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14/04/2006
Carta da semana
A escola e a Greve dos Professores
“A questão da greve dos
professores não se resume a uma comparação
salarial e nem de responsabilidades, a greve está pautada
na legislação vigente, a qual vem anualmente
sendo ignorada, ou melhor, descumprida pelas autoridades competentes.
Todo trabalhador tem direito a um
reajuste anual de salário. Um outro fator a ser avaliado
é que a escola ficou assoberbada e descaracterizada
pela demanda implantada pelos programas propostos, não
na questão de horas trabalhadas, mas pela piora no
ambiente de trabalho e pela falta de funcionários para
dar encaminhamento às entradas, saídas e deslocamentos
dos alunos dos períodos normais, pró e pré-aula.
Segue um exemplo: Uma escola tem cerca de 2000 alunos no ensino
fundamental, em três períodos: das 07h às
11h; das 11h às 15h; e das 15h às 19h, com 18
salas de aula, 02 laboratórios de informática,
01 sala de leitura, 01 quadra e 1 refeitório. O cálculo
é simples: um local projetado para atender em média
720 alunos, hoje tem que atender ao dobro e no período
das 11h às 15h, o triplo. Como coordenar e compatibilizar
os horários? Como coordenar a distribuição
das refeições e lanches, já que a cozinha
foi privatizada e tem-se que acompanhar a distribuição
e as repetições, para conferir o pagamento para
a terceirizada? Como proceder, nas aulas de educação
física, com uma quadra sem cobertura? O que fazer com
a questão do transporte escolar, tendo um número
limitado de peruas? O que fazer?
Apesar da nossa boa vontade, da nossa
constante colaboração, fica inviável.
Não podemos mais usar o laboratório de informática,
a sala de leitura e a quadra para realizarmos nossas aulas,
pois não utilizamos apenas a sala de aula. Realizamos
pesquisa, aulas práticas de observação
e adequação do ambiente as nossas atividades
e necessidades.
Seria o mesmo que uma família
de três membros sofrer um incremento de mais três
ou seis membros, sem a preocupação de adequar
o ambiente (mesa, sofá, cama, banheiros), para a nova
realidade.
Para refletir:
Ética;
A diferença que faz diferença no espaço
geográfico!
Proposta de fazer uma analogia de alguns dos conceitos proferidos
em: “Geografia: Conceitos e Temas” de Iná
Elias de Castro, Paulo César da Costa Gomes e Roberto
Lobato Corrêa, e da obra de Julio Groppa Aquino: “
Diferenças e Preconceitos na escola – Alternativas
Teóricas e Práticas”.
”A escola é o lugar não
só de acolhimento das diferenças humanas e sociais,
mas fundamentalmente o lugar a partir do qual se engendram
novas diferenças, se instauram novas demandas e se
criam novas apreensões sobre o mundo já conhecido.
A escola é por excelência, a instituição
da alteridade, do estranhamento e da mestiçagem. A
região metamórfica do conhecimento universal.
De uma certa forma, assim como o espaço
geográfico, o sucesso ou fracasso de uma disciplina
ou de uma aula deveria ser balizado por questões simples
tais como: houve transformação aqui? Encerramos
de maneira diversa daquela com a qual iniciamos? Podemos enxergar
o mundo de maneira divergente daquela que dispúnhamos
anteriormente? Caso contrário o que resta é
a irredutibilidade, a obviedade, a mesmice - avessos absolutos
da ação institucional escolar.
O que teria então acontecido
com as práticas escolares a ponto de termos perdido
de vista alguns consensos fundamentais quanto ao valor ético
da intervenção escolar? O que dizer do velho
lema "um país se faz com homens e livros?”
e ao mesmo tempo conjeturar como Marcelo José Lopes
de Souza – UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro),
quando metaforiza “país pobre”, “interesses
brasileiros”, etc. – e chama a atenção
para um problema de adequação da escala de análise,
e não há um defeito intrínseco à
dimensão territorial: basta que se encontre uma malha
analítica suficientemente fina para se visualizar,
dentro de um território envolvente, os grupos sociais
específicos, as relações que mantêm
entre si e os territórios e territorialidades próprios
aos diversos grupos. E dessa forma fornecer aportes conceituais
que viabilizassem terrenos férteis, que revelassem
à possível utilidade de se poupar papel e tinta
com conceitos em prol de reflexões teóricas
(e estratégias) sobre o desenvolvimento escolar que
submerge no desenvolvimento social, uma das áreas mais
fecundas, simultâneas e reveladoras na contribuição
da elaboração do conceito de território
para a ciência social.
O complexo território da escolarização
brasileira se depara com diferentes domínios de análise,
que podem ser aglutinados em: institucional (espaço
de vivências das práticas da ação
escolar) que denota constrangimento e perplexidade –
em virtude de estatísticas nada otimistas, quando no
universo de cem crianças, temos apenas trinta concluindo
o primeiro grau.
Como querer cidadania? Se sem escola,
não existe sustentabilidade, desenvolvimento e viabilidade.
Como transformar a escola, de ineficaz, maçante, supérflua
em instituição do saber conhecer, para poder
interagir e desenvolver. Eliminando a reprovação
o fracasso e conseqüentemente a exclusão, que
tanto pregamos (teoria) e a prática (ação)
onde fica?
Urge uma reflexão: como é
possível que nós, na qualidade de profissionais
da educação, aleguemos que a própria
clientela escola constitui-se no impeditivo maior da escolarização
nos dias de hoje? O que teria acontecido com essa profissão
a ponto de termos invertidos certos preceitos mínimos,
de ética profissional? Por que os "alunos-problema"
teriam se transformado num empecilho, quando por definição
seria o professor quem deveria convertê-los em "alunos"
tão somente?
Convertendo-os, ocorreria a tão
sonhada metamorfose regional, possibilitando o progresso “Nação”.
A mutação não seria possível na
sua plenitude, mas, abriria a possibilidade de fazer com que
o modo de vida das crianças mudasse, podendo levá-las
a considera de que estamos levando em consideração
sua pessoa e suas dificuldades.
Considerando o apud de Geografia:
Conceitos e Temas, onde Arendt, 1985:24: “O poder”
corresponde à habilidade humana de não apenas
agir, mas de agir em uníssono, em comum acordo. O poder
jamais é propriedade de um indivíduo; pertence
ele a um grupo e existe apenas enquanto o grupo se mantiver
unido. Quando dizemos que alguém está “no
poder” estamos na realidade nos referindo ao fato de
encontrar-se esta pessoa investida de poder, por um certo
número de pessoas, para atuar em seu nome. No momento
em que o grupo, de onde originara-se o poder ( potestas in
populo, sem um povo ou um grupo não há poder),
desaparece, “o seu poder”´ também
desaparece.
Poderíamos então considera
o “território” escolar no seu dia-a-dia:
onde o que mais se ouve é que os alunos apresentam
uma inúmera série de dificuldades, que eles
não têm condições de freqüentar
determinada série ou determinada escola, que lhes faltam
os requisitos mínimos, para o trabalho escolar, e etc.
Enfim, que suas carências são de certa forma
"intransponíveis". Conclui-se assim que argumentos
como estes constituem versões pré-diagnósticas
para as dificuldades percebidas nos alunos, que vão
desde as de fundo psicológico, passando pelos familiares,
até as de contexto cultural. Em maior ou menor grau,
acabam tomando a figura dos "alunos-problema" como
impeditivo de nosso trabalho, quando a rigor ela deveria ser
tomada como propulsora de nossa ação em sala
de aula; em território do poder fazer, do poder realizar,
do poder transformar a escolaridade em cidadania.
De promover a metamorfose, onde o
discente esteja “plugado” em fluxos ininterruptos
e mutantes de conceitos, idéias e imagens, transformando-se
em usuários competentes das informações,
onde a competência seria a assimilação
analítica dos dados, denominado conhecimento.
Essa possibilidade de transformar
o “ideológico” em ideologia significativa,
tendo como premissa os preceitos históricos como prática
social e humana, inerentes à educação,
permitiria aparar arestas e partir para o senso comum de uma
ação escolar orgânica, voltada explicitamente
aos conhecimentos acumulados pela humanidade, ciências,
artes, etc., onde o acesso às informações
pode ser de alguma valia ou utilidade.
Poder-se-ia então afirmar que
o legado cultural recriado nos bancos escolares é o
único dispositivo capaz de humanizar o mundo da informação.
Essa humanização anularia os aspectos legais
burocráticos, reguladores das práticas educativas,
tornando a educação um direito inalienável
de todos e de cada um dos brasileiros, calcadas nas instituições
família, escola, sociedade / cultura.
Fazendo um paradoxo com o lugar, a
escola não é de modo algum o mundo e não
deve fingir sê-lo: em vez disso deve figurar como uma
instituição interposta entre o domínio
provado do lar e o mundo, com a finalidade de tornar a transição
da família para o mundo possível.
Entretanto, com as crescentes mudanças
ocorridas no seio das famílias, a escola tem se defrontado
com funções múltiplas e difusas, assim
como as regiões - os professores acabam tendo que associar
seus esforços a funções que ultrapassam
em muito, aquelas preconizadas historicamente, onde o docente
torná-se polivalente, tendo que atuar como pai, psicólogo,
sociólogo, político, pessoa, etc. - contudo,
essa polivalência apesar de antagônica em muitos
aspectos, tem-se tornado uma exigência adicional ao
ideário da profissão docente e da grande massa
trabalhadora, excluída do mercado de trabalho, marginalizada
pela “metamorfose ambulante”.
Assim, a cada década, nota-se
que a região / educação parece tornar-se
mais e mais prisioneira de novas exigências, tendo seu
objeto e objetivos redesenhados constantemente. Perante esse
mesmo quadro cobram do professor inúmeros papéis
- familiar, clínico (médico), assistente social,
nutricionista, etc. é preciso ensinar tudo, se o mestre
da sobrevivência em meio a efervescência da região
globalizada, plugada na rede de viés tecnológicos
mutantes, constantes, infindáveis e eqüidistantes
do capital / trabalho, em meio ao rebotalho de povos sofridos,
oprimidos, alienados e enaltecidos nos horários políticos,
em tempo real, da cidade mundial ligada e dominada pelo capital
em prol da mais valia excludente que permeia a mente de gente
tão indulgente...
A cantiga atual se diz solidária
com a miséria real, com objetivos procedimentais, instrumentais
desejáveis de acesso à escola a toda criança
em idade escolar, embora saibamos da impossibilidade, nos
culpam pela reprovação e evasão escolar,
causadores da “exclusão” da qual fazemos
parte, como marionetes dos tentáculos do poder, de
poder transformar o irreal no real e dessa maneira ludibriar
no cunho teórico do partilhar o conhecimento do saber
buscar, para transformar a cantiga atual, em real significado
do saber amar, compartilhar e respeitar. .
O ofício docente poderia ser
definido como resultado da articulação de três
grandes dimensões: a da especialidade dos conteúdos
específicos em foco, a de cunho didático-metodológico
dos procedimentos relativos à composição
de tais conteúdos, e a de natureza ética, que
se refere aos valores de expansão humana e democratização
social intrínsecos ao conhecimento. No que diz respeito
a esta última, podemos dizer que se trata de dimensão
fundante da intervenção escolar como prática
social e humana, quando em seu bojo educação
equivale a uma medida factível de transformação
humana, tendo como exigência incondicional à
inclusão do outro.
Em resumo - a ética /
território - não se ensina, não está
evidente em nenhuma teoria, método ou conteúdo,
mas ao mesmo tempo sobrepõe-se a tudo isto. Consequentemente,
não é resultado previsível das ações
planejadas do poder / professor, das reações
espontâneas do aluno / sociedade, da proposta pedagógica
da escola, ou das normas emanadas, quando tomadas como elementos
isolados. A ética provém mais da ordem do efeito,
intangível, indelével, o que não se vê,
mas não se esquece se percebe no todo, do território
do saber”,
Darcy Barbosa Correa Voss
- dvoss@uol.com.br
Tereza Murray - terezamurray@hotmail.com
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