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13/07/2007
Carta da semana
O trânsito de São Paulo
“Num desses dias,
em que nada dava certo, tomei um táxi para resolver um problemão
no centro da cidade. Entrei com a cara amarrada e o veterano
motorista percebendo o meu péssimo humor se limitou a dirigir.
Trânsito parado, minha ansiedade estava me fervendo. Nesse
momento, o motorista, com aquela sabedoria que só os que já
viveram muito têm, me veio com esta: '- Calma moço. Tá vendo
esses carros aí fora? É tudo turista parado para tirar fotografia
da paisagem. O único aqui que está com assunto muito importante
para resolver é você'.
Que sabedoria! Lembro dele toda vez que o trânsito tenta
me afetar. Mas, voltando ao nosso assunto, acho que o Mais
São Paulo poderia divulgar mais os grupos que trabalham
no Plano Diretor. Não os políticos, digo as
associações que estão atentas aos danos,
talvez irreversíveis, que estão se perpetuando
em nossa cidade.
O problema não é a quantidade de carros, pelo
menos em princípio. O problema é como eles se
deslocam, e isso é resultado de como a cidade está
organizada. Exemplificando: na Mooca nas ruas que há
poucos anos havia pequenas casas que nem carros tinham, agora,
estão recebendo projetos de três e quatro torres,
que será habitada por famílias com poder de
consumo suficiente para quatro carros. Como as pessoas vão
sair dos prédios? Essas pessoas recebem visitas. Aonde
os parentes vão estacionar os veículos?
Já na Radial Leste existe uma faixa adicional reversível.
Quando inauguraram, eu lembrei das Car Pool Lane, em Los Angeles
e São Francisco. Não é meu trajeto diário,
mas me pareceu ser uma boa idéia. Há pouco tempo
passei pela Radial e fiquei sem entender nada. Os carros usam
aquela faixa mesmo com apenas uma pessoa dentro. Então,
para que fazer uma faixa adicional?
Enquanto que o Fura-Fila é uma aberração.
A pista sobre o Rio Tamanduateí funcionava até
que bem. De zero a dez eu daria 7,5 com louvor. Os ônibus
trafegavam pela av. do Estado e tudo ia bem. Agora, jogaram
aquela aberração que ocupa com ociosidade o
piso e acabou com o fluxo daquela região. Aí
pergunto: Quantos carros tirou de circulação?
A resposta é nenhum. Então para que gastar nosso
rico dinheiro para fazer isso que não traz nenhum benefício?
No ano passado vieram com uma idéia boa para a av.
dos Bandeirantes, até que o rodoanel fique pronto.
Fechar a maioria dos cruzamentos, transferir os caminhões
para as faixas centrais (à esquerda). Talvez ocorresse
um problema quando os caminhões fossem cruzar para
a direita, a fim de pegarem a Imigrantes. Mas, acho que um
sistema de semáforos daria conta do negócio.
Ninguém mais fala do assunto. A CET precisa de mais
espaço para apresentar esses projetos, assim a comunidade
pode fazer pressão para essas coisas andarem. Aliás,
aonde andam os engenheiros da CET? Eles precisam aparecer.
Na av. Roberto Marinho estão
construindo um sistema de viadutos com a Marginal. Será
que alguém lembrou que do outro lado, lá na
Vila Santa Catarina, não tem para onde ir os carros
de hoje e que esses viadutos vão jogar mais carros
naquela região?
Sou engenheiro, especializado em logística. Para se
abrir um armazém que vai guardar açúcar
precisa apresentar estudos de impacto ambiental. Enquanto
que aqui em São Paulo, se constroem prédios
de apartamentos e de escritórios sem ninguém
fazer os estudos do impacto que essa obra vai causar na vida
das pessoas. Não pensam se o lugar é o melhor
para a criação de uma escola, de um hospital,
etc. O Plano Diretor obrigaria os interessados tomarem esses
cuidados antes dos problemas ficarem irreparáveis.
Quando você, Gilberto,
fala de pedágio urbano e restrição para
carros porque deu certo em outras cidades do mundo, é
bom lembrar que Londres e Nova York tem área menor,
renda per capita maior e, principalmente, serviços
urbanos impecáveis. Eu não uso transporte público
porque os meus trajetos não são servidos por
esse serviço. Aí eu me lembro do motorista de
táxi. As pessoas que estão nos carros não
são pessoas más que querem fazer bagunça.
Elas estão tentando gerar riqueza para São Paulo.
E, ao que parece, essa riqueza vai ser usada para muitas coisas,
menos para fazer as pessoas mais felizes.
Minha intenção é termos uma cidade linda,
segura e moderna. Precisamos procurar os caras que estão
lutando para um Plano Diretor correto. Eles precisam de espaço.
Eu não sei o nome de nenhum deles, pois quando aparecem
na mídia é tão rápido que não
dá para anotar. Mas, são os paulistanos que
precisam ser ouvidos.”
Laerte Mietto, engenheiro
de logística -
lgmietto@terra.com.br
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