A paixão
de criança de Enrico Vezzani se converteu num sonho
de adulto -criar um museu dedicado à massa
Quando era menino e morava em Milão, na Itália,
Enrico Vezzani começou a desenvolver o hobby de colecionar
antigas máquinas de fabricar massas. Acompanhava o
seu pai, que tinha uma pequena fábrica de macarrão,
aos antiquários e às lojas de ferro-velho, na
busca de preciosidades. A paixão de criança
se converteu num sonho de adulto -criar, em São Paulo,
um museu dedicado ao macarrão.
"Não morro sem tirar esse projeto do papel",
diz Enrico, agora com 62 anos.
Formado em engenharia de alimentos na Itália, Enrico
planejava passar apenas três anos em São Paulo
para instalar uma fábrica de equipamentos industriais.
Para economizar dinheiro, manteve o hábito de ir a
algum ferro-velho em busca de pechinchas. Ele próprio
reciclava as máquinas. "Era como o meu pai em
sua fábrica na Itália." E, assim, a criança
aprendeu mecânica sem fazer força. O acaso o
levaria de volta ao hobby familiar.
Os planos de volta de Enrico deram errado. Nunca mais conseguiu
sair do Brasil -um país que conheceu, na década
de 1950, por causa do futebol. "O nome do meu time na
Itália era Santos. O Pelé entrou na minha vida
com a televisão, na Copa de 1958."
Enrico foi descobrindo as mais diferentes máquinas
de fazer massa, trazidas pelos imigrantes italianos -estavam
jogadas, esquecidas, em algum ferro-velho. Outras vezes aproveitava-se
da "quebra" de uma empresa para comprar, a baixo
preço, alguma peça. Um de seus "troféus"
é uma máquina, produzida em 1923, que foi de
Matarazzo.
As peças iam sendo colocadas em ordem, na fábrica
de Enrico, no bairro do Limão, na zona norte de São
Paulo. "É um museu improvisado." Uma de suas
satisfações era ver que, apesar da quase clandestinidade,
algumas pessoas queriam visitar a sua coleção,
muitas para se lembrar dos antigos tempos das massas feitas
em casa.
Toda essa desordem incomoda há muito tempo o engenheiro,
acostumado à ordem. Pensou em doar todas as suas peças
a algum museu, mas, pelo menos por enquanto, não descobriu
quem tivesse interesse em recebê-las.
Só viu uma solução: criar um museu dedicado
ao macarrão, onde também expusesse documentos
sobre os italianos que vieram, como ele, para o Brasil.
Neste momento, Enrico está procurando um imóvel
para instalar o museu. Ainda não o encontrou, mas,
pelo menos, tem uma certeza: será no Bexiga, bairro
que se notabilizou pelas cantinas italianas. Na década
de 1970, quando chegou ao país para ficar apenas três
anos, foi aquele bairro que o fez se sentir em casa, comendo
o macarrão de sua infância.
Coluna originalmente
publicada na Folha de S.Paulo, editoria Cotidiano.
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