Os irmãos Sylvia e Djay
Campos são os personagens ocultos da história
de um dos mais interessantes símbolos já criados
na cidade de São Paulo na guerra contra a violência.
No próximo sábado, em Sapopemba, na zona leste
da cidade, será inaugurada a primeira instalação
de brinquedos feitos com o material das armas entregues ao
governo por ocasião da campanha do desarmamento. O
projeto seguirá para todas as capitais brasileiras.
Vindos do interior para São Paulo há 30 anos,
Sylvia cursou direito, e Djay, sociologia. "Nunca mais
quisemos voltar", diz Sylvia. Os dois trabalham na sede
do Ministério da Cultura e, neste ano, foram provocados
por um desafio: criar um símbolo para a campanha do
desarmamento, lançada pelo governo federal.
Tiveram a idéia de transformar as 171 mil armas entregues
ao governo em brinquedos a serem instalados em praças
das capitais brasileiras. Devidamente derretidas e, depois,
transformados em tubos, as armas passam a servir para produzir
alegria. "Nem era preciso traduzir, o significado é
óbvio."
Apresentado ao projeto, o ministro Gilberto Gil, que nem quis
analisar a sua viabilidade, mandou executá-lo, sem
fazer idéia da cadeia de produção que
essa operação demandaria do derretimento em
lingotes aos tubos moldados nas gangorras e balanços,
passando pelo design.
Faltava escolher o local. "Era natural que fosse um local
marcado pela violência", diz Sylvia. Adicionou-se
então mais um símbolo. A prefeitura estava,
naquele momento, fazendo de um lixão de Sapopemba uma
praça, onde crianças, em vez de trabalharem
em meio a restos podres, iriam se divertir. "O local
não poderia ser mais apropriado."
Fechou-se, assim, um círculo completo de símbolos.
No lugar do lixo, uma praça. A periferia, marginal,
torna-se espaço de inclusão. No lugar das armas,
brinquedos. A praça é um metáfora pronta
e dispensaria qualquer discurso das autoridades para explicá-la,
mas, no próximo sábado, não faltarão
autoridades federais, estaduais e municipais para a sua inauguração.
Sylvia e Djay estariam lá, longe dos palanques, misturados,
anônimos, à platéia. Nem queriam aparecer
nesta coluna. Sylvia insistiu em que não citasse seu
nome e escrevesse apenas sobre a campanha do desarmamento.
"Fomos um detalhe sem importância. Escreva sobre
a cultura da paz", sugeriu, satisfeita por ter, mesmo
que anonimamente, de deixar uma marca na cidade que a acolheu.
Coluna originalmente publicada na
Folha de S.Paulo, na editoria Cotidiano.
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