Ao mapear novas tendências de consumo
no Brasil, publicitários acreditam ter detectado a "Geração
Canguru". São jovens bem-sucedidos profissionalmente, têm
entre 25 e 30 anos de idade e vivem na casa dos pais. O interesse
neles é óbvio: compõem um nicho de consumidores com alto poder
aquisitivo.
Ainda na "bolsa" da mãe, eles mostram que mudaram as fronteiras
entre o jovem e o adulto. Até pouquíssimo tempo atrás, um
marmanjão de 30 anos, enfiado na casa dos pais, seria visto
como uma anomalia, suspeito de algum desequilíbrio emocional
que retardou seu crescimento.
O efeito "canguru" revela que pais e filhos estão mutuamente
mais compreensivos e tolerantes, capazes de lidar com suas
diferenças. Para quem se lembra dos conflitos familiares do
passado, marcados pelo choque de gerações, os "cangurus" até
sugerem um grau de civilidade. Não é tão simples assim.
Estudos de publicitários divulgados nas últimas semanas indicam
um lado tumultuado - e nem um pouco saudável - dessa relação
familiar. Por trás das frias estatísticas sobre tendência
do mercado, a pergunta que aparece é a seguinte: até que ponto
os brasileiros mais ricos estão paparicando a tal ponto seus
filhos que produzem indivíduos com baixa autonomia ?
Ao investigar uma amostra de 1.500 mães e filhos, no Rio
e em São Paulo, a TNS InterScience concluiu que 82% das crianças
e dos adolescentes influenciam fortemente as compras das famílias.
A pressão é especialmente intensa nas classes A e B, cujas
crianças, segundo os pesquisadores, empregam cada vez mais
a estratégia das birras públicas para ganhar, na marra, o
objeto de desejo.
Com medo das birras, as mães tentam, segundo a pesquisa,
driblar os filhos e não levá-los às compras, especialmente
nos supermercados, mas, muitas vezes, acabam cedendo. Os responsáveis
pelo levantamento da InterScience atribuem parte do problema
ao sentimento de culpa. Isso porque, devido ao excesso de
trabalho, os pais ficam muito tempo longe de casa e querem
compensar a ausência com presentes.
Uma pesquisa encomendada pelo Núcleo Jovem da Abril detectou
que muitos dos novos consumidores vivem uma ansiedade tamanha
que nem sequer usufruem o que levam para casa. Já estão esperando
o produto que vai sair. É ninfomania consumista. Jovens relataram
que nunca usaram, nem mesmo uma vez, roupas que adquiriram.
Aposentam aparelhos eletrodomésticos comprados recentemente
porque já estariam defasados.
Psicólogos suspeitam que essa atitude seja uma fuga para
aplacar a ansiedade e a carência, provocadas, em parte, pela
falta de limite. Imaginando-se modernos, pais tentam ser amigos
de seus filhos e, assim, desfaz-se a obrigação de dizer não
e enfrentar o conflito. O resultado é, no final, uma desconfiança,
explicitada pelos entrevistados, ainda maior em relação aos
adultos.
Outro estudo, desta vez patrocinado pela MTV, detectou um
início de tendência entre os jovens de insatisfação diante
de pais extremamente permissivos. Estão demandando adultos
mais pais do que amigos. Para complicar ainda mais a insegurança
das crianças e dos adolescentes, a violência nas grandes cidades
leva os pais, compreensivelmente, a pilotar os filhos pelas
madrugadas, para saber se não sofreram uma violência. Brincar
nas ruas está desaparecendo da paisagem urbana, ajudando a
formar seres obesos, presos aos computador.
Há pencas de estudo mostrando como a brincadeira, dessas
em que nos sujamos, ralamos o joelho na árvore, ajuda a desenvolver
a criatividade, o senso de autonomia e de cooperação. É um
espaço de estímulo à imaginação.
Todos sabemos como é difícil alguém prosperar, com autonomia,
se não souber lidar com a frustração. Muito se estuda sobre
a importância da resiliência - a capacidade de levar tombos
e levantar como um elemento educativo fundamental.
Professores contam, cada vez mais, como os alunos não têm
paciência de construir o conhecimento e desistem logo quando
as tarefas se complicam um pouco. Por isso, entre outras razões,
os alunos decepcionam-se rapidamente na faculdade, que exige
mais foco em poucos assuntos.
Os educadores alertam que muitos jovens têm dificuldade de
postergar o prazer e buscam a realização imediata dos desejos;
respondem exatamente ao bombardeamento publicitário, inclusive
na ingestão de álcool, como vamos testemunhar, mais uma vez,
nas propagandas de cerveja neste verão. Daí o risco de termos
"cangurus" que fiquem cada vez mais na bolsa (e no bolso)
dos pais.
P.S. - Em todos esses anos lidando com educação comunitária,
posso assegurar que uma das melhores coisas que as escolas
de elite podem fazer por seus alunos é estimulá-los ao empreendedorismo
social. É um notável treino para enfrentar desafios. Enfrentam-se
em asilos, creches e favelas os limites e as carências. Conheci
casos e mais casos de alunos problemáticos que mudaram sua
cabeça ao desenvolver uma ação comunitária e passaram, até
mesmo, a valorizar o aprendizado curricular.
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