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27/10/2006
Carta da semana
O nível da qualidade de vida
”O nível
da qualidade de vida de uma sociedade é difícil
de ser mensurado em sua plenitude. Contudo, pode ser avaliado
por meio de indicadores em determinadas áreas consideradas
como componentes essenciais para o delineamento do quadro
de bem-estar social de uma população. Quando
se fala em miséria, costuma-se usar como quantificador
a renda mensal per capita, e são considerados abaixo
da linha da pobreza aqueles que têm renda de menos de
US$ 1 por dia. Aproximadamente a metade da população
do mundo vive próximo da linha da pobreza, segundo
um informe da Organização Internacional do Trabalho
(OIT), 3 bilhões de pessoas vivem com menos de US$
2 por dia. A pobreza não está restrita às
nações em desenvolvimento: mais de 10% da população
nos 20 países mais ricos do mundo vivem com menos da
metade do salário mínimo recomendado.
As desigualdades econômicas
e sociais continuam aumentando em Nova York, a capital financeira
do mundo, onde um em cada cinco habitantes é pobre.
Segundo os últimos dados do Censo dos Estados Unidos
cerca de 700 mil nova-iorquinos estão próximos
à linha da pobreza ou abaixo dela.
No Brasil quase um terço da
população (43 milhões de pessoas) está
abaixo da linha da pobreza. Esta porcentagem é semelhante
a países como Bolívia, Honduras e Argentina.
Na Argentina, 7,3 milhões de argentinos ainda vivem
na pobreza neste país de aproximadamente 37 milhões
de habitantes, deste total 2,6 milhões estão
na indigência. O governo brasileiro tira seus dados
relativos a renda de três pesquisas do IBGE: Censo,
PNAD (Pesquisa Nacional por Amostragem Domiciliar) e POF (Pesquisa
de Orçamento Familiar). Mas, se alguém rompe
a linha da pobreza porque recebe uma ajuda em dinheiro do
governo de US$ 0,25 por dia, é correto que as estatísticas
deixem de considerar essa pessoa como sendo pobre? As metodologias
de pesquisa, porém, ainda não permitem subtrair
da renda das famílias os recursos provenientes de programas
sociais.
A POF mostrou que a questão
do Brasil não é a fome. Erroneamente Getúlio
Vargas instituiu o salário mínimo no Brasil
para combater a pobreza, fixado com base numa cesta de consumo
familiar. O aumento do salário mínimo é
um instrumento de custo elevado no combate à miséria
e não atinge as pessoas mais pobres. O caminho para
sair da pobreza é a educação e o trabalho.
As necessidades urgentes são as reformas estruturais
que modificam o cidadão e a nação, tais
como investir em educação e na infra-estrutura
do país de modo a superar os gargalos que impedem o
nosso desenvolvimento.
O Índice de Desenvolvimento
Humano (IDH) - que é uma medida comparativa de pobreza,
alfabetização, educação, esperança
de vida, natalidade e outros fatores para os diversos países
do mundo - é uma maneira padronizada de avaliação
e medida do bem-estar de uma população, especialmente
bem-estar infantil. O índice foi desenvolvido em 1990
pelo economista paquistanês Mahbub ul Haq, e vem sendo
usado desde 1993 pelo Programa de Desenvolvimento das Nações
Unidas em seu relatório anual.
A atual disputa presidencial está revelando que o mapa
da votação está ligado ao mapa da pobreza
no Brasil. Os eleitores com renda familiar de até dois
salários mínimos, que representam 50%, são
os mais influenciados pelas notícias de alteração
dos programas de complementação de renda. Em
linhas gerais, os estados com IDH até 0,77 votam no
Lula. Acima deste IDH, os estados optam por Alckmin. Essa
divisão tem raízes históricas desde quando
os portugueses construíram duas administrações
na América do Sul: o sul do Brasil (Império
do Brasil - brasileiros) e o
norte do Brasil (Grão-Pará e Rio Negro - portugueses-americanos).
A derrota do Grão-Pará comparativamente um tanto
audaciosa, foi, de certo modo, como se o Sul tivesse vencido
a Guerra de Secessão, nos Estados Unidos e levando
a Amazônia a perder 40% dos seus habitantes e todos
os focos de prosperidade.
Esses dois Brasis dentro de um só
foi ilustrado brilhantemente em 1974 com a “fundação”
de um país imaginário pelo economista Edmar
Bacha, “Belíndia”, para se referir aos
contrastes brasileiros, que tinham áreas tão
avançadas como a Bélgica e, ao mesmo tempo,
tão atrasadas como a Índia. Cláudio de
Moura Castro e Marcelo Cabrol em artigo publicado em abril
de 1998, na Revista Brasileira de Economia – FGV, rebatizou
o país imaginário: “Corgola” (Coréia
do Sul + Angola). Em 1975, a Bélgica possuía
um IDH de 0,844. Atualmente a Bélgica atinge o significativo
valor de 0,945 (melhorou em 12%). E a Índia possuía
0,407 e evoluiu para 0,602 (disparou 52%).
Mas, o Brasil também evoluiu,
de um IDH médio de 0,644 contra os atuais 0,792 (acréscimo
de 23%). A educação foi responsável por
60,78% do aumento do IDH no Brasil entre 1991 e 2000, já
a renda contribuiu apenas com 25,78%. Mesmo com esta evolução
apresentada ainda temos contrastes que precisam ser combatidos.
Por exemplo, Alagoas apresenta uma taxa de mortalidade infantil
quatro vezes superior a do Rio Grande do Sul. E os atuais
IDHs maiores e menores encontrados no Brasil deslizaram para
baixo comparando-se com países também de menores
IDH. O maior IDH do Brasil (São Caetano/SP: 0,9) é
equivalente ao de Portugal e um dos menores IDH do Brasil
(Guaribas/PI: 0,46) é equivalente ao da Guiné-Bissau.
Precisávamos de outro nome. Inauguro, portanto um novo
país imaginário: “Portuguiné”!”,
Marcos Crivelaro -
crivelaro@uol.com.br
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