebe na Grande São Paulo. São
R$ 4,36 por hora, em média, contra R$ 7,98, segundo
pesquisa realizada pela Fundação Seade e pelo
Dieese.
Quanto maior o nível escolar, maiores as disparidades.
O rendimento real do indivíduo negro que não
concluiu o ensino fundamental é de R$ 3,44 por hora,
e o do não-negro, R$ 4,10 -uma diferença de
19,2%.
Já na comparação entre duas pessoas que
terminaram a universidade o abismo atinge 40%: o negro recebe
R$ 13,86 por hora e o não-negro, R$ 19,49. O levantamento
foi realizado em 2007, mas os valores tiveram correção
monetária até julho.
"Considerando a média de R$ 4,36 por hora e o
fato de que o negro escravo do Brasil Imperial contava com
a renda indireta da comida e da moradia, pode-se falar que
nada mudou", argumenta o presidente da ONG Afrobras e
reitor da Unipalmares (Universidade da Cidadania Zumbi dos
Palmares), José Vicente.
No que diz respeito ao desemprego, a situação
apresentou pequena melhora nos últimos dez anos. Em
1999, a porcentagem de negros desempregados era de 24,3% ante
16,8% dos não-negros. No ano passado, as taxas estavam
em 17,6% e 13,3%. O Dieese diz que a tendência é
semelhante no resto do país, porém os números
mudam segundo a composição étnica da
população local.
"O crescimento da economia do país desde 2004
criou vagas para os negros. Algumas diferenças, entretanto,
não se desfazem ao longo do tempo", diz Patrícia
Lino Costa, coordenadora da pesquisa.
O indicador "mais preocupante", aponta, é
o que mostra a distância entre os ganhos dos negros
e dos não-negros que fizeram faculdade. O restrito
acesso à escola é uma das principais causas
da desigualdade no mercado de trabalho, mas, para quem conseguiu
superá-la, o preconceito acaba sendo o pior obstáculo,
afirma. Uma vez contratado por uma empresa, o trabalhador
negro não consegue galgar posições e
subir na carreira, daí a sua renda ser inferior à
dos brancos que sobem na hierarquia, diz ela.
"Os negros não conseguem sequer entrar em um cargo
mais elevado. Entre um engenheiro negro e um branco, certamente
prefere-se contratar o branco, achando que o negro não
é capaz", afirma Vicente.
"Na minha opinião,
trata-se da dificuldade em lidar com o diferente", resume
Costa. "Existe um perfil de trabalhador que o mercado
recebe melhor: homem branco, entre 25 e 39 anos. Ou seja,
negros são discriminados, mulheres, homens muito novos
ou mais velhos."
Por isso, de acordo com os especialistas, a redução
das disparidades começa na educação fundamental,
para que as crianças aprendam desde cedo a lidar com
as diferenças. Para Vicente, as cotas em escolas técnicas
e nas universidades ajudam, porém deveriam ser uma
"verdadeira política de Estado, e não fruto
apenas da boa vontade de um grupo de reitores". As empresas,
por sua vez, estão aumentando os seus programas de
inclusão, diz Costa.
"O problema é a velocidade do avanço. No
Brasil, que se orgulha da sua miscigenação,
números como esses de renda e emprego são chocantes.
Os EUA, onde até 50 anos atrás um negro não
podia beber água no mesmo bebedouro de um branco, acabaram
de eleger um negro presidente. Falta seriedade ao nosso governo",
diz Vicente.
Denyse Godoy
Folha de S.Paulo