Morador
do Capão Redondo, ele mostra a realidade da periferia
Ele já foi pintor de parede, trabalhou em padaria e
hoje sobrevive da venda de camisetas. Mas ficou conhecido
pelas letras de rap e os livros que mostram a vida na periferia
paulistana. Aos 30 anos, Ferréz lança hoje na
Livraria Cultura, do Conjunto Nacional (Avenida Paulista,
2.073), sua quinta e mais nova obra: Ninguém É
Inocente em São Paulo (Editora Objetiva, R$ 24,90).
Com 93 páginas, a obra reúne pequenos contos
que fazem o leitor mergulhar no cotidiano e na cultura da
periferia. Realidade onde abuso de autoridade policial, balas
perdidas e assassinatos fazem parte da rotina e que Ferréz,
morador do Capão Redondo - um dos bairros mais violentos
da cidade, com nada menos do que 584 favelas - conhece de
perto.
"Prestei muito atenção nos diálogos
dos manos para escrever em favelês", conta o escritor,
que abusa de gírias, palavrões e frases truncadas.
A intenção, explica, não é agredir
o leitor, mas mostrar um mundo que, em sua opinião,
"muita gente não vê ou não quer ver".
Num período em que a violência assusta a cidade,
principalmente com os ataques do Primeiro Comando da Capital,
Ninguém É Inocente em São Paulo chega
oportunamente ao mercado editorial . "São Paulo
está vivendo um novo período. Muitas vezes me
perguntam se caminhamos para uma guerra. Mas isso já
é uma guerra."
O livro é uma homenagem a um grande amigo de infância
do autor, morto há um ano e meio na rua onde cresceram.
Alex Rodrigues dos Santos, de 23 anos, foi abatido a tiros
por dois mascarados. Ninguém sabe ao certo o porquê.
"Desconfio que tinha mulher no meio da história",
afirma Ferréz, que não se conforma com o fato.
"Já vi muito assassinato por lá, mas o
de Alex deixou marcas." Um mês e meio após
o enterro, o escritor tatuou o rosto do amigo no lado esquerdo
das costas.
Contrastes
Ninguém É Inocente em São Paulo conta
histórias sobre uma periferia tão acostumada
com a violência, que não se amedronta tanto diante
dos ataques do PCC. "A gente já virou especialista
nessa vida, por isso o PCC não causa tanto tumulto
como para vocês." O livro ainda vai além
e mostra o contraste entre as realidades das favelas e das
mansões, sem no entanto apontar culpados.
"Todo mundo faz algo ilícito", acredita
o autor. "Alguns roubam. Outros pagam para poder tirar
a carta de motorista sem fazer exame, cortam fila ou ficam
de boca fechada diante da demissão injusta do funcionário
que mais precisa dentro da empresa."
Valéria França
O Estado de S.Paulo.
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