10/08/2007
Carta da semana
Cansaram? Ótimo. Agora mexam-se!
"Ao parar em um semáforo, um menino de sete ou
oito anos bate no meu vidro com um desses instrumentos circenses
em mãos, pedindo com os olhos minha aprovação
para iniciar uma performance, cujo sucesso está necessariamente
relacionado ao recebimento de uma ‘gratificação’.
Pergunto a ele o que fazia ali numa tarde de domingo em vez
de estar brincando com amigos e/ou familiares. Infelizmente
não me surpreendendo: 'estou trabalhando'. E foi essa
cena que me fez refletir sobre o rumo do nosso país
e da própria humanidade.
Em primeiro lugar, é preciso
salientar que essa é uma cena cotidiana e “normal”
aos olhos da maioria. Refiro-me aqui a dois aspectos básicos:
o fato de termos crianças pedindo esmola (o que por
si só já deveria causar estranheza) e a nossa
aceitação – diretamente relacionada a
nossa postura de negação diante dessa realidade.
Contrariando todo e qualquer quesito
de cidadania, não nos parece problemática a
questão de termos crianças (de 4, 6, 9, 12 anos)
que, em vez de estarem na escola, na praça ou junto
de suas famílias brincando e adquirindo conhecimento
(atividades próprias e necessárias para o desenvolvimento
da criança), se encontram excluídas da sociedade
à qual pertencem.
Um reflexo de como esse cenário
é negativo em todos os ângulos (e não
“apenas” no âmbito da criança e de
suas relações com seu meio) é claramente
identificável no fato de que hoje faltam profissionais
qualificados no mercado de trabalho, tanto para assumir postos
estratégicos em empresas públicas e privadas
do país (máquinas que movem o capitalismo) quanto
para atuarem em instituições de ensino, principalmente
no ensino médio e superior.
Ora, de um lado vejo formada uma espécie
de epidemia de cegueira social e política no que diz
respeito à Educação, principalmente no
setor público, seja nos espaços físicos
degradados, seja no (não) desenvolvimento e ativação
de propostas pedagógicas, seja na desvalorização
do profissional de Educação. Não esqueçamos
que esses aspectos influenciam, negativamente, potenciais
educadores, que acabam optando por não seguir esse
caminho por não vislumbrar futuro.
Por outro lado, e não nos esquecendo
dos níveis de desemprego no país, os ‘donos’
do capital, sabendo que, sem o capital humano, este ou aquele
braço do sistema fica ameaçado de extinção
(o que acaba fragilizando o capitalismo em si), já
começam a buscar profissionais qualificados fora do
país.
No Brasil, os qualificados são
agarrados com unhas e dentes, mas não dão conta,
uma vez que são poucos numa sociedade cuja demanda
vem aumentando constantemente. Demanda esta que vem de uma
minoria. São aqueles que têm condições
(não só financeira como intelectual e política)
de agir em prol do bem comum, mas, ao que parece, não
se interessam pelo desenvolvimento socioeducativo das crianças
e adolescentes brasileiros.
O egoísmo da sociedade atual
não nos deixa enxergar além de 'nosso presente',
mas esquece-se de que, de uma forma ou de outra, haverá
um presente no futuro dos filhos de nossos filho e de que
quem está construindo esse presente somos nós.
Assim, ficam as questões:
Aonde queremos chegar? Queremos guerra
ou paz? Queremos nos relacionar com o outro ou queremos ficar
em nossos mundinhos até que fatores externos nos façam
perder o controle? Queremos nos relacionar com a natureza
ou ficamos bem entre quatro paredes? Queremos que nossos filhos
e os filhos de nossos filhos se desenvolvam e adquiram conhecimento?
E que esse conhecimento possa ser compartilhado e ampliado?
Queremos que eles aprendam, apreendam e pratiquem, em seu
mais profundo significado, os conceitos de respeito, igualdade
e fraternidade (tão difundidos no passado)? Ou vamos
nos guiar pelo preconceito e pelo individualismo?
Governo e ONGs vêm fazendo um
trabalho nesse sentido, mas não basta. Mais recursos
à educação no Brasil devem ser alocados.
E isso só ocorrerá a partir do momento em que
a sociedade adotar a causa da educação, assim
como vem adotando a causa do combate à corrupção.
Lembre-se: todo indivíduo é um agente transformador
de seu meio. O que você transforma? Pense nisso. Se
nada fizermos, de nada poderemos reclamar. Seria uma hipocrisia.
Uma dica
Para quem não sabe por onde começar, saiba que
toda e qualquer Pessoa Física ou Jurídica pode
determinar que 6% (PF) e 1% (PJ) do Imposto de Renda retido
seja investido em projetos de educação. A partir
daí o governo tem obrigação de dirigir
tal verba ao Ministério da Educação.
Aí, basta ficar de olho nos projetos que estão
sendo desenvolvidos e quanto está sendo investido."
Maya Brasiliano - maya.brasiliano@uol.com.br
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